Hiperdia: Estratégias e Instrumentos para a qualificação da atenção

17 votos

Introdução:

Este projeto foi idealizado pelos doutorandos do 9º período do curso de medicina na UFRN, Francilberto Dyego de Souza, Olga Priscilla Gonçalves e Ramsés Dantas da Costa, sob a preceptoria da médica Cíntia Andrade e da enfermeira Isabelle Albuquerque e orientação da professora Ana Tânia Lopes Sampaio, como atividade componente do internato em saúde coletiva. As atividades aqui relatadas foram desenvolvidas no município de Macaíba/RN, na Unidade Básica de Saúde do Loteamento Esperança (ou, “UBS do Vilar”, como é conhecida pela população), mais especificamente na microárea 02.
A nossa intervenção foi baseada em dados coletados nas nossas vivências ao longo do estágio em saúde coletiva e no estudo das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão VI (2010) e das Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2009).
Segundo as Diretrizes Brasileiras de Hipertensão VI (2010), no mundo há alta prevalência (30%) e baixas taxas de controle da Hipertensão arterial sistêmica (HAS), que é, hoje, considerada um fator de risco modificável para a morte por doenças cardiovasculares. Ainda, caracteriza a HAS como uma morbidade que gera alto custo médico e socioeconômico anual (R$ 165.461.644,33) e que apresenta baixo nível de controle clínico (19,6%).

Fonte: Diretrizes Brasileiras de Hipertensão VI, 2010

Fonte: Diretrizes Brasileiras de Hipertensão VI, 2010
As diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2009) consideram que atualmente vivemos uma epidemia mundial da Diabetes Mellitus (DM), com previsão de 300 milhões de indivíduos acometidos em 2030. O aumento da expectativa de vida, o envelhecimento, a urbanização, a obesidade e o sedentarismo são fatores de risco que se tornaram bastante significativos nos últimos anos, com o avanço das tecnologias e maior facilidade de acesso à alimentação, nem sempre saudável, por parte da população. A prevalência atual varia de 2,7% (30 a 59 anos) a 17,4%(60 a 69 anos), com uma taxa de mortalidade de 12 por mil habitantes. Os gastos totais com esta condição, atualmente, representam cerca de 2% a 15% do orçamento total da saúde.
Na microárea 02 da nossa UBS, os dados epidemiológicos coletados nas fichas A do SIAB nos mostram que, entre as famílias que informaram alguma condição médica, 14% delas apresentam pelo menos um (01) indivíduo com DM (tipos I e II) e 60% apresentam pelo menos um (01) indivíduo com HAS diagnosticada. Em relação à HAS, posteriormente observamos que 17% das famílias adscritas possuíam algum membro com diagnóstico. Infelizmente as fichas A não estavam completamente atualizadas, mas em levantamento dos livros de registro atuais da unidade, observamos que existem 182 usuários cadastrados no Hiperdia, sendo 49 destes provenientes da microárea 02. Nas microáreas 01 e 03, respectivamente, foram contabilizados 61 e 72 usuários cadastrados. Em relação às causas de morte da população, percebemos que 80% das causas se relacionavam ao sistema cardiovascular ou devido às complicações do DM.

Em relação ao atendimento destes pacientes, obtivemos informações das nossas preceptoras e pudemos perceber, durante os nossos atendimentos supervisionados, que existe certa dificuldade em acessar dados importantes de consultas anteriores nos prontuários, ocasionada por diversos fatores. Entre estes, foram importantes a rotatividade do profissional médico da equipe e a forma não-padronizada de registro dessas informações no prontuário. Além disso, Havia dificuldade no controle da assiduidade desses pacientes, de forma que era difícil programar a busca ativa dos pacientes faltosos.
Diante desta realidade e com o desejo de deixar uma contribuição que possa ser continuada após a nossa saída, desenvolvemos uma intervenção em duas frentes: A primeira consistiu na busca ativa na comunidade de pacientes portadores de Hipertensão e/ou Diabetes, com o propósito de detectar novos pacientes e avaliar a situação atual do controle das morbidades. A segunda teve como objetivo a elaboração de uma ficha prática de assiduidade e de um instrumento facilitador da consulta do Hiperdia, ambos elaborados com o objetivo de facilitar o acesso dos usuários ao serviço, diminuir o tempo de atendimento e espera, além de qualificar a atenção prestada e garantir a busca ativa.

