Vera Poty – uma UBS dentro da aldeia indígena Tenondé Porã

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Em 12.06.2015, fomos convidadas a conhecer a Unidade Básica de Saúde Vera Poty, localizada na entrada da aldeia guarani Tenondé Porã, no bairro de Parelheiros, no extremo sul da Capital de São Paulo. O nome parece ter sido dado em homenagem a uma criança que faleceu por falta de atendimento antes da instalação da UBS no local. A história é praticamente uma lenda, mencionada por funcionários e habitantes da aldeia que, no entanto, não a confirmam.

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A UBS é muito bem estruturada, e repleta de informações sobre assuntos diversos de saúde – prevenção de dengue, chikungunya e de picadas de cobras, lei municipal sobre atendimento preferencial, fornecimento de medicamentos na rede federal, estadual e municipal de saúde, métodos contraceptivos, cuidados para idosos e para vítimas de violência (incluindo exploração sexual de crianças), e sintomas de meningite – através de cartazes afixados em várias partes da unidade. Em um deles é possível ler que “Políticas públicas se faz com informação”.

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Na TV da UBS Vera Poty, ao invés de passar programas da rede globo (que só achincalham o SUS), o que passa são programas e conteúdos com orientações sobre saúde, produzidos pelo Ministério da Saúde. Modelo a ser seguido por todas as UBS’s do Brasil.

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Conhecemos também a aldeia Tenondé Porã e alguns de seus moradores, como o ex-cacique Manoel, atualmente integrante do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi), que nos explicou como funciona (mal) a articulação entre os representantes da aldeia e os representantes da administração pública.

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Em 2000, começaram o trabalho de regularização do território e de atendimento em saúde e educação com a FUNASA e com a FUNAI. Até 2010, era a FUNASA que atendia os índios, e a partir de 2011, a competência para atendimento da saúde da população indígena passou para a SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena).

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Segundo Manoel, com a FUNASA havia menos burocracia e funcionava melhor. Com o atendimento deles, a aldeia recebia reembolso do que havia gastado. Com a SESAI, não há reembolso, e a verba também não chega à aldeia.

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Segundo relata o ex-cacique, o representante da SESAI nunca apareceu na aldeia. A FUNASA comparecia através de representantes e tinha escritório local. Os índios propuseram a criação de um escritório local da SESAI mas não acontece. Há 4 anos a aldeia tenta providenciar junto à SESAI o conserto de fossas, mas não recebem retorno do Distrito. O agente indígena de saneamento (Aisan), na aldeia Tenonde Porã, segundo Manoel, não tem ferramentas para trabalhar.

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O controle social na SESAI é feito através do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) responsável por fiscalizar, debater e apresentar políticas para o fortalecimento da saúde em suas regiões. Manoel, membro do Condisi do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Litoral Sul, reclama que se o índio falta a duas reuniões (realizadas apenas em Curitiba, sede do distrito sanitário a que pertence a aldeia), perde o cargo, mas o mesmo não acontece com os brancos, que podem faltar a mais de duas reuniões sem perder o cargo representativo. Os bancos recusam abertura de conta em nome de pessoa física e do conselho indígena (para recebimento de ajuda de custo – transporte, hospedagem e alimentação – para a viagem até Curitiba) alegando “ausência de salário”.

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Assim como os índios da aldeia Brilho do Sol de São Bernardo do Campo (https://redehumanizasus.net/90503-todo-mundo-aqui-e-beija-flor-entre-a-funai-e-a-sesai-sao-bernardo-e-sao-paulo-a-aldeia-brilho-do-sol), também os índios da aldeia Tenondé Porã têm problemas para transportar quem necessita de tratamento de juruá (branco), para problemas de saúde não solucionados pelas ervas medicinais. As viaturas para transporte de pacientes até hospitais e atendimentos em especialidades, fora da UBS, são emprestadas do Saneamento da SESAI e funcionam até às 17h00. Há apenas um carro da UBS que funciona 24 horas.

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O problema não foi referido apenas por Manoel, mas também pelo atual cacique Elias e pela Professora Jera, que estavam em reunião com os estudantes e jovens da aldeia naquele dia e nos convidaram a participar. Aproveitando a nossa presença, relataram a situação e as demandas de saúde local:

– faltam carros para transporte até a cidade para atendimento hospitalar e em especialidades, e faltam médicos (há só uma médica na UBS, que atende apenas em dois dias da semana);

– há fossas transbordando, com esgoto a céu aberto;

– quando um Aisan (agente indígena de saneamento) tira férias, não há outro funcionário para substituí-lo no trabalho;

– as visitas dos representantes da OS responsável pelo atendimento em saúde na aldeia não são frequentes;

– há somente duas caixas d’água para abastecimento das aldeias Tenondé Porã e Krukutu, bem próxima de lá, que precisam de reparos (estão carcomidas por ferrugem).

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“A aldeia é pequenininha, mas tem muitas pessoas” diz a professora Jera. A Tenondé Porã tem 26 hectares, que foram demarcados em 1987. A FUNAI reconheceu 15.900 hectares no total, mas ainda não os demarcou. Mas antes mesmo da demarcação, os territórios já estão sendo invadidos. E com a instalação de wi-fi no CECI (Centro de Cultura Indígena), jovens “juruás” invadiram o local e trouxeram drogas…”

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Assim, infelizmente, o transporte que falta para os índios para o atendimento público em saúde, não falta quando subsidiado privadamente por traficantes de drogas e por invasores de terras indígenas.

Stella Maris Chebli, apoiadora da PNH, e Débora Aligieri, do coletivo de editores/curadores da Rede HumanizaSUS