Um beijo para o querido Geraldo- Texto de Luís Fernando Tófoli

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Um beijo para o querido Geraldo

Acabo de saber, pela tela azul, fria e viciante do Facebook, que Geraldo Peixoto morreu anteontem. Sinto-me no imperativo de atrasar um pouco o começo das atividades do dia para imediatamente escrever algumas linhas sobre este gentil guerreiro.

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Conheço o Geraldo desde os tempos em que seu filho André (que também está nessa foto do Ernesto Rodrigues/Estadão) se tratava e eu trabalhava no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Itapeva. Desde aquele tempo eu sentia que ele entendia melhor as minhas posições de crítica no seio da própria Luta Antimanicomial do que muitos colegas profissionais de saúde, nesse espaço ainda marcado por muitos dogmas e rituais. Geraldo era um rebelde até nisso, e sabia confrontar os próprios cânones da Reforma Psiquiátrica com o olhar de dentro.

Diversas vezes eu o vi dizer que entrou na Luta Manicomial no dia em que levou um murro na cara, desferido por seu filho André, em uma situação de crise. A materialidade dessa conversão é muito mais visceral do que sentimentos cristãos de piedade com os louquinhos ou do que as operações teórico-prático-filosóficas basaglianas ou foucaultianas, e Geraldo sabia disso, por isso nunca cansou de nos contar essa história.

Há alguns anos esse relato mudou de tom, e se vestiu ainda da dor da saudade. André morreu antes do pai, mas Geraldo continuou na luta, contando o acontecido, posicionando-se criticamente, militando, mesmo depois de passar a marca dos oitenta anos.

Tive o prazer de ter alguns encontros fortuitos pela Pauliceia com o Geraldo, que sempre me saudava com grande carinho — um carinho recíproco. Desses encontros, o que mais me marcou foi um que aconteceu no ano passado, na boca do Metrô Clínicas em que ele ia para uma reunião da Luta Antimanicomial e eu voltava de uma atividade do movimento antiproibicionista. Um abraço forte marcou o encontro de linhas militantes que se cruzavam.

Agora não mais nos encontraremos por aqui. Sentirei saudades desse combativo e amoroso senhor. Beijo grande, meu querido, vai em paz.

Texto de Luís Fernando Tófoli