Morte: Desalento e Humanidade
Todo mundo morre. Afirmativa aparentemente banal, se expressa como uma das raras verdades absolutas. Ninguém duvida que morrerá um dia. Aprendemos essa lição desde a mais tenra infância.
Entretanto, saber que morreremos não parece livrar-nos do temor sobre o que acontecerá quando morrermos, seja pelas inúmeras possibilidades que se apresentam (morrer com dor, violentamente, repentinamente, serenamente etc), como sobre o que virá, ou não, depois que morrermos. A morte é a senhora do desconhecimento.
Ainda assim, ela parece irmanar os homens pelo que provoca. Precisamos de rituais para oferecer sentidos a algo que parece não ter sentido, nas palavras de Goethe, uma impossibilidade que de repente acontece. O vazio deixado pela morte precisa ser de alguma forma preenchido, nem que parcialmente, pela fé de que o fim não é absoluto, pelas elegias que divinizam a vida comum do morto, pelo remoer da memória que afirma ao mundo que aquela vida valeu a pena ser vivida.
Quando agimos dessa forma, ao que parece, falamos ao mundo como se olhássemos um espelho na esperança de que farão mesmo quando partirmos. Talvez a dor maior não seja a morte do corpo mas a sensação de que a lembrança do que fomos um dia se perderá no limbo da memória dos que ficam, como no poema de Manuel Bandeira intitulado “A Morte Absoluta”, que no final depois de tantas mortes da identidade do morto se interroga sobre o nome que o tempo apagou de um túmulo.
A morte nos solidariza com todos. É nessa dor meio sem nome, mas que todos parecem ser capazes de sentir, que podemos trilhar mais facilmente os elos que ligam nossa humanidade a humanidade de outros homens. Nesse momento milhões de seres humanos sofrem intensamente inúmeras perdas. A maior parte delas parece não nos dizer respeito. Mas basta aproximar um pouco o olhar para nos percebermos ali, mesmo que estejamos a milhares de quilômetros.
No início do sec. XVII o poeta John Donne nos avisava que nenhum homem é uma ilha que se isola em si mesmo. Pelo contrário, ele é parte de um continente. Caso um pedaço dessa terra seja levado pelo mar, os homens que ficam sentem-se diminuídos. Por isso afirma que a morte de qualquer homem o diminui porque ele faz parte do gênero humano. Por isso, “Não perguntes por quem os sinos dobram, eles dobram por ti.”
Em meios a tantas mortes, essa semana me senti diminuído pelas tristes imagens do que acontece na Síria, pela morte do publicitário abordado pela polícia, a criança de dois anos espancada e morta no automóvel pelo próprio pai, mais alguns moradores de rua chacinados por gente que não os percebe como seres humanos e assim agem como monstros, enfim, em meio a tantas mortes deparei-me com uma imagem que encarnava o desalento.
Estamos acostumados a ver os atores de cinema como seres paradoxalmente próximos porém inatingíveis. Inconscientemente nosso psiquismo se desenvolveu buscando parte dos seus atributos de poder e beleza. Raramente os percebemos de fato como são, seres humanos por trás dos personagens que representam. Assim, ao ver o ator Sylvester Stallone debruçado por sobre o caixão do filho, não vi Rock muito menos Rambo. Vi um ser humano imerso em profunda dor simbolicamente beijando o esquife como se beijasse a fronte do filho.
Neste instante, minha alma diminuiu de tamanho…ficou microscópica e vulnerável. Era eu ali chorando a intensa dor da perda de um filho. Era eu ali a perguntar sobre o sentido que a vida tem e porque não havia sido levado no lugar dele. Era eu pensando que talvez um dia magicamente aquela ruptura pudesse ser recomposta e assim poder beijar e abraçar o que parecia irremediavelmente perdido.
Os homens estão absortos no movimento intenso da vida. Um torvelinho demarcado por rotinas e desejos de prazer marcam nossos passos a tal ponto que nos esquecemos da efemeridade da vida. A morte nos lembra que tudo é transitório e reveste de amplo sentido o tocar e o amar, o cheirar e o ouvir. Mesmo que diminuídos, ficamos mais alertas para crescermos diante dos verdadeiros tesouros que a vida pode proporcionar.
Por Emilia Alves de Sousa
“A morte é a única certeza que temos na vida”, diz um velho adágio popular. Mas, ninguém quer morrer, pelo menos a maioria não. E mesmo sabendo que iremos um dia, nunca nos preparamos pra ir. E à medida que vamos nos aproximando dela, o temor aumenta, e às vezes entramos em crise existencial. Há poucos dias, uma amiga colocou uma mensagem no facebook, dizendo que sentia que o tempo dela aqui estava chegando ao fim e que estava em pânico. Pediu ajuda. Como ajudar uma pessoa numa situação desta? Várias pessoas se manifestaram com mensagens de apoio, mas tudo sem muito sentido. Penso que não há muito o que dizer diante de um fato inevitável.
Valeu Erasmo!
Beijos!