BARREIRAS NA SAÚDE, ACESSIBILIDADE E MOBILIDADE URBANA: Contradições estruturais da Cidade Olímpica.

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Considerando o precário estado dos serviços públicos de saúde na na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, no que concerne ao atendimento das demandas da população, a proximidade dos Jogos Olímpicos 2016 nos causa imensa preocupação. Caso algum atleta, profissionais dos diversos setores de cobertura do evento, ou expectador comum, necessite recorrer aos serviços da nossa rede pública de saúde, efetivamente, terão a constatação da absurda falta de respeito estampada na desorganização de serviço essencial à vida da população.

Da mesma forma preocupante as condições de mobilidade urbana e acessibilidade disponíveis na Cidade do Rio de Janeiro, quase às vésperas da abertura dos jogos olímpicos e paralímpicos 2016, poi, lamentavelmente, não oferecem aos atletas, público, familiares e acompanhantes de pessoas com deficiência, menores perspectivas de satisfação em participar desse evento tão representativo na história da humanidade. Sabe-se que a escolha da cidade sede olímpica é definida em solenidade pública, amplamente divulgada pela mídia internacional, momento em que autoridades políticas e empresariais da vencedora, assumem compromisso de receber as pessoas com estrutura urbanística e de acessibilidade compatíveis ao que se pressupõe civilizável.

Não caso brasileiro, não foi diferente, nossas autoridades políticas e empresários das áreas afins à realização do evento, não apenas apresentaram projetos faraônicos, como deliraram com devaneios megalomaníacos, como os manifestados por ocasião da (des)organização e fiasco da Copa do Mundo de Futebol de 2014, realizada no nosso país. Sobremodo distantes das precárias condições de transporte público na cidade do Rio de Janeiro, por conveniência e valendo-se do conforto de seu carros oficiais, não fazem ideia do desgaste diário a que fica exposta sua população. Por isso, não conseguem imaginar como nossos visitantes sofrerão, sem pontualidade, conforto, bem estar e segurança, disponíveis no sistema de transporte de massa de seus países.

Pessoas com mobilidade reduzida, deficiência física, cadeirantes e demais pessoas com deficiência que chegarão para o evento, terão de enfrentar barreiras arquitetônicas, comunicacionais, atitudinais, resultantes de projetos mal elaborados, ou que tiveram reduzidos seus orçamentos, devido aos desvios para pagamento de propinas e toda sorte de corrupção. Muitas são as manchetes televisivas denunciando irregularidades nas perigosas rampas de acesso aos estádios, arenas, ginásios, centros esportivos, construídas em desacordo com normas técnicas da ABNT 9050. Afinal, de que servem normas técnicas de acessibilidade, sem que sejam aplicadas na prática, constem rigorosamente dos projetos e estejam visíveis nos resultados objetivos das construções.

Coloque-se no lugar do turista com deficiência, cadeirante, impedido de transitar com autonomia nas calçadas próximas aos monumentos e pontos turísticos da cidade, posto que as rodas dianteiras da cadeira ficam presas nos espaços entre um e outro lance de calçada. Imagine o constrangimento do cadeirante, cego, ou pessoa com mobilidade reduzida que queira embarcar em vagão de metrô, em estações com plataformas desniveladas, além do inconsequente uso das áreas reservadas para cadeirantes, por usuários sem deficiência. Como embarcar em e stações sem elevador que os conduzam com segurança aos pisos superiores ou inferiores de acesso às áreas de embarque.

Constrangimentos desnecessários passarão muitos visitantes usuários de cadeiras de rodas, nas frustrantes tentativas de embarcar nos nossos ônibus, cuja plataforma vertical esteja emperrada, inoperante. Sem falar no mau humor, indiferença, expressadas pelos condutores e auxiliares do coletivo.

O sentimento de exclusão dos visitantes cegos diante dos diversos equipamentos que transmitirão dos jogos, sem utilizar de recursos de audiodescrição. Da mesma forma excluídos, os surdos brasileiros diante dos mesmos equipamentos sem contar com janelas de tradução simultânea em Libras, pois que aos estrangeiros caberiam recursos e investimentos mais robustos, suficientes para viabilizar acesso aos códigos específicos da língua de sinais vigente em seus países. A menos que se tente minorar barreiras comunicacionais e se recorra à startup desenvolvida por alunos do curso de ciências da computação da Universidade Federal de Pernambuco, aprimorada pela ProDeaf, que traduz texto e voz para línguas de sinais brasileira e americana, português e inglês, disponíveis para smartphones Androide. 

Nossa rede hoteleira, via de regra, desprovida de acomodações acessíveis para cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida, sempre nos causa desconforto, frustração, indignação. Muitas vezes valendo-se de improvisações que mais dificultam que facilitam acesso aos banheiros, desde que para apenas higiene oral, evacuar ou banho de asperção. São as instalações de acessibilidade da rede hoteleira que mais fogem ao recomendado pela NBR 9050 ABNT, embora seus projetos de engenharia e arquitetura contemplem tais normas, mas, a fiscalização é substancialmente ineficaz na avaliação dos critérios para liberação e autorização de funcionamento dessas instalações.

No âmbito da mobilidade urbana, vexame anunciado que bem pode ser evitado através da instalação de dispositivos táteis com sinalização em braile, para que os cegos alcancem com segurança e não fiquem desorientados nos estádios, arenas, entre outros ambientes. Mais difícil, porém, evitar desgastes dos visitantes cegos que se aventurarem atravessar nossas ruas, avenidas, sem sinalizadores sonoros, ou, mesmo circulando em áreas internas dos hotéis, bares, restaurantes, desprovidos de recursos de acessibilidade tátil comunicacional.     

Já que nossas representações políticas e empresariais não fizeram o dever de casa, e, diga-se de passagem, falharam feio, e muitos recursos desceram pelos ralos da corrupção, resta a esperança de que grupos voluntários oriundos das diferentes partes desse imenso Brasil, se apresentem dispostos a demonstrar nossa grandeza, acolhendo a todos com a receptividade, cordialidade, fraternidade e deferência, que nos caracteriza povo hospedeiro.

 

Wiliam Machado