Diga Não! A Privatização do SAMU

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Quando,estou na defesa da não Privatização do SUS,ACABO DE LEVAR UM SUSTO com essa materia.

A LUTA CONTRA A TERCEIRIZAÇÃO DO SAMU EM SC

Celso Luiz Dellagiustina

Secretário de Saúde de Bombinhas, ex Presidente do COSEMS Santa Catarina e atual Diretor de Comunicação do CONASEMS

É  necessário que, antes de entrarmos no assunto da terceirização, propriamente dita, conheçamos um pouco da história do SAMU em SC. A discussão sobre ele se inicia na CIB em 1995, após a vinda do Dr. Cesar Nietzke, médico cirurgião, que fez especialidade em Lion na França e que procurava convencer gestores Estaduais e Municipais a implantar APH (Atenção Pré-Hospitalar)  no Estado de SC. Sempre esbarrou  no problema do financiamento desta estrutura. O assunto retorna à baila com força total com o advento da Portaria 2.048/2002 que normatizou o atendimento pré-hospitalar móvel  estabelecendo estrutura física e móvel,  rol de equipamentos, regras de organização etc..

Entretanto, continuou esbarrando no problema do financeiro. Com o advento da Portaria 1.863/2003 instituindo a Política Nacional das Urgências no território Brasileiro e da Portaria 1.864 que instituiu o componente APH do Plano nacional com a criação efetiva do SAMU, reacendeu a discussão  na CIB de Santa Catarina a decisão da implantação de um SAMU Estadual, em vista que especialmente a Portaria nº. 1864/2003 que definia, além de toda parte técnica necessária à implantação do SAMU, a pactuação tripartite de financiamento. O Ministério da Saúde além do fornecimento dos equipamentos das centrais de regulação, das Unidades Avançada de Saúde  (UTIs Móveis) e das Unidades de Suporte Básico (ambulâncias medicalizadas), se responsabilizava a União por 50% das despesas de custeio, Estados por 25% e Municípios pelos restantes 25%. Isto animou SC e finalmente em final de 2003 o Conselho Estadual de Saúde aprovou o Plano Estadual de Urgências e Emergências para o Estado e o Plano Operativo do SAMU que foi ratificado pela CIB no início de 2004. Nesta pactuação além dos recursos e equipamentos  contidos  na Portaria 1.864 de responsabilidade Federal, ficou pactuado que SC através da SES seria o Gestor de todo o sistema, com contrapartida para as centrais de regulação e as Unidade Avançadas de Saúde (USAs), cabendo aos municípios a gerência e tão somente esta das Unidades Suporte Básicas (USBs). O COSEMS assumiu a responsabilidade de representar os 293 municípios, uma vez que a decisão fora de se cobrir o Estado inteiro.  Nada foi feito até 2005 devido muito mais a dificuldade geográfica do COSEMS de organizar no seu plano operativo as cidades que fossem sede de Unidade Saúde Básica.  Foi  então em uma pactuação histórica  na época que as 54 Unidades de Suporte Básicas  (1 para cada 100 mil hab.), seriam distribuídas entre um grupo de municípios, com um município sede que serviria aos demais,  até chegar-se a 100.000 habitantes. Solidariamente cada município de uma região, através de Leis Municipais, repassariam ao município sede recursos para manutenção da USB.  Com isto resolvido, partiu-se para a peregrinação das 8 macro regiões de SC onde em 8 meses foram colocadas 8 centrais de regulação as Unidade Avançadas de Saúde em número de 18 e as Unidades Suporte Básicas em número de 54 em funcionamento. Restava ainda a forma de gestão administrativa, tanto no âmbito municipal, como estadual. Os municípios foram orientados a fazer suas leis municipais e contratar seus funcionários através da Lei do Emprego Público. Os funcionários de responsabilidade do Estado foram contratados de modo precário por processos seletivos temporários sucessivos que chamou a atenção do TCE e principalmente do MPE. Começou então a discussão da qual o COSEMS participou ativamente na forma ideal de gestão. A Lei do Emprego Público  foi descartada em face da liminar da Ministra Elem Greice de impedir no Poder Público a dupla forma de contratação. Investiu então o Estado na possibilidade de contratar uma Organização Social (OS) para gerir o SAMU o que foi rechaçado tanto pelo CES e pela CIB, sendo então o projeto abandonado.

O COSEMS que há muito vinha defendendo a formação de um Consórcio Estadual fundado na Lei 11.107 e no dec. Lei 6.017, na forma de Consórcio Público de Direito Público. Depois de muitas conversações conseguimos, em meados de 2009, convencer o Secretário Estadual da época Dep. Dado Cherem e a Secretária Adjunta hoje Deputada Federal Carmen Zanotto a trabalhar na efetiva implantação do consórcio.  Em 10/12/2009 através da deliberação 2.011 da CIB foi aprovado o Protocolo de Intenções do referido Consórcio e homologado pelo CES. O protocolo foi encaminhado para se tornar projeto de Lei em fevereiro de 2010 e em 23/08/2010 foi aprovada a Lei Estadual do Consórcio nº. 15.294/2010. É importante salientar que neste período esta experiência através da Consultoria do Dr. César Nietzke foi implantada na região de Montes Claros ao norte de Minas Gerais. Este funciona como consórcio Macrorregional até hoje, como uma forma excelente de gestão. Depois da aprovação da Lei Estadual e com a proximidade das eleições de deputado, governador e senador e devido às incompatibilizações do Secretário e da Secretária Adjunta, quem assumiu a pasta, em regime tampão, preferiu não dar continuidade à implantação do consórcio.