O objetivo geral desta intervenção foi o desenvolvimento de instrumentos de acompanhamento para os pacientes atendidos no programa Hiperdia na UBS Loteamento Esperança, com o intuito de tornar este seguimento mais completo e dinâmico, visando contribuir para a melhora da qualidade de vida, para a redução das complicações cardiovasculares e da mortalidade, ao facilitar o acompanhamento longitudinal e qualificado destes usuários.

Como objetivos específicos, elencamos a institucionalização do instrumento de acompanhamento no Hiperdia; a busca ativa de novos casos e de pacientes mal controlados; a inserção dos mesmos na agenda da UBS; a aplicação do instrumento e a avaliação constante do mesmo, que pela característica dinâmica do conhecimento médico, poderá sofrer alterações ao longo do tempo para ser readequado às novas diretrizes e/ou demandas específicas locais.

 

Metodologia:

A ficha de assiduidade foi idealizada como um instrumento simples, prático e de fácil preenchimento, a ser utilizada pelos profissionais da equipe durante o acolhimento/marcação das consultas, oferecendo facilidade para identificar os pacientes faltosos, com o propósito de realizar a busca ativa dos mesmos. Os dados escolhidos para compor esta ficha foram o nome do paciente, o nome do ACS responsável pela família, a rua onde mora, as medicações em uso atualmente, e as datas das consultas agendadas, com espaço logo abaixo reservado para a marcação da presença ou falta a estas consultas. A divisão das fichas por ACS e por rua facilitará a busca ativa destes pacientes, caso faltem à consulta. O espaço reservado para as medicações em uso serve como fonte de dados para manter atualizadas as demandas da unidade, em relação às medicações específicas.

Ficha de Assiduidade do Hiperdia
A construção do Instrumento de acompanhamento ambulatorial para o Hiperdia foi orientada por nossas tutoras, e foi idealizado como um roteiro simples e dinâmico, que garantiria a qualidade do atendimento. Após estudo das diretrizes mais recentes sobre HAS e DM (Diretrizes Brasileiras de Hipertensão VI, 2010; e Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes, 2009), elencamos os pontos essenciais da primeira consulta e das consultas de acompanhamento do Hiperdia. Com estes dados, montamos uma ficha de atendimento modelo, contendo os principais sintomas já pré-registrados com um espaço, ao lado, para marcar o sinal/sintoma/condição já existente. Também, facilitamos a visualização longitudinal dos exames realizados e reservamos espaços para o preenchimento das condutas e para os planos terapêuticos pactuados com o usuário atendido, facilitando a busca por estes dados em consultas posteriores.

Ficha de acompanhamento ambulatorial - 1ª Vez

Ficha de acompanhamento ambulatorial.

Ficha de acompanhamento ambulatorial - Espelho de exames

Ainda, pela prevalência da DM e HAS observada em toda a área adscrita da UBS e com intuito de avaliar a situação atual do controle dos pacientes já cadastrados no Hiperdia e iniciar o acompanhamento de possíveis novos pacientes, realizamos uma manhã de triagem na própria UBS, no dia 29/11/2012. Iniciamos a divulgação do evento no dia 26/11/2012 através de convites na sala de espera da unidade e contamos com a ajuda das ACS Rita, Tásia e Lúcia, que realizaram visitas domiciliares convidando os usuários de toda a área. No dia, participaram da ação os doutorandos, as agentes de saúde, a técnica de enfermagem, a médica e os usuários da UBS. Estimamos a participação de aproximadamente 50 pessoas. Na triagem, realizamos um breve questionário de antecedentes (tabagismo, etilismo, antecedentes pessoais e familiares sobre doenças cardiovasculares e/ou diabetes), realizamos aferições da pressão arterial, peso, circunferência abdominal (CA) e da glicemia capilar. Foram disponibilizadas orientações e condutas imediatas aos pacientes com valores sugestivos de urgência/emergência. Os dados obtidos foram tabelados e analisados. Houve a inserção dos usuários recém-diagnosticados na agenda do Hiperdia e os pacientes já acompanhados que apresentaram medidas fora dos padrões esperados terão acesso facilitado para a próxima consulta.

