Morreu Rubem Alves. Viva Rubem Alves!

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Morreu Rubem Alves. O que tenho agora é a costumeira sensação que a morte nos deixa: vazio. Todo ser humano é insubstituível. Quando alguém nos deixa leva junto seu agir sobre o mundo e, por consequência, seu agir sobre nós. Mas parece que alguns são mais insubstituíveis que outros.

Rubem Alves tem esse perfil. Pensar que ele não mais escreverá nos inundando com sua costumeira vontade de viver parece prenunciar uma certa orfandade em um mundo que chafurda cada vez mais na violência e na indiferença com a dor do outro.  Rubem Alves tinha a virtude de nos lembrar sempre de coisas simples que a gente, a mercê das rotinas, vai se esquecendo no dia a dia.  Assim, sou obrigado a concordar com ele quando nos ensinava que “a vida não pode ser economizada para amanhã. Acontece sempre no presente".

Num momento em que assistimos a teologia ser usada como justificativa para a barbárie da violência e da morte ou então vender  a imagem de um Deus que protege seus eleitos com a abastança e o bem estar material, um deus horrendo, desumano e preconceituoso; Rubem Alves queria trazer a imagem de um deus benevolente como se implicitamente afirmasse que o homem também poderia ser daquela forma, com a doçura de uma criança: “Deus é alegria. Uma criança é alegria. Deus e uma criança têm isso em comum: ambos sabem que o universo é uma caixa de brinquedos. Deus vê o mundo com os olhos de uma criança. Está sempre à procura de companheiros para brincar”.

Ao ler Rubem Alves sentimos o atrevimento de querer mudar as coisas. A começar pela educação de nossas crianças. Hoje as escolas se preocupam mais com os conteúdos buscando o sucesso do desempenho. Rubem Alves era completamente refratário a essa ideia. A educação deve forjar seres humanos. Os conteúdos são aspectos secundários. Oo que nos torna homens é outra coisa. Há que se educar os sentidos, as emoções, são elas que oferecem bases para o conhecimento: “sem a educação das sensibilidades todas as habilidades são tolas e sem sentido”.  Como aprender poesia sem estar sensível às metáforas dos poetas? Como aprender a pintar sem refletir profundamente sobre as mensagens de uma pintura? Como existir sem usufruir das belezas desse mundo?

Não é possível educar pássaros a voar presos em gaiolas. Assim está a maioria de nossas crianças hoje, encarceradas física e mentalmente em salas de aula. E assim “educamos” crianças a ver o mundo de maneira opaca como se a opacidade fosse mero reflexo da realidade. Rubem Alves nos exortava a perceber o quanto a criatividade é destruída pelas rotinas pedagógicas quando na verdade ela deveria ser o objeto da educação. A escola deveria ser o lugar onde pelo exercício da curiosidade não só aprendemos matemática ou português mas também a usufruir as belezas desse mundo. Só podemos ser felizes se usufruirmos da beleza, “pois ser mestre é isso: ensinar a felicidade”.

O escritor do amor e da vida nos deixa uma obra extensa. Nesse sentido, estará sempre vivo. Ao  tentar ensinar o amor e a felicidade, ele seduziu milhões que aprenderam a amar o que escrevia. Nossa memória então perpetuará Rubem Alves. A força do amor gravará indelével em nós sua mensagem: “aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno”.