Medicina Narrativa
Medicina Narrativa: Entrevista com Rita Charon
Journalism
Medicina Narrativa: saber o que fazer com as histórias dos doentes
Se os médicos não souberem absorver e agir sobre as histórias que ouvem perderão a oportunidade de viver uma ligação real e terapeuticamente significativa com os seus doentes que serão, assim, deixados "à deriva." A Profª Rita Charon (ver entrevista), fundadora e directora do programa pioneiro de Medicina Narrativa na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, foi uma das oradoras do Colóquio Internacional Narrativa e Medicina: Doença e Diálogo que juntou em Setembro, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, médicos, filósofos ou investigadores na área dos estudos literários para um debate em torno da importância dos processos narrativos na prática clínica
Imagine os receptores numa membrana celular, à espera de se ligarem a determinadas moléculas. Quando o contacto acontece, uma sucessão de reações químicas desencadeia-se no interior da célula. Do mesmo modo, um médico precisa de ter os seus receptores alerta diante da pessoa que o procura. E o que liga médico e doente? Que "ligando" é esse? São as histórias, argumenta a Profª Rita Charon, fundadora e directora do programa de Medicina Narrativa na Columbia University College of Physicians and Surgeons, em Nova Iorque, autora do livro Narrative Medicine: Honoring the Stories of Illness (2006). Esta Internista norte-americana, apaixonada pela escrita do romancista Henry James (1843-1916), defende que os médicos e outros profissionais de saúde devem aprender a escutar, a absorver e a comoverem-se com as histórias pessoais dos seus doentes, para um cuidado mais humano e ético.
Como explica na entrevista a NOTÍCIAS MÉDICAS, a Medicina Narrativa, expressão que ela própria cunhou, "é uma prática clínica fortificada pela capacidade de saber o que fazer com as histórias."
No âmbito do Programa de Medicina Narrativa que a Profª Rita Charon criou no ano 2000 na Universidade de Columbia, os estudantes de medicina aprendem a escutar e a dialogar com os doentes e são instados a escreverem numa "ficha clínica paralela" o que os emociona no dia-a-dia do hospital. Ao escreverem, apreendem as situações vividas de uma forma mais nítida e podem corrigir eventuais lacunas. Médicos disponíveis, capazes de escutar e absorver as histórias dos doentes estarão mais bem equipados para criarem ligações significativas com os seus pacientes, muitas vezes resgatando-os da solidão e da incompreensão face ao seu sofrimento. "Os médicos têm de entrar nestes enredos complexos para imaginar o que a situação deve ser por dentro. Precisamos de imaginação e de fluência, enquanto leitores e receptores dos relatos dos outros. Isto ainda não é ensinado nas Escolas Médicas, mas estamos a chegar lá! Na ausência desta fluência, o médico fica infeliz e incapaz de vislumbrar o que de facto está a ocorrer na vida do doente para além do confinamento dos órgãos."
Há falta de preparação para lidar com as "revelações" que a doença pode desencadear, por medo ou como estratégia defensiva, e os clínicos perdem a oportunidade de manterem um contacto real e terapeuticamente significativo com a pessoa doente que é, assim, "deixada à deriva."
Voltando à metáfora da membrana celular, a Profª Rita Charon assinala que "quanto mais histórias ouvir e ler, mais povoada ficará a minha superfície com receptores que podem ser animados." E tal como as reacções químicas que se desencadeiam no interior da célula quando o receptor da membrana se liga a uma molécula específica, também o médico, quando se liga à história do seu doente, activa e mobiliza dentro de si não só o seu conhecimento clínico, mas também a sua memória, a sua imaginação ou o seu sentido da beleza. "Existe espaço para um encontro entre os mundos privados de médicos e doentes e para a intersubjectividade", assegura.
Senti que não tinha de convencer um estranho do meu sofrimento
Um dia, a Profª Rita Charon recebeu no seu consultório um jovem de 28 anos de idade preocupado com alguns sintomas que sentia há algum tempo. Já tinha consultado vários médicos, mas perante os resultados das análises todos lhe diziam que estava bem. Ele sabia que não. Os tremores, os espasmos e as dores de cabeça persistiam e ele sentia-se cada vez mais isolado. Quando falou com o jovem no seu consultório, a Profª Rita Charon disse ter ficado surpreendida com as "imagens extraordinárias" que ele usava para descrever as suas maleitas. A médica escutava, esforçando-se por captar o sentido das suas palavras quando ele lhe falava da sensação que tinha de que tudo o que ingeria atravessava o seu corpo. A médica arriscava a imagem de que antes o corpo dele era como um jardim, com terra que absorvia o alimento, e que agora era como se existisse um tubo de metal por onde os alimentos escorregavam. O jovem assentia.
