CARTA ABERTA CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO MUNICÍPIO DE JOINVILLE SC

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“Nós da Rede Intersetorial de Articulação para o Cuidado Compartilhado de Pessoas em Situação de Rua de Joinville, somos um grupo de profissionais comprometidos com a qualidade e funcionamento adequado dos serviços públicos em nosso município.

Compartilhamos esta CARTA ABERTA  e contamos com sua colaboração para a leitura e compartilhamento da mesma em vossas redes.

Estamos abertos e disponíveis para o diálogo e na busca de construções alternativas, contra as terceirizações, para o melhor funcionamento de nossos serviços.”

 

CARTA ABERTA CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS
NO MUNICÍPIO DE JOINVILLE SC

Nós, servidores públicos que compõem a Rede Intersetorial de Articulação para o Cuidado Compartilhado de Pessoas em Situação de Rua de Joinville, que engloba serviços de referência para usuários em grave situação de vulnerabilidade social, tais como CAPS AD, Unidade de Acolhimento, Centro POP, CAPS II, Consultório na Rua e Abordagem Social, manifestamos nossa indignação frente ao avanço das privatizações dos serviços públicos de saúde e assistência social que vêm ocorrendo em nosso município. Destacamos que atualmente está em curso o processo de terceirização da Unidade de Acolhimento Adulto da Secretaria da Saúde, vinculada ao CAPS AD, sob o argumento do alto custo de manutenção e uma suposta subutilização do serviço.

Especificamente em relação a esta unidade, ressaltamos que durante seus quatro anos de existência não houve esforço suficiente da gestão para credenciar a mesma junto ao Ministério da Saúde, o que implica no não recebimento de verbas e incentivos financeiros pelo município. Esta ausência de credenciamento e investimento financeiro resultou no sucateamento do serviço, obrigando o mesmo a atuar com sua capacidade de atendimento reduzida pela metade (de 15 para apenas 6 leitos), funcionando em espaço insalubre, com insumos e materiais insuficientes para suprir as demandas do público que atende.

Denunciamos que a transferência da responsabilidade de atendimento e execução das ações de saúde e assistência social para instituições privadas e do terceiro setor, representam um retrocesso no avanço das Políticas Públicas baseadas no conhecimento científico e na garantia de direitos. Tais instituições, a exemplo de alguns modelos que já foram implementados em Joinville, como as Residências Terapêuticas 1 e 2, Residência Inclusiva, Casa de Passagem e leitos em Comunidades Terapêuticas, estão na contramão das políticas oficiais do Ministério da Saúde e do Ministério de Desenvolvimento Social.

Dentre os inúmeros problemas que a terceirização dos serviços de saúde e assistência social envolvem, podemos destacar a drástica redução e precarização dos Recursos Humanos especializados para atender tais demandas, a falta de observação de requisitos mínimos para o funcionamento de cada unidade, a lógica de trabalho pautada em preceitos morais e religiosos e não em conhecimento científico, a inobservância dos direitos individuais específicos de cada população atendida (transtorno mental, usuários de drogas e pessoas em situação de rua) e a extrema dificuldade do poder público em fiscalizar e trabalhar de forma articulada com tais instituições, haja visto que as mesmas possuem um “regimento próprio” que guia suas ações em direções contrárias ao que é desenvolvido no setor público.

Além do descumprimento dos marcos legais, o processo de terceirização que está sendo operado no município demanda aos serviços da rede pública um investimento profissional dobrado, no sentido de resolução dos problemas que emergem no dia a dia e que as instituições não dão conta de resolver. Esta situação resulta em sobrecarga de trabalho às equipes multiprofissionais dos serviços da rede pública, bem como em ônus ao município, já que tais problemáticas exigem o contínuo suporte técnico-profissional destas equipes especializadas e frequentes internações de longa permanência, descumprindo assim o objetivo central do estabelecimento de parcerias público-privadas o qual visa, em tese, reduzir custos e proporcionar a prestação de serviços especializados.
Por fim, destacamos o entrave jurídico legal de tais ações. Segundo Pianetti (2014) a saúde é dever do poder público e não pode ser terceirizada à iniciativa privada. Para a jurista, muito se tem discutido sobre a participação complementar de entidades paraestatais sem fins lucrativos nos serviços públicos nos últimos anos, isso porque se tornou corriqueira a prática de transferência de gestão, operacionalização e execução
destes serviços para entidades privadas.

A grande discussão reside na inconstitucionalidade e ilegalidade destas ações. A autora cita como exemplo a Lei nº 8.080/1990 que aborda a complementariedade da atuação da iniciativa privada nos serviços públicos de saúde na hipótese de estrutura insuficiente, vedando, entretanto, sua atuação de forma substitutiva.

Entende-se por participação complementar a execução de atividades classificadas como atividades-meio da administração pública, e não daquelas classificadas como atividades-fim. Nesse contexto, o poder público poderia delegar, por exemplo, a prestação de alguns serviços técnicos especializados mas não poderia transferir a gestão completa de um hospital ou unidade de atendimento a uma entidade privada.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n° 8.080, 19 set. 1990. Dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos
serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
20 set. 1990.

PIANETTI, CAROLINA ALVES CHAGAS. A terceirização dos serviços de saúde
no Brasil. Migalhas, julho de 2014. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br>
Acessado em: 16/05/2018.

Assinam a carta as equipes dos seguintes serviços:

CAPS AD – Secretaria da Saúde
Unidade de Acolhimento – Secretaria da Saúde
Consultório na Rua – Secretaria da Saúde
CAPS II – Secretaria da Saúde
Centro Pop – Secretaria de Assistência Social
Abordagem Social – Secretaria de Assistência Social