Fim das eleições de 2010 e com a nomeação de novo secretário em 2011, este me chamou, como presidente do COSEMS, para expor o projeto do consórcio estadual  para si e sua equipe. Fiz a exposição. Achei curioso  que muitos dos assessores da nova administração que haviam participado da construção  do consórcio em SC mudaram seu pensamento e passaram a ser contra o consórcio. Acompanhavam a  intenção do Secretário de terceirizar o SAMU, sob alegação de que o Estado não teria condições de incorporar os 1.600 funcionários do SAMU na folha do Estado. Esta alegação foi rechaçada por mim e pela Deputada Carmen Zanotto que dizia ter o Estado à capacidade de assimilação. Contra argumentamos  que nem todo o funcionalismo teria impacto no teto da Lei Complementar 101. No entendimento de vários juristas só impactaria o correspondente a contrapartida Estadual e Municipal.  A discussão continuou rolando na CIB. Em setembro  a CIB deliberou que o Secretário Estadual de Saúde e a minha pessoa,  fossemos a Brasília. O objetivo era manter contado com o Secretário da SAS Dr. Helvécio e com o Ministro Padilha, para saber da legalidade da Organização Social (OS) no SAMU. Uma prioridade da administração federal, a partir de 2011, foi a formação de redes  com a substituição da  portaria 1863 pela Portaria 1.600. Esta portaria  estabelecia os novos atores do Sistema de Urgência e Emergência e da política nesta área. Depois cada componente teve portaria específica como a do SAMU de nº  2.026 de 24/11/2011 que trouxe modificações importantes sobre o Atenção Pré Hospitalar (APH), sua regionalização, certificação, habilitação e as diferenças de custeio entre os certificados e os habilitados. Fato interessante nesta portaria é o seu Art. 30. “Os recursos financeiros a serem transferidos pelo Ministério da Saúde em decorrência do disposto nesta Portaria não poderão ser utilizados para o financiamento de prestadores da iniciativa privada.” Na interpretação literal este Artigo  impede qualquer forma de terceirização.

Aliás, a Portaria atual do SAMU 1010 de 21/05/2012 mantém a mesma vedação no Art. 37. “Os recursos de custeio repassados pelo Ministério da Saúde no âmbito desta Portaria deverão ser destinados exclusivamente à manutenção e qualificação do componente SAMU 192 e da Central de Regulação das Urgências. Parágrafo único. Os recursos financeiros a serem transferidos pelo Ministério da Saúde em decorrência do disposto nesta Portaria não poderão ser utilizados para o financiamento de prestadores da iniciativa privada.

Voltando a deliberação da CIB de setembro de 2011 (consulta formal ao Ministério da Saúde) o Secretário, alegando compromissos outros, não se fez presente. Mantivemos contato com o Secretário da SAS e com o Ministro Padilha, que concordaram com a interpretação dada nos artigos acima citados. Serviços de regulação e de poder de polícia são eminentemente estatais e sua terceirização é proibida. Em relação à impactação dos funcionários do Consórcio na folha de pagamento do estado, procuramos  juristas e,  alguns deles, acham que seria discutível com os Tribunais de Conta do Estado esta questão. De volta a SC comunicamos pessoalmente ao Secretário de Estado o resultado de tais investigações. Elaboramos um relatório sobre o cumprimento da designação da CIB feita a nós, solicitando que o mesmo fosse lido em  reunião da CIB. Esta aconteceu em dezembro de 2011 na cidade de São Miguel do Oeste, onde, sem estar pautado, o Secretário anuncia que o SAMU será gerido por uma Organização Social (OS) e que os municípios detentores de base de Unidades Suporte Básico (USBs), ficariam livres para aderir ou não a ela. Tal decisão foi homologada, ”ad referendum” pela CIB e não aprovada pelo CES, denunciando tais fatos ao Ministério Público Estadual de SC representado pela Dra. Sonia Piardi, que, ingressando com uma Ação Civil Pública conseguiu liminar, em 1º instância de suspensão do contrato entre o Estado e a Organização Social – SDMP, liminar esta mantida pelo Tribunal de Justiça de SC.

Esta semana o Ministro César Peluzzo do STF, manteve a liminar do TJ de SC, determinando o imediato rompimento do contrato de terceirização do SAMU, a partir da data da primeira liminar 13/08/2012, e dando poderes ao Ministério Público de fiscalizar a efetiva aplicação das multas aplicadas ao estado de Santa Catarina, pelo não cumprimento da decisão judicial. Embora ainda tenhamos uma longa batalha jurídica pela frente  que é a decisão sobre o mérito, nós SUSISTAS temos motivos de comemorar tal decisão, especialmente porque nesta mesma semana O STF também se manifestou contrário a terceirização de médicos e enfermeiros em Hospitais sob alegação de que esta função é Estatal e intransferível a terceiros. Tal decisão não poderia ser diferente  pois se a função Estatal fosse possível de ser terceirizada, perderíamos todos nós gestores de todos os três níveis de governo, o controle e a regulação dos serviços de saúde