A Profª Rita Charon escreveu sobre este encontro clínico peculiar e quis publicá-lo num artigo. Enviou então o texto ao seu doente, pedindo-lhe permissão para publicar o relato. Na resposta que recebeu por email, o jovem escreveu: (…) senti que tinha sido ouvido pela primeira vez desde o aparecimento destes sintomas aterradores e que, finalmente, tinha um aliado. Senti-me ligado a uma fonte de conhecimento e poder e, por isso, senti-me protegido. Senti que não tinha de convencer um estranho do meu sofrimento…um laço de companheirismo humano criou emoções fortes que substituíram a minha doença.
A Profª Rita Charon sublinha: "isto foi conseguido dizendo praticamente nada…ele diz de forma mais eloquente do que eu o que pode acontecer ao darmos espaço para este contacto."
Falta vibrato emocional às novas gerações
O Prof. João Lobo Antunes, neurocirurgião e ensaísta, Director do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, diz encontrar apoio e consolação na cultura humanista ao lidar com "o labirinto vertiginoso de emoções" que a vida e a doença despertam. Na conferência de abertura do Colóquio Internacional Narrativa e Medicina: Doença e Diálogo, lamentou que à nova geração de médicos falte frequentemente "o vibrato emocional" que ainda sente na sua vida. "A resposta emocional parece ser tão branda, como se não estivessem interessados ou com medo de mergulharem no mundo das emoções ou de lidarem com outra solidão." Diz que "a falta de curiosidade" que sentem em relação aos doentes e essa resposta emocional superficial torna-os incapazes de lidarem com as narrativas da medicina. "Uma vez que não sabem como perguntar ou como obter uma narrativa, não sabem responder a nenhuma questão que saia fora do alcance limitado do seu conhecimento médico e das maravilhas tecnológicas."
O neurocirurgião diz ter aprendido ao longo dos anos "que as primeiras palavras são transmitidas silenciosamente pelo rosto e, especificamente, através dos meus olhos. Mesmo antes de falar, já muito foi dito. Aprendi que não se pode negar através das palavras o que os olhos já disseram." Também defende que os clínicos não podem "matar a esperança" aos seus doentes, fugindo ou mostrando um cepticismo indisfarçado. Não se trata de mentir, mas de ser capaz de mostrar, por vezes, "uma discrição compassiva."
Ter cultivado o gosto pelas Humanidades antes de se tornar médico deu ao Prof. João Lobo Antunes "a capacidade para ouvir outras vozes e entender o significado total do discurso" e isso depende muito da educação que se recebe em casa, sustenta, e daquele "treino à mesa de jantar onde se fala de assuntos sérios com inteligência e humor e que nos permite falar com qualquer pessoa, do pescador ao executivo."
A ficção foi inspiradora e com a filosofia, afirma, aprendeu a manter "uma visão límpida, a capacidade de ver além das aparências e de fazer perguntas, sabendo de antemão que as respostas serão provavelmente novas perguntas."
Este colóquio, que contou com a participação de médicos, enfermeiros, filósofos, psicanalistas, escritores ou investigadores na área dos estudos literários, foi organizado conjuntamente pelo Centro de Estudos Anglísticos e pelo Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa e pelo Centro de História da Cultura da Universidade Nova de Lisboa. O encontro privilegiou também a divulgação artística em torno da narrativa e do sofrimento, nomeadamente através da exibição de filmes na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa Espelho Lento (2010), de Solveig Nordlund e Perdida Mente (2010), de Margarida Gil e da exposição de Ex-Votos na Galeria da Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, da responsabilidade do Prof. João Patrício, Cirurgião e Professor Jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, que se tem dedicado ao estudo destes objectos de culto e de cultura e que NOTÍCIAS MÉDICAS já entrevistou (ver NM nº2904, de 10.5.2006).
