crônica da vida cotidiana na RHS II

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Erik Johansson
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Deleuze disse uma vez que fomos desapossados do mundo. E que, portanto, era preciso provocar acontecimentos, mesmo que pequenos, numa reação de estratégia micropolítica, mas plena de potência, para nos reapossarmos de um mundo por vir.

Assistimos o desenrolar nesta semana de um triste cenário na saúde com o aparecimento de forças reacionárias que se apresentam em falas como a do presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas. Quem leu a frase “Vou orientar os meus médicos a não socorrerem erros dos colegas cubanos”, rapidamente se afetou pelo ataque à ética e a todos os movimentos de afirmação de vida que compõem os esforços de luta por um mundo mais solidário. Seria cômica, se não fosse trágica, uma cassação de mandato deste senhor por aconselhar os médicos a infringirem um dos principais preceitos do código de ética médico: a omissão de socorro.

A RHS, por outro lado, resiste em sua vocação de ser máquina de expressão de acontecimentos potentes, furando o cerco dessas linhas duras com as suas linhas flexíveis e amorosas para com o outro.

 

O que querem e o que podem as as mobilizações que tomaram as ruas do Brasil? Como funciona o movimento de redes? O que se deseja e como se configura a liderança nessas novas formas de produzir acontecimentos? “A organização dos sem organização – oito conceitos para pensar o "inverno brasileiro", artigo de Rodrigo Nunes no Le Monde Diplomatique, abre a nossa iniciativa de curadoria na tentativa de veicular acontecimento no âmbito do pensamento sobre a realidade que vivemos hoje. Leiam no post:

 

Na mesma linha de buscar engajamento e participação nas lutas sociais por direitos, o post de Luciana Soares de Barros faz um convite a todos para comporem com o Fórum Permanente de Mobilização Social no Congresso Paulista de Saúde Pública:

“O fórum propõe construir um coletivo permanente que colabore com o enfrentamento do desafio de construção da agenda de direitos em nosso País e a importância dos movimentos sociais. Os direitos se traduzem no livre exercício da vida com plenitude, garantida por políticas públicas includentes e um sistema público de saúde que responda as necessidades de todos. Os movimentos sociais no Brasil estão atuando plenamente e participando de movimentos coletivos reinvindicatórios que mobilizam vontades para avançar na busca do comum e do que é público. Essa convocatória se faz necessária na construção de uma agenda coletiva e no esforço do aprofundamento do tema do congresso”.

https://redehumanizasus.net/64955-convite-forum-permanente-de-mobilizacao-social-no-13-congresso-paulista-de-saude-publica-da-apsp

 

Erasmo Ruiz nos faz pensar diferentemente sobre a morte e o morrer em seu post “O convívio com a morte no exercício profissional”, “uma arqueologia da cultura do sai prá lá com esse assunto”, como diz em seu comentário o Pablo Dias Fortes. O modo de tratar o tema produziu outras afetações como atesta a delicadeza da fala de Jacqueline Abrantes e o depoimento de Franklin: “ Vocês não imaginam o quanto os posts da "HumanizaSUS" me afetam e me instigam a continuar realizando atividades num contexto tão difícil. As ideias aqui discutidas produzem novos sentidos a vários fenômenos do cotidiano, principalmente este da morte – e sofrimento – que faz parte do meu dia a dia no estágio. Fiquei muito contente com o post de Erasmo Ruiz e muito afetado com o post de Jacqueline, que traz por meio um belíssimo texto "poético" a complexidade existente entre as chegadas e as despedidas. Sensacional.”

 

Mariella Oliveira posta o encerramento da formação de arquitetos e engenheiros em ambiência na saúde. Um arremate especial, por contar com a presença de Eduardo Passos, sempre ligado no “modo de fazer”. Ao contrário dos processos de construção de projetos arquitetônicos tradicionais, do tipo top-down , onde se projeta de cima para baixo, o que se propõe aqui é exatamente a participação conjunta de todos os atores da cena da saúde na própria concepção projetual. Criação de comum no modo botton-up de fazer.

E Miguel  Angelo Maia posta o evento de encerramento da Unidade de Produção Carioca do I Curso Nacional de Formação de Apoiadores Temáticos em Ambiência no SUS:

 

Trabalhadores, gestores, estudantes e professores de Maceió fazem a roda, conversam sobre cogestão, acolhimento em saúde e outras diretrizes da PNH. Compartilham iniciativas bem sucedidas nos espaços de trabalho, produzindo reencantamentos e tecendo redes, com desejo de incluir nessas rodas os usuários: “Mas não vamos desistir, vamos criar estratégias de chegarmos até eles e por fim incluí-los.” Relato da Luzia Malta no post:

https://redehumanizasus.net/64937-roda-de-conversa-sobre-a-valorizacao-do-trabalho-e-do-trabalhador-em-alagoas
 

O suicídio, tema de um Simpósio Interinstitucional no Piauí – estado com elevados índices de ocorrência – é pensado na RHS a partir também do olhar de filósofos. Seguir o paradigma médico seria um caminho necessário, mas incompleto. Detectar uma doença psiquiátrica naqueles que desistem da vida pode explicar o que realmente se passa neste gesto que sempre intrigou a humanidade?
O assunto despertou a atenção de alguns usuários, disparando a proposta da criação de um fórum de discussão sobre o tema na RHS.

Os diretores de unidades de Arapiraca se encontram numa oficina para discutir os processos de trabalho, buscando novos modos de produzir saúde. E a emoção rolou no final do evento, com o depoimento de Aline, autora do post: “sair das oficinas com nó na garganta só me faz lembrar que sou humana mesmo e que, sendo assim, sou um mundo, como todos ali”.

https://redehumanizasus.net/65011-3-oficina-em-arapiraca-para-gerentes-de-unidades-e-diretores-de-departamentos

 

Sabrina Ferigato nos conta de sua passagem pelo Espaço de Convivência Portal das Artes em Campinas. Um lugar onde se costuram afetos e relações como acontecimentos potentes para a produção de saúde.

“Ali, não se tratava apenas de um trabalho caridoso em que uma mulher doava seu tempo e suas habilidades para outras mulheres, tratava-se de uma troca de cuidados, de escuta, de técnicas, de saberes, de linhas, de cores… Costuravam-se vestidos, bolsas, saias, mas também se teciam novas relações, alinhavavam-se novos afetos e amizades”.

 

Intensidade e paixão são os ingredientes de nossa mistura RHSeana.

E como poderia ser de outra maneira, se sabemos, por nossa própria experiência de vida em rede, que eles funcionam como instrumentos poderosos contra o pessimismo desesperado daqueles que se dedicam a delimitar o espaço da saúde como um latifúndio de poucos.

Intensidade e paixão não respeitam cercas…

 

Editores/curadores da RHS