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012

 

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012 - Equipe

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012 - Equipe

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012 - Equipe

Acolhimento e triagem dos usuários no dia 29/11/2012 - Equipe

Resultados e Discussão:

Na manhã de triagem, 71 usuários foram contemplados pela nossa intervenção, sendo 17% (12) do sexo masculino e 83% (59) do sexo feminino. Ainda, 32% dos usuários já eram cadastrados no programa Hiperdia. 34 mulheres apresentaram CA > 88 cm, enquanto 25 apresentaram valores < 88cm. Apenas 2 homens apresentaram CA > 102 cm, enquanto 10 apresentaram CA < 102 cm. Entre todos os pacientes, 64 pacientes possuem história familiar de doenças cardiovasculares e/ou DM, 09 se afirmaram tabagistas e 08 eram etilistas. Entre as medidas do HGT, houve apenas 10 medidas alteradas (>140mg/dL), e todas elas de pacientes que já eram cadastrados no Hiperdia, indicando dificuldade no controle da condição. Houve 15 medidas da PA com valor > ou = 140×90 mmHg, das quais 11 eram de pacientes previamente hipertensos e 4 eram pacientes sem história prévia de hipertensão.

Usuários contemplados, por sexo

Cintura abdominal, por valores limites e sexo

Fatores de risco detectados

Os resultados acima apresentados apontam para a necessidade de melhor controle da PA e do DM nos pacientes analisados. Ainda, sugerem a necessidade de investigar lesões em órgãos-alvo, visto que apesar do acompanhamento nas consultas, o controle dos pacientes não está sendo adequado, e não temos uma estimativa exata de a quanto tempo este quadro está instalado. Acreditamos que se faz necessário elaborar estratégias multidisciplinares, multisetoriais e de corresposabilização do usuário para interferir efetivamente nos fatores de risco modificáveis (peso, etilismo, tabagismo, atividade física), também ampliando as ações para além das barreiras físicas da UBS, onde a comunidade vivencia estes fatores.

 

Conclusão e expectativas:

Concluímos que o acompanhamento do Hiperdia precisa ser qualificado e simplificado, de forma a facilitar o acesso dos pacientes e possibilitar a visualização longitudinal do mesmo pelos profissionais da equipe. Infelizmente, não tivemos tempo hábil para aplicar os instrumentos na comunidade, mas pactuamos com toda a equipe da UBS que estes instrumentos seriam utilizados e posteriormente entraríamos em contato para avaliar a aplicabilidade dos mesmos.

A expectativa gerada com o projeto de intervenção é a aplicação/continuação das atividades propostas: O uso do instrumento de acompanhamento dos pacientes para buscar interferir nos fatores de risco e manter um controle mais efetivo da HAS e/ou DM nos usuários do Hiperdia. Estas morbidades apresentam múltiplos fatores de risco, e por isso esperamos, também, que a equipe possa dar continuidade a este modelo de atenção longitudinal e integral, acrescentando cada vez mais esforços na abordagem multidisciplinar que estas morbidades requerem.

 

Agradecimentos:

Agradecemos a toda a equipe da UBS Loteamento da Esperança pela total disponibilidade e pelo caloroso acolhimento que nos foi fornecido ao longo do estágio. Rita, Rose, Tásia, Lúcia, Drª Cíntia, Enfª Isabelle e Cir. Dentista Sérgio: vocês são exemplos no trabalho em equipe e na dedicação à comunidade! Muito obrigado!