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Profª Rita Charon
Directora do Programa de Medicina Narrativa na Universidade de Columbia (Nova Iorque)
Os médicos têm de perceber que a sua presença tem
Em entrevista a NOTÍCIAS MÉDICAS, a Profª Rita Charon explica o que é a Medicina Narrativa e de que forma pode ajudar médicos e doentes a partilharem ligações mais empáticas e significativas. Ao não se envolverem a fundo nas histórias dos doentes, os médicos procuram defender-se do sofrimento. "Isso é verdade", afirma a Profª Rita Charon, "mas o que eles não sabem é que não recebem nenhuma alegria e é por isso que sentem burnout e um vazio por dentro"
O que é a Medicina Narrativa?
A Medicina Narrativa é uma prática clínica fortificada pela capacidade de sabermos o que fazer com as histórias. Não substitui nada daquilo que os clínicos fazem, mas é fortalecida pela compreensão das consequências que têm as histórias que nos são contadas. Aprendemos a habitá-las, a captar toda a evidência que essas histórias nos oferecem e a comovermo-nos com elas o que é muitas vezes esquecido e a agir perante aquilo que aprendemos.
Toda a gente chamava a esta abordagem Literatura na Medicina ou Humanidades na Medicina, mas nunca gostei destas expressões. Lembro-me do dia, no ano 2000, em que a expressão Medicina Narrativa me surgiu. Estava a escrever um artigo e procurava um título. Primeiro escrevi o hemisfério narrativo da medicina, mas não me agradou, porque isso significava que existiria um hemisfério não-narrativo da medicina. De facto, muito daquilo que nós, médicos, fazemos é baseado na narrativa, seja a investigação, o ensino ou o cuidado individual. Há muito pouca coisa na medicina que não é narrativa.
Apercebi-me imediatamente que a expressão Medicina Narrativa era boa. Parece Medicina Interna ou Medicina Nuclear, como algo que se pode fazer, continuando a ser médico. Não é ficarmos por nossa conta a ler Henry James, por exemplo. A Medicina Narrativa é muscular!
Na verdade, até devia ter usado as expressões Saúde Narrativa ou Cuidados de Saúde Narrativos, porque esta não é uma prática exclusiva dos médicos, uma vez que pode ser exercida por enfermeiros ou por assistentes sociais. No entanto, mantenho a expressão Medicina Narrativa porque sou médica e porque o meu programa está a ser desenvolvido num Departamento de Medicina.
Em que ponto da sua vida sentiu a urgência de trazer as narrativas para a sua prática clínica? Houve um momento seminal que a fez seguir este caminho?
Eu estava sempre a ler, mas nunca estudei literatura de maneira formal. Depois do meu Internato, comecei a ler de forma séria e determinada e tinha um padrão: lia um romance de Henry James e logo a seguir um de William Faulkner e alternava entre estes dois autores. Deambulava também pelas livrarias à procura de textos de crítica literária, porque nunca tinha estudado literatura na Faculdade.
Ao mesmo tempo, comecei a minha prática clínica num consultório em Manhattan onde recebia pessoas pobres que viviam na vizinhança do Columbia Hospital e foi aí que percebi que o que me pagavam para fazer, enquanto Clínica Geral e Internista, era saber o que fazer com as histórias daqueles pacientes. Eu não os operava, mas ouvia o que os doentes diziam, o que os seus filhos diziam, o que os médicos das Urgências ou os psiquiatras diziam e tudo isso chegava até mim sob a forma de gráficos e de registos. A minha função era fazer com que todos esses enredos por vezes contraditórios e conflituantes fizessem, pelo menos, um sentido provisório para eu poder agir sobre eles. Eu tinha de agir e dizer que esta pessoa tinha diabetes, aquela insuficiência cardíaca ou uma crise psicótica. Foi nessa altura que me dirigi ao Departamento de Inglês porque entendi que o meu trabalho como médica era compreender o que fazer com estas histórias. Foi a prática clínica que me fez ver que eu precisava de mais treino literário.
Fundou em 2000 o Programa de Medicina Narrativa na Columbia University College of Physicians and Surgeons. Que tipo de questões queria tentar resolver ao criar este curso?
