O desafio da clínica

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 "No Brasil, o movimento de oposição ao imperativo individual, pelo qual se isola o corpo natural – e nele os fenômenos mórbidos -, engendrou o campo da saúde coletiva, numa espécie de resistência à tendência de medicalização da vida, operada por políticas de controle e/ou disciplinares. (…) sanitaristas e outros profissionais de saude, atualmente, reconhecem potencialidades no estudo e na abertura do campo para práticas clínicas, agora pensadas em outras bases." (MENDES, 2007).

Encontro-me em um momento chave para refletir sobre a posição da clínica na minha formação. Pode soar estranho, mas quando entrei para cursar Psicologia, a prática clínica não se encontrava entre os principais motivos/objetivos – pelo menos de maneira consciente. Um dos disparadores, à época, foi o encontro com uma psicóloga em sessões de orientação vocacional. Apesar do resultado objetivo ter indicado outras profissões, de certa maneira foi provocado um processo de reflexão e auto-conhecimento ali, além da relação com outros afetos na minha história – passada e atual. De todo modo, ali vi a escolha pela Psicologia como possível. O contato com a prática psicológica individual foi um dos disparadores, mas pensando bem, eu buscava uma Psicologia nem individual nem coletiva, mas uma psicologia abstrata. Buscava o conhecimento. 

O próximo contato com a clínica, foi o processo psicoterapêutico individual pessoal. Muito rico, grande parte da minha formação. E, depois, o estágio, podendo iniciar uma prática clínica acompanhado, recebendo orientações, apoio, acolhida às angústias. Enfim, algumas vivências clínicas. 

Hoje o desafio é aproximar essa clínica já reconhecida com a clínica sonhada. Aquela clínica que, por mais que eu não percebesse, já poderia estar na minha busca pela Psicologia. A clínica da vivência cotidiana, dos afetos potencializados, das transformações com o outro, o devir. A clínica como "tratar as obstruções da vida enquanto potência de criação, de diferenciação, de variação (…) liberar a vida onde ela está lá sufocada" (ROLNIK, 2000 citado por MENDES, 2007).

Mergulho neste desafio: encontrar a clínica no plano das intensidades. "Por isso, trata-se sempre de enfrentar questões simultaneamente éticas e políticas, uma vez que as práticas clínicas concernem a posições e a modos de conhecer, de interferir e de se dispor, ao universo do jogo – no caso – da saúde pública e, naturalmente, ao enfrentamento de resistências (…)." (MENDES, 2007).

Como pensar a clínica no plano da produção do sujeito no trabalho em saúde?

um abraço

Mendes, Vera L F. Uma Clínica no Coletivo – experimentações no Programa de Saúde da Família. São Paulo: Hucitec, 2007.