O Homem Elefante

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Por Parcilene Fernandes

"De fato, a minha aparência é algo medonha,
mas censurar-me é censurar a Deus.
Pudesse eu recriar-me novamente,
não te decepcionaria."
Poema de Isaac Watts com que Joseph Merrick terminava as suas cartas.

 

Joseph Merrick fotografado em 1889

Na literatura, na música, nos negócios e na ciência constantemente é apontado que a aparência física agrega valor ao indivíduo, seja na empatia natural que a beleza provoca, ou na facilidade em ser notado (em um mundo que prima pelo espetáculo). Há diversos estudos na área da Psicologia, mais especificamente em um ramo denominado Psicologia Evolutiva, que buscam explicar como algumas características humanas foram moldadas desde a evolução. Essas características tanto podem advir de elementos mais diretos, como a visão ou a audição, quanto de situações mais complexas, como estratégias para escolha de parceiros, percepção espacial etc.

Em meio a essas perguntas, deparo-me com a história real de Joseph Merrick, que viveu na Inglaterra vitoriana do século XIX. Nasceu em 1862 e, por volta dos dois anos, tumores imensos começaram a crescer em seu corpo, a ponto de deixar um de seus braços imóvel, de prejudicar sua respiração, impossibilitar que dormisse deitado ou que andasse normalmente.  Joseph causava horror em quem o via, algumas pessoas tinham ânsia de vômito ao se deparar com a sua figura, outras desmaiavam. Foi considerado um monstro, uma aberração, uma abominação da natureza.

 

Imagem do filme O Homem Elefante de David Lynch (John Hurt e Anne Bancroft)

Somente na década de 70 do século XX que a medicina entendeu (em parte) a doença que o deformou: a Síndrome de Proteus, “uma doença congênita que causa crescimento exagerado e patológico da pele com tumores subcutâneos, desenvolvimento atípico com macrodactilia e hemi-hipertrofia”.  Por ser uma doença que ocorre raramente (foram descritos cerca de 100 casos no mundo), há poucos investimentos para estudos na área.

No século XIX, participar de espetáculos em “circo de horror” sendo uma aberração usada para aguçar a curiosidade do público era tudo que restava a pessoas que sofriam, por exemplo, da síndrome de hipertricose (excesso de pelos), que fossem siameses ou tivessem qualquer outro mal que deformava sua aparência e tirava-lhe do ciclo estabelecido aos humanos. Nesse contexto, ser humano implicava parecer humano. E parecer humano não tinha relação com caráter ou consciência, mas com a aparência física determinada a partir de um padrão. Esse tipo de circo foi proibido no final do século XIX na Inglaterra, mas, de certa forma, ainda existe, só que agora novos artifícios são usados para mascarar o lucro que advém da exposição da dor e do medo.

Imagem do filme O Homem Elefante de David Lynch

Mais do que sua aparência, o caso de Joseph causou repercussão na sociedade da época porque vinha acompanhado de uma sombria revelação: a “aberração” era sensível e inteligente. Sua vida assombrada pelo preconceito, pelo medo e pelo horror não obscureceu sua humanidade. Entender que por detrás daquele aspecto assustador podia haver um ser consciente era o que mais provocava o desconforto das pessoas

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