A primeira tarefa era melhorar a formação dos estudantes de medicina, ensinando-os a falar com os doentes, a ouvi-los, a desenvolver relações eficazes, a pensar nas situações éticas, a reflectir sobre a sua prática clínica. Eu via estes miúdos a passarem por experiências muito perturbadoras, que começavam no laboratório de anatomia com a dissecação de cadáveres até ao cuidado de pessoas muito doentes, que acabavam por morrer. Eles precisavam de estar equipados para olhar de forma penetrante para aquilo por que estavam a passar.
Todos os dias é preciso escrever na ficha clínica dos doentes dados como a temperatura, a pressão arterial ou os resultados das biópsias, mas se um médico entra no quarto de um idoso que está a morrer com um cancro da próstata e que lhe recorda o avô que morreu da mesma doença no ano passado e começa a chorar, isso já não se pode escrever na ficha clínica! Mas é preciso escrever isso nalgum lado! Foi assim que comecei o exercício da ficha clínica paralela para os estudantes que já trabalhavam no hospital. Isso era-lhes exigido na sua formação em Medicina Interna. Reuníamo-nos três dias por semana: dois dias eram dedicados à discussão das doenças e no terceiro dia os estudantes liam em voz alta o que tinham escrito nas suas fichas clínicas paralelas.
E o que aprendiam com essa experiência?
Aprendiam que não eram os únicos a sentir a dor, a perda, a raiva ou a empatia. Aprendiam que não eram os únicos a sentirem-se desfeitos pelo modo como a morte acontecia no hospital. Assim, a primeira coisa que aprendem é a solidariedade para com os colegas e depois aprendem que a escrita os ajuda. Quando escrevem e depois lêem isso aos outros, são capazes de reflectir sobre as situações e de viver com elas. Foi só quando escrevi sobre os episódios que vivi com os meus doentes que não só os percebi, mas também que os vivi. Foi na escrita que eu os vivi!
É uma terapia para os médicos. E para os doentes? Vêem resultados?
Há muitas histórias e muitos testemunhos singulares e individuais. Por exemplo, tinha um aluno que cuidava de um homem com uma doença pulmonar grave e que estava na lista para receber um transplante de pulmão, o único tratamento possível. Este homem tinha acabado de fazer 65 anos e o Pneumologista que o assistia disse-lhe que o iriam retirar da lista, por ser demasiado velho…
O meu estudante leu isto no registo do hospital e ficou chocado e perturbado. Ele conhecia bem aquele doente e a sua mulher. Primeiro escreveu sobre isso e depois entrou no quarto. Disse-lhe que sabia que ele tinha sido retirado da lista para transplante pulmonar e perguntou-lhe como se sentia. Imediatamente, o casal rebentou num choro e falaram sobre a sua fé e sobre a sua família. Pela primeira vez, eles tiveram a oportunidade de expressar não só a sua tristeza, mas também a sua esperança contínua no futuro. Para aquele doente e para a sua mulher, eu sustento que foi terapeuticamente útil o facto de lhes ter sido dada essa oportunidade. O meu estudante percebeu que tinha uma tarefa, que era entrar naquele quarto, e ficou orgulhoso por ter tido a coragem para o fazer.
Mas sabemos que precisamos de estudos clínicos em larga escala. Neste momento, o meu grupo e outros de Filadélfia e Toronto estamos a fazer estudos de resultados para saber se este treino em Medicina Narrativa muda a forma como os médicos e enfermeiros trabalham e sabemos que sim. Agora que temos confiança nesta formação, podemos ver como é que médicos bem treinados podem ajudar os seus doentes a obter melhores resultados de saúde. E é onde estamos neste momento. No entanto, isto requer muito tempo e muito dinheiro e eu não o poderia fazer apenas com os meus doentes. São precisas muitas pessoas, de vários locais, e isto teria de ser feito de forma muito rigorosa. Teríamos de ter, por exemplo, uma clínica de controlo e outra clínica experimental onde daríamos treino aos médicos, aos enfermeiros, aos assistentes sociais ou às secretárias, instituindo rotinas sobre diferentes formas de ouvir ou de escrever sobre o que aprendiam dos doentes ou até criar grupos de escrita para os pacientes. Mas iria demorar muito tempo até vermos diferenças, em termos de melhorias, entre os doentes.
