O que pode o VER-SUS?

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Joseph BeuysQueen Bee, 1952, 50,1×65 cm.

Falar sobre a experiência do projeto Vivências e Estágios na Realidade do Sistema Único de Saúde (VER-SUS), implica na produção de sentidos e significados sobre a defesa da saúde como direito constitucional resultado de intensa participação popular após a ditadura militar. Então, uma experiência que tem na essência de sua identidade uma aposta societária e civilizatória para a promoção de direitos, cidadania e saúde.

As vivências em São Paulo são construídas por uma comissão que congrega estudantes de diferentes Instituições de Ensino Superior (IES): Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP), Curso de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), Curso de Terapia Ocupacional e Residência em Redes de Atenção Psicossocial da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/Baixada Santista). Este coletivo, em busca de gestões municipais que solidificassem e inovassem as Redes de Atenção à Saúde, em julho de 2014 realizou a primeira experiência no município de São Bernardo do Campo. E, a partir desta, ampliou a organização dos estágios de vivência para as cidades de Mauá, Santos, Guarulhos e São Paulo, no verão de 2015 (Lorena et al, 2016), Comunidade Heliópolis/SP e Encontro Paulista do VER-SUS no inverno de 2015, inovando na vivência do ano seguinte (2016.1) na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) de Santos.

E como produção de novidade o VER-SUS/SP reinventa-se no seu processo de vivência na edição inverno (2016.2) construindo relações com os movimentos de moradia no Centro e Zona Sul de São Paulo dialogando a saúde com as questões moradia e direito a cidade.

Assim, será necessário resgatar a reflexão que:

O fato é que ninguém determinou, até agora, o que pode o corpo, isto é, a experiência a ninguém ensinou, até agora, o que o corpo – exclusivamente pelas leis da natureza enquanto considerada apenas corporalmente, sem que seja determinado pela mente – pode e o que não pode fazer. Espinosa. 

O que Espinosa quer dizer é que a nossa relação com o corpo precisa ser repensada e sempre discutida entendendo que o corpo é uma expressão social, política e coletiva dos indivíduos e que expressa em si multiplicidades no encontro de um corpo com o outro.

E se olharmos para a experiência do VER-SUS/SP nos diversos territórios e munícipios que as vivências paulistas vêm passando, podemos dizer que o corpo do VER-SUS/SP pode fazer muita coisa, inclusive, desterritorializar todos e todas que passam por esta experiência rizomando para a produção de uma vida mais valiosa reconhecendo que a vida de todo mundo vale a pena.

Uma experiência desterritorializante é quando eu saio do meu território e vou para um lugar desconhecido, desabitado por mim anteriormente, mas, que pode ser habitado por essa vivência do incomum construindo com seus pares um lugar comum.

Se o VER-SUS é experiência única e cada um pode dar sentido para aquilo que se viveu, a pergunta que Espinoza faz não importa. Não faz sentido. Mas, experimentar o corpo-militante que as vivências e estágios no SUS proporcionam conhecer. Então, um contraponto a Espinosa e ao VER-SUS/SP seria: quais sensações o seu corpo experimentou com o VER-SUS?

Vistas dos pontos de vistas

Como disse, as vivências aconteceram no Centro e Zona Sul de São Paulo com os movimentos de moradia discutindo sobre saúde, cidade e ambiente urbano.

No Centro de São Paulo mais de vinte estudantes de todos os tipos, cursos e lugares do Brasil puderam conhecer com profundidade a realidade do SUS municipal que vem sendo construído com bastante empenho e esforço dos trabalhadores da saúde, gestores e usuários considerando também que quem passa por um estágio de vivência como o VER-SUS/SP deixa a sua marca nos territórios que circulam afetando e sendo afetado para compor outra política de saúde por conta de sua vivência com a própria saúde fabricando uma política de saúde mais participativa no cotidiano.

No encontro que tivemos nos serviços de saúde da atenção básica e das especialidades, além de outros que se destaca como Transcidadania, De Braços Abertos, Consultório na Rua Barra Funda, Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes. Tais lugares se destacam, para mim, no campo da micropolítica da diferença, por conduzir uma política em defesa da vida na diversidade coletiva. População T, pessoas que usam drogas, pessoas em situação de rua e imigrantes não tem sido prioridade de alguns governos, muitos menos, se olharmos para a conjuntura atual, o governo ilegítimo e o golpe inconstitucional.

A experiência de viver intensamente sete dias seguidos com estudantes, facilitadores, trabalhadores, gestores, movimentos sociais, usuários faz despertar a responsabilidade que Bauman nos lembra no livro A Arte da Vida:

Positivamente, a partir do momento que o outro me olha, sou responsável por ele (…). Sou responsável de uma responsabilidade total, que responde por todos os outros, até mesmo por sua responsabilidade.

O SUS é um sistema de saúde integral, universal, com equidade e participação social, portanto, eu sou tão responsável por uma pessoa que usa droga quanto à pessoa que usa droga é responsável por mim. O que estamos construindo desde a constituição de 88 é uma consciência coletiva e política do viver em uma sociedade mais humana e igual com menos desigualdade e mais diferença!  

 

Referências

LORENA, A. G.; VINHAS, B. C. V. ; ROSA, E. H. ; MORALES JUNIOR, R. ; CONCEICAO, M. R. ; AKERMAN, M. . O VER-SUS como dispositivo de diálogo na formação em saúde e nos serviços de saúde: Conectando saberes e práticas. In: FERLA, A.A.; MARANHAO, T.; ROCHA, C.M.; PEIXOTO, G.P.; SILVA, I.F.; BARRIOS, S.G.; ROCHA, V. (Org.). VER-SUS Vol. 2 – Múltiplos cenários do VER-SUS: Vivências e Estágios de Norte a Sul do Brasil. 1ed.Porto Alegre: Rede Unida, 2016, v. 2, p. 88-92.