Carta à Nise da Silveira
Engenho de Dentro, 26/07/2012
Querida Nise
Ao te escrever fico pensando na felicidade que estarias sentindo se pudesse aqui estar em corpo, porque sei que estás em espírito nos conduzindo e iluminando. Fui tocada pela sua experiência há 02 meses quando conheci o Museu do Inconsciente. Nele pude entrar em contato com as obras daqueles que você cuidoue com as cartas que escreveu à Spinoza a quem muito admiro e com quem tenho dialogado em minha prática cotidiana.
Queria dizer-te que ao aqui chegar me senti profundamente desafiada. Estava em férias. Minha criança interior queria voar pelo universo da alegria, pela leveza da dança, mas já no primeiro dia senti-me chamada a mergulhar em profundezas e sombras. O cuidado me chamava a realizar movimentos que caminhavam no imaginário desses que convencionamos chamar de loucos.
Mais uma vez guardei na sacola os conhecimentos da medicina convencional e deixei emergir do imaginário, a minha ancestralidade indígena para voar como águias, pombas e araras, fazer soar o maracá e despertar a energia do fogo, da água, da terra e do ar.
Imagino como gostarias de ver o que vi: uma mulher cearense, nordestina como nós, tentando emergir das cinzas como fênix, para alçar voo e libertar-se nas asas de uma pomba branca e depois cantar como criança; uma menina de corpo frágil se enroscando no colo de uma mulher dragão e em seguida viajar em cores e entoar cantigas de amor que se espalham polinizando o solo e germinando a planta que se enraíza na luta da capoeira, a luta pela libertação da drogadição e do desamor. Ah! Imagino como entrarias em êxtase ao ver aquele sorriso maroto que pede cheio de manha, se aninha e voa.
Sei que fizestes viagens profundas pelas imagens expressas em telas, quadros, mas nesse momento outras expressões irrompem como a musicalidade na voz do jovem que canta a plenos pulmões: eu quero viver; do menino lobo que traz a alegria do samba e da embaixadinha, lembrando de voc~e que ele nunca viu mas conhece tão bem.
Penso em que emoção sentirias ao ver entrar aquela mulher de olhar apático que aos poucos se ilumina ao som das canções e balbucia palavras soltas. O ritmo se acentua e acelera e ela abre o sorriso e deixa jorrar trechos da canção pelos lábios, pela boca, pelo rosto, pelo corpo inteiro, mesmo sem levantar-se da cadeira.
E o que dirias ao ver atores tãoonhecidos seus com suas mentes tríplices assumirem o comando desse espaço?
São tantas sutilezas, tantas energias afetuiosas catalisando minhas ações… Estou imersa em arte, cuidado e reflexão.Meu ser se expande e encolhe como meu coração que pulsa com tanta força que as lágrimas marejam meus olhos.
Me vejo peixe na profundeza dessas águas, me vejo onça caminhando nesta mata tão viva de nutrientes, me vejo chama do sol, fogueira incandescente cujas labaredas ajudam a curar feridas e produzem movimentos de força pra seguir em frente. Me vejo beija flor espalhando esse pólen pelo planeta para que essa experiência germine em outros lugares. Talvez seja essa a minha contribuição ao trabalho que você começou e essa moçada continua. Estou com vocês. Quero ajudar a escrever essa história. É para mim uma grande honra poder fazer esse diálogo contigo e tê-la como uma das pessoas que iluminam minha caminhada.
Sua admiradora
Vera Dantas
Por Cláudia Matthes
na mão, que encontro potente, recheado de emoção.
A vida pulsa sempre em toda a dimensão.
Peju