Eventualmente, penso que a diabetes, a tensão arterial ou o peso seriam mais bem controlados, as mamografias ou as consultas de acompanhamento seriam feitas e os pacientes reconheceriam o seu médico. É muito difícil provar isto, mas garanto que se o fizermos bem, a prova estará no bem-estar do doente e pode não ser necessariamente biológico, podendo revelar-se no facto de o doente ser capaz de perceber que não vai melhorar ou que terá de ir para os cuidados paliativos. Mas isto ainda não sabemos. Sei que os médicos e os enfermeiros ficarão mais felizes, mas esse não é o meu objectivo principal. O meu objectivo é melhorar os cuidados que são prestados aos doentes.
Os médicos não sentem curiosidade em relação aos seus doentes? Por falta de tempo, falta de interesse ou de empatia ou é uma estratégia de defesa, porque sabem que vão sofrer se se envolverem?
Exactamente! É uma estratégia defensiva! Pensam: se eu for frio, objectivo e distante não terei de sofrer. Isso é verdade, mas o que eles não sabem é que não recebem nenhuma alegria e é por isso que sentem burnout e um vazio por dentro. Isto porque não têm a ligação necessária para saber que a sua presença tem significado na vida de um doente e que são uma presença estável e muscular. Não vê a alegria que há nisto? Mas é uma "alegria negra", como já escreveu o cirurgião e escritor Richard Selzer.
Os médicos/escritores são uma inspiração para si?
No início concentrámo-nos nisso e ensinávamos as histórias de William Carlos Williams ou de Anton Chekhov, mas saturei-me disso. Achei aborrecido, porque não tinha de ser assim tão instrumental. Agora estou a dar aos meus alunos um seminário sobre contos, mas o que quero é que eles aprendam alguma coisa sobre o acto da leitura, sobre "close reading" e, para isso, escolhi algumas histórias de que gosto particularmente e que penso que são suficientemente desafiantes. Não me interessa o conteúdo médico, nem a questão do médico que é escritor.
A experiência do Programa de Medicina Narrativa está a ser replicada noutras instituições? Como é que esta mensagem está a ser recebida na comunidade médica?
Na verdade, até tivemos de abrandar! Fazíamos workshops na Universidade de Columbia de três a cinco dias onde ensinávamos de forma muito introdutória o que é a leitura e a escuta atentas, o que acontece quando se escreve sobre uma experiência vivida e como é que essa descoberta funciona. Chegavam pessoas do Canadá, dos Estados Unidos, Europa, Ásia, África, Austrália ou Escandinávia e quando voltavam para casa começavam pequenos programas e seminários. No entanto, nós sabíamos que eles não estavam preparados e que não sabiam o suficiente. Estes métodos são poderosos e têm de ser feitos com habilidade. Sentimos que estávamos a ser imprudentes se dêssemos a impressão de que estes três dias eram suficientes para começar alguma coisa. Existem riscos envolvidos ao encorajarmos as pessoas a exporem-se. Foi por isso que em 2009 lançámos um programa de Mestrado em Medicina Narrativa na Universidade de Columbia, com dois anos de duração, onde já temos 50 estudantes. Com este Mestrado, pensamos poder equipar as pessoas com as competências necessárias para liderarem um programa deste género noutros locais.
Quem frequenta este Mestrado?
Temos médicos, enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, psicanalistas, poetas, jornalistas ou romancistas. Temos profissionais de saúde com muitos anos de experiência. Lembro-me de um obstetra/ginecologista, de um médico que trabalha nas Urgências, de um Internista que trabalha com doentes com HIV e outro Internista que trabalha numa prisão de alta segurança para mulheres em Bedford Hills, Nova Iorque. Esta é uma mistura que queremos manter unida.
_Artigo publicado no jornal NOTÍCIAS MÉDICAS n.º3089, de 29.9.2010
Por Maria Luiza Carrilho Sardenberg
Querida Luiza,
BÁRBARO!!! Muito bom acordar no domingo e encontrar-nos com um modo de fazer deste naipe.
É de uma beleza que revela o trabalho do médico como um espaço de encontro e ligação.
Algo perdido, pois esta era a ligação necessária e desejada e vivida no passado entre médico e paciente.
Perdido não, totalmente capturado e substituído por um modo dito "científico e objetivo" de tratar. E que, por isto, nem sempre produz o resultado que se busca.