“O SUS que não se vê” – um pouco de minha experiência no SUS

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    No meu curso de Pós-graduação pela UNIFESP estamos estudando um módulo muito interessante: o Sistema Único de Saúde-SUS.

   A proposta do fórum foi estudar "O SUS QUE NÃO SE VÊ" – da Revista Radis, escrito por Adriano De Lavor, Bruno
Dominguez e Katia Machado.

 Através da leitura tive a motivação de escrever um pouco da minha história vivida nos meus sete anos de trabalho na farmácia de alto custo, e quero deixá-la registrada aqui, porque como árdua defensora do SUS, acredito que vale a pena.

    Trabalhar no SUS, por muitas vezes, não é fácil.Ouvimos falar tão mal do funcionário público, mas será que conhecemos o outro "lado da história"? Ouvir reclamações, grosserias, até xingamentos e desrespeito, já faz parte de nossa rotina. Parece que nos acostumamos.

Mas apesar de tudo isso, todos os dias, quando eu acordo, penso comigo: como é bom ter um lugar para trabalhar, para ajudar no sustento da casa, ter a oportunidade de realizar pequenos gestos, mesmos que eles nunca virem notícia na mídia ou recebam um simples "obrigado!".

Quando nossa farmácia era responsável pelo faturamento, vivíamos uma situação muito difícil, pois fazíamos cada funcionário, o serviço de três: atender, faturar, conferir.

Não eram raros os finais de semana e feriados que eu enchia o porta-malas do carro com cerca de 300 a 500 processos de pacientes para realizar a digitação, porque lá no trabalho não dava, e como tudo tinha data correta para entrega, caso não fosse realizado o faturamento em tempo hábil, o paciente seria prejudicado.

Sempre tínhamos a ajuda de outros colegas do ARE, como a Aparecida Cristina, colega nossa de curso, que até nos sábados ía prá nos dar uma grande ajuda! Obrigada Cris!

Eu acredito que o nosso trabalho era uma espécie de "sus que não se vê".

Desculpem o meu desabafo, mas é muito triste ouvir o que ouvi de um paciente tempos atrás: acusando-nos de não receber o medicamento porque "alguém ali não trabalhou direito", culpando-nos como se nós fôssemos responsáveis pelo medicamento que não chegou (por questões de licitação).

É muito triste quando temos nossa consciência tranquila, fazemos de tudo para ajudar o paciente, e temos que ouvir o que lá ouvimos.

Mas apesar de tudo, no final do dia, saio de lá feliz, porque pude ajudar, orientar, humanizar… Saio do meu trabalho feliz, e realmente trazendo no coração a certeza de que devem existir centenas e centenas de funcionários assim na Saúde, e que recebem como gratidão o descaso, a indiferença, a ofensa…

O SUS que não se vê está escondido num trabalho que ninguém filmou ou mostrou na mídia. Nenhuma TV foi em casa prá registrar meus finais de semana digitando horas e horas. Nenhum paciente chegava no ARE às 5:30 da manhã prá me ver chegando e sair às oito horas da noite, sem ir prá casa nem no horário do almoço ver o filho pequeno, deixado no cuidado dos avós…

Mas tudo passa, e hoje me sinto feliz por ter passado aquela "fase difícil". Serviu de aprendizado. Eu, que morria de medo só de olhar prás caixinhas de remédio nas prateleiras, rsrsrs, hoje já aprendi muito, porque encontrei profissionais que pacientemente me ensinaram, e também alguns pacientes que carinhosamente chamamos de "nossos vozinhos", que sempre chegam com aquele sorriso que a tudo ilumina…

É um desafio diário, mas sabem de uma coisa? Eu já venci uma enfermidade da alma que tanto me amadureceu como ser humano, como profissional, como mãe,esposa e colega de trabalho, que aprendi que não posso guardar as cascas da mágoa e ingratidão, mas sim, devo cultivar a semente da alegria que me trazem todos os dias aqueles que fazem valer a pena trabalhar no SUS, o SUS que verdadeiramente DÁ CERTO, e através do qual a minha árvore está crescendo mais bonita a cada dia…

Abraço a todos!!!