O SUS e a INTERNET

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Conexão, interatividade, redes sociais
Qual seria a relação destas palavras tão em moda hoje, com a criação do SUS, em 1988? É interessante observar que houve um paralelismo histórico entre o desenvolvimento da internet e o desenvolvimento do sistema de saúde brasileiro.
A internet começou nos Estados Unidos, no final dos anos de 1960 e na década de 1970, como estratégia militar nos tempos da guerra fria, em que o governo americano procurava um sistema não centralizado de controle das informações, para que não fossem um alvo central que pudesse ser destruído facilmente pelos militares soviéticos e que desta forma desarticularia todo o seu sistema de defesa. Havia um vínculo com as universidades e a rede foi desenvolvida com o auxílio dos professores americanos. O inimigo era externo. Wikipedia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Internet
Neste mesmo período, víviamos o auge da ditadura militar, que reprimia com violência qualquer tentativa de organização social de oposição e a informação era tratada de forma estratégica em instituições sinistras como o SNI e órgãos de censura e repressão. O governo militar gerou resistências e muitas das idéias do SUS foram pensadas por cientistas sociais e intelecutuais das universidades brasileiras, no que se chamou de movimento pela reforma sanitária. O inimigo era interno.
A década de 1980 assistiu a dissolução da guerra fria com o seu fim emblemático representado pela queda do muro de Berlim em 1989. Um sistema de informação em rede (internet) que já estava consolidado nos EUA, perdia a sua finalidade militar e foi apropriado pelas universidades americanas. Das universidades para a população, sem a rígida hierarquia de uma estrutura de controle militar, foi um simples passo, que garantiu o surgimento de uma nova mídia com muita liberdade, sem muito controle e sem muita hierarquia.

Descentralização, integralidade, participação popular
No Brasil,a década de 1980 correspondeu ao período de abertura lenta e gradual e de redemocratização do país. Foram os anos das primeiras eleições diretas e idéias que foram gestadas de forma clandestina como os princípios do novo sistema de saúde brasileiro puderam vir à luz em processos de organização da Saúde Pública que já existiam deste os tempos do governo de Getúlio Vargas, como as Conferências Nacionais (a primeira, em 1941 Portal da Saúde: https://portal.saude.gov.br/portal/saude/cidadao/area.cfm?id_area=1117). Neste contexto, a 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986, marcou o fim das reuniões periódicas de tecnocratas da saúde dos estados e se transformou no maior movimento democrático da saúde pública, referendando idéias do movimento da reforma sanitária como : DESCENTRALIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO POPULAR e INTEGRALIDADE. Incluir nas estruturas normativas do país, os princípios que regem a saúde até hoje, com os militares saindo do governo e a democracia se instalando, também foi um passo, não muito complexo pelo contexto de abertura e redemocratização do período vivido, que culminou com a colocação destes princípios na Constituição Nacional de 1988.
Na década de 1990, com o fim da guerra fria, tivemos no mundo a disseminação das idéias do "estado mínimo" e de que o mercado tinha capacidade suficiente para organizar as estruturas de proteção social. Foi o auge do movimento neoliberal, com o Consenso de Washington e da desregulamentação dos sistemas de proteção social. A internet se disseminou como um sistema ágil de globalização dos mercados, com a facilidade de deslocamento dos recursos, pela conexão global dos sistemas financeiros do mundo.
No Brasil, na década de 1990, apesar da resistência neoliberal (com propostas inclusive do então senador Fernando Henrique Cardoso de retirar os princípios do SUS da constituição, transformando-a numa "cesta básica" da saúde), o que a Carta Magna preconizava tinha que ser implementada. Assim, com muitas dificuldades políticas, porque a constituição ia contra o contexto neoliberal da época, a lei 8080  e a lei 8142 foram aprovadas pelo governo Collor, e o governo passou o período procurando alternativas de implementação do sistema, com a criação das portarias NOBs e NOASs, sem muito sucesso. Havia muitas críticas de sua excessiva regulamentação e normatização do poder central.

Novo milênio
O novo milênio começa com o ataque às torres gêmeas nos EUA, um período de tentar retomar o  controle da web por causa do terrorismo, porém a internet chegou a tal estágio de desenvolvimento e independência, que seguia de forma resistente ao contexto de controle, estimulando as idéias de mais CONEXÃO,mais INTERATIVIDADE e a idéia de REDE SOCIAL.
No Brasil, no novo milênio, esgotam-se as tentativas de normatização vertical do sistema de saúde, através das NOBs e NOAS. Temos em 2006 a criação do PACTO PELA SAÚDE e a organização das secretarias estaduais e secretarias municipais em direção às REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE.
O SUS e a INTERNET, embora tenham histórias paralelas, evoluem para a convergência dos seus ideiais. Assim, as palavras tão em moda hoje como CONEXÃO, INTERATIVIDADE e REDES tendem a se encontrar com o que foi gerado no princípio do SUS na Constituição de 1988, há 24 anos, ou seja: DESCENTRALIZAÇÃO, INTEGRALIDADE e PARTICIPAÇÃO POPULAR.
No último dia do governo Lula, o ministro Temporão lança a portaria 4.279, sobre as Redes de Atenção à Saúde (RAS). A segunda década do novo milênio começa com esta forte diretriz, assimiliada pelo Ministério da Saúde, e pelos Secretários Estaduais e Municipais de Saúde, através dos seus órgãos de representação no SUS (CONASS, CONASEMS e COSEMS Estaduais)
E no mundo, as redes sociais viram moda, assimilada tanto por novos modelos capitalistas de consumo, como por movimentos sociais contra qualquer tipo de opressão (queda de ditaduras, primavera Árabe, protestos contra a globalização excludente).
É o espírito da época. Conectar o SUS à internet poderá significar um sistema com mais controle (que é necessário, pelo seu custo cada vez mais elevado e pela urgência da transparência nos gastos do sistema), mas poderá significar também o surgimento de um SUS com mais participação, mais criação e inovação (que é muito mais necessário, para não ficarmos só atrelado ao mundo do consumo e das demandas individuais).

Marcos legais do SUS, em direção às redes:
1986 – 8ª Conferência Nacional de Saúde
1988 – Constituição – artigo 198
1990 – Lei 8.080 e Lei 8.142
2006 – Pacto pela Saúde
2010 –  Portaria nº 4279 – Redes de Atenção à Saúde (RAS)
https://promoversaude.ning.com