A Morte do Sr Lazarescu

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Eu adoro o carnaval…pelos dias de folga que a festa permite. Momento de colocar a vida em ordem, um pouco de trabalho chato da rotina de professor e, ao mesmo tempo, permite que a gente coloque em dia a lista interminável de filmes ainda não vistos.

 

 Neste carnaval tive a alegria e a tensão de assistir "A Morte do Sr Lazarescu", uma produção romena de 2006 do Diretor Cristi Puiu,   muito elogiada na época de seu lançamento embora os elogios não fossem unânimes. Particularmente, gostei do filme. Mas vamos a um breve resumo do seu enredo.

 

O Sr Lazarescu é um home de mais de 60 anos que repentinamente começa a sentir dores abdominais e desconforto físico generalizado. A sua primeira dificuldade é sensibliizar alguém para o seu problema. Decide chamar uma ambulância mas isso é um luxo diante da precariedade do serviço de saúde que desloca suas ambulâncias para casos considerados mais graves. O fato de ser alcoolista também não sensibiliza os vizinhos que "diagnosticam" seus sintomas como reflexos de mais uma bebedeira. Começa então sua saga por inúmeros serviços de saúde onde ele é empurrado de um lado para o outro como um objeto inútil sem qualquer esclarecimento sobre o que estaria acontecendo com ele.

 

Embora o filme se anuncie como uma comédia, não esperem por humor fácil nesse filme. Se você for trabalhador de saúde e se pegar rindo entre uma cena e outra, há alguma coisa errada e com certeza não será com o filme. O diretor é extremamente objetivo em mostrar um drama peculiar aos pobres e miseráveis mas que pode não parecer ter muito sentido se você usufrui de algumas das benécias da classe média. Fala de solidão e abandono, aquela solidão terrível sentida pelos velhos em meio a pessoas que mal lhes dirigem a palavra, aquela solidão que faz o indivíduo se olhar no espelho e ansioso perceber que está sozinho diante da própria morte mesmo que o mundo esteja do seu lado.

 

O realismo do filme pode ser extremamente desagradável, principalmente quando fica claramente exposto que todos os profissionais que manuseiam o corpo do Sr Lazarescu não se importam com seu destino enquanto ser hmano já que ele é esquadrinhado como uma coisa, uma máquina velha com problemas em algumas peças. E todas essas pessoas tem que manejar a própria vida e, de certa forma, estão também solitárias numa sociedade que cada vez mais exalta o individualismo.

 

 

Preso entre um humor mórbido e a tragédia, o personagem do filme e seus cenários constroem um mundo em desencanto, pincelam aquilo que parece existir de pior na contemporaneidade resumida na figura fria e cínica dos médicos e de quase todas as enfermeiras. O alento vem de uma das enfermeiras que insiste em estar ao lado de Lazarescu por toda sua jornada.

 

Mas o que me deixou mais triste foi perceber que muito do filme já encontrei pela minha vida pessoal. Antes a arte de "A Morte do Sr Lazarescu" fosse algum exagero surreal ou uma metáfora da Romenia pós socialismo. Não,  o filme não tem nenhuma pretensão metafórica. É apenas uma denúncia do que acontece na vida de milhares de pessoas anônimas nos corredores de hospitais sem resolutividade. Esses rostos anônimos com biografias anônimas para aqueles que os atendem, caminham em busca desesperada de salvação mas esbarram nos muros da burocracia das instituições com o fel do tempero da indiferença e do individualismo.

 

O filme se passa em Bucareste na Romênia mas está acontecendo agora mesmo em qualquer cidade brasileira!