A “MENINA SÍRIA” DO BRASIL

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Por: Ane Caroline Janiro

Sei que este título soa estranho. Se for síria, não pode ser brasileira, oras! Porém, garanto que esta colocação será quase autoexplicativa ao longo do texto.

Nos últimos dias, a imagem da menininha síria que se rende a um fotógrafo por confundir a lente da câmera com uma arma, se tornou viral. A imagem não é tão recente como se imaginava, é do final de 2014 e foi publicada inicialmente em janeiro deste ano pelo jornal Türkiye, mas somente agora ganhou repercussão mundial. Milhares e milhares de pessoas compartilharam a imagem, comovidas e chocadas em imaginar as condições de vida não só desta criança, mas de outras que vivem como ela naquele país.

Em entrevista à BBC, Osman Sağırlı, fotógrafo autor desta imagem, citou que “faz mais sentido ver o que elas [pessoas] sofreram através das crianças e não dos adultos. São as crianças que refletem os sentimentos com a inocência que tem”.

Li a mesma notícia em diferentes fontes e, de forma unânime, os comentários a respeito exprimiam os mesmos sentimentos e desejos: acolher esta menininha frágil e assustada, se colocar no lugar dela, livrá-la deste sofrimento, frustração por estarmos tão longe e não podermos fazer nada por ela. Li até mesmo um “como faz para adotá-la”? Confesso que a imagem também me comoveu bastante, também fiz a reflexão a respeito do sofrimento imensurável a que esta e outras crianças estão submetidas, juntamente com suas famílias. Comecei a pensar se eu realmente não poderia fazer nada por “essas criancinhas sírias” e voltei o pensamento para a minha realidade.

Cheguei à conclusão de que eu estou cercada por “meninas sírias” aqui na minha cidade, no meu estado, no meu país. São as crianças que vivem sem qualquer condição de uma alimentação digna, que convivem com tiros e tráfico de drogas na porta de suas casas, que aprendem pelo exemplo desde cedo a conviver com a violência e o crime, sem saúde e educação de qualidade, sem afeto, sem a atenção e o cuidado que qualquer criança merece. A que está na Síria ou a que está aqui no Brasil.

Por que será que nos tornamos menos sensíveis a este tipo de sofrimento que está bem debaixo do nosso nariz? Por que será que não nos comovemos tanto e não acreditamos que este sofrimento das nossas crianças merece a mesma repercussão que a foto da garotinha síria? Talvez por estarmos mais acostumados a ver estas cenas? Pode ser. Admito que não sei bem a resposta para esta pergunta.

Prefiro acreditar que, se a imagem de uma situação que está a tantos quilômetros de distância de nós é capaz de nos tocar tanto o coração, ainda há esperança para que nos deixemos tocar por aquilo que acontece bem ao nosso lado. E que o desejo de fazermos algo para mudar isso, também seja o mesmo.

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Fonte: Psicologia Acessível