ACOLHIMENTO E EDUCAÇÃO POPULAR: PRA ONDE APONTA ESSA TRILHA

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ACOLHIMENTO E EDUCAÇÃO POPULAR: PRA ONDE APONTA ESSA TRILHA?

 

                                      Vera Dantas

Pensar então o acolhimento

Sob a perspectiva popular

Nos remete a reflexionar

Sobre o envolvimento com a população

Os gestores e os trabalhadores

Precisam chegar à comunidade

Aprender outros saberes e verdades

Pra saúde poder se humanizar

São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar

Precisamos pensar novos cenários

Que promovam a vida e a inclusão

Dos sujeitos-atores cidadãos

Nos seus desejos e necessidades

Construir novos processos de trabalho

Que incorporem o saber popular

É necessário e também é ousadia

Que precisamos experimentar

 São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar

O saber que é da experiência

Nosso grande Paulo Freire já dizia:

É forjado no cotidiano

Pra enfrentar as questões do dia a dia

É também um saber coletivo

Onde muitos ensinam e aprendem

Onde a gente aprende a ser mais gente

Lutando pra realidade mudar

São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar

Por fim a educação popular

Propõe-se a lutar contra a opressão

Pra que as pessoas sujeitos cidadãos

Possam aprender a dirigir os seus destinos

E assim quem trabalha na saúde

Precisa ter um pouco mais de atenção

E cuidar com a cabeça e o coração

Não querendo ser dono da verdade

Pois se a gente ouvir a comunidade

No que ela tem a nos ensinar

Nosso trabalho em muito vai mudar

Vai ficar mais alegre e criativo

São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar Aprendemos também com Paulo Freire

Que pra educar é preciso humanizar

Situando a prática educativa,

nos anseios da luta popular

Para sermos humanos é preciso

Trabalhar com justiça e dignidade

Pensar em riscos e vulnerabilidades

Traçar caminhos rumo à emancipação São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar

Trabalhando em um território que é vivo

Precisamos saber dialogar

Interagir com o corpo, com a fala

E também com a cultura popular

Numa escuta sensível e afetiva

Aprendendo a aprender e ensinar

Novos vínculos vão se construindo

Tendo por base a solidariedade

São caminhos que precisamos trilhar

Para o SUS no Brasil se implementar



A participação popular no campo da saúde: problematizando a partir de algumas questões norteadoras

Refletir sobre a participação popular na formulação de políticas de saúde num país de dimensões continentais, nos remete a olhar para algumas estratégias que vêm se construindo no contexto do SUS, tais como: a ESF, os conselhos de saúde, ouvidorias, a política de humanização, os pactos de gestão, etc. Partindo da idéia de que participação é conquista (Demo), compreendemos essas estratégias como fruto das lutas históricas do povo brasileiro. Sabemos, no entanto, que essas conquistas são ainda frágeis e que muito há para caminhar. Assim algumas questões se apresentam sobre as quais poderíamos tecer algumas reflexões:

 No que se refere à atenção primária temos hoje a saúde da família como estratégia estruturante do trabalho no âmbito da atenção primária. Esta incorpora a participação popular como um princípio básico e considera o conceito de território vivo trazido por Milton Santos (2001), que significa pensar seu espaço de atuação considerando os jeitos de viver a vida das pessoas.  No entanto não podemos esquecer da nossa formação essencialmente técnica, hospitalocêntrica, medicalizadora, vertical e normatizadora.

Frente a esses desafios como pensar processos de trabalho com base em problemas que consideram o contexto e as noções de risco e vulnerabilidade das pessoas?

Como envolvê-las na elaboração do diagnóstico de saúde, planejamento e avaliação das ações?

Como estabelecer relações e ações comunicativas que promovam o contato com a cultura local e o imaginário popular, aspectos essenciais para o conhecimento da comunidade e a definição das formas de atuação?

Como desencadear processos que permitam a construção de vínculos e co-responsabilidade social?

São muitos os desafios que se apresentam se considerarmos a diversidade de culturas e contextos em nossa realidade onde a desigualdade social se configura na regionalidade, no acesso aos bens materiais e ao conhecimento.

Como incorporar novas ferramentas de trabalho que nos permitam conhecer a realidade complexa na qual construiremos nossa prática cotidiana?

Poderíamos começar falando em ferramentas, mas entendemos que o trabalho em comunidade requer do profissional um pouco mais que ferramentas, mas essencialmente um olhar ampliado sobre a realidade que o rodeia e na qual deverá se inserir cotidianamente, de forma a reconstituir a proposta de trabalho tendo como referência os desejos, necessidades, vulnerabilidades e potencialidades da população.

Diante disso, um ponto de partida pode ser a reconstituição da história coletiva da comunidade, suas lutas, as situações – limite que vivencia e as estratégias de resistência que historicamente vem construindo como possibilidades de transformação da vida do lugar com base nas potencialidades locais.

As situações-limites (Freire, 1999), são aqui entendidas como aquilo que dificulta a concretização dos sonhos, desejos e necessidades e que propõe uma ação compartilhada, onde atores sociais e institucionais constroem co – responsabilidade social, em um processo que inclui discussão, reflexão crítica e a possibilidade de ajudar a resolver.

Essa retomada crítica das lutas da comunidade, entendidas como as respostas aos desafios mais prementes da realidade, as festas populares, a arte e a cultura em suas celebrações, potencializa o compartilhamento de saberes e incorpora a visão da integralidade a partir do trabalho com a memória social, buscando construir imagens de transformação e uma análise coletiva sobre o processo, onde as potencialidades e subjetividades possam ter espaço e onde atores diversos podem tecer redes de solidariedade e trilhar caminhos de interdisciplinaridade, propiciando na prática a descentralização das ações de saúde e conferindo aos sujeitos coletivos populares, voz e espaço de reflexão-ação (práxis), continuadas.

Neste contexto, a observação participante, os testemunhos e narrativas de vida trazem as possibilidades de um saber coletivo carregado de historicidade, subjetividade e sentidos. As narrativas incorporam a oralidade e potencializam a atualização temporal e espacial desses atores – sujeitos em seus discursos e  pressupõem uma escuta sensível que, segundo Barbier (2002), está ligada a compreensão “do universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro, reconhecendo-o e respeitando-o sem, entretanto, aderir às suas opiniões, apoiando-se na empatia e na totalidade complexa da pessoa.

A construção dessas trilhas pelo universo de comunidades tão singulares em suas culturas implica uma aproximação com essas dimensões tão significativas para a compreensão dos processos do adoecer e viver daqueles com quem os profissionais trabalham sua ação cotidiana.

Nesse sentido as várias linguagens da arte, da comunicação popular, as práticas populares de cuidado, a caminhada dos grupos e movimentos organizados, permitem tocar dimensões mais totalizadoras do sujeito e, em geral esquecidas nos processos de conhecer como a do corpo, da estética, da ética, da espiritualidade, da afetividade – em um construto que vincula desejo e cognição, intuição e sensibilidade e nos remete a algumas questões chave para a construção das práticas de saúde: a humanização e o nosso papel como educadores.

O INÉDITO VIÁVEL: SABEDORIA POPULAR MISTURADA COM CONVERSA DE DOUTOR

Num caminho de  resistência / Precisam se organizar

Artista e sociedade / Pra situação mudar

Pra não sermos instrumento /Quando alguém nos convidar

Temos que unificar / Essa nossa experiência

O saber que é popular / Com o saber da ciência

Socializar um pouco/ Os meios de sobrevivência..

Quem busca a sobrevivência / Sempre busca uma medida

Pra resolver o problema / Pra encontrar a saída

Temos que ser pacientes /Cultura também évida

A partir desse momento /Mudou a mentalidade

Quem não entendeu ainda / Não tem mais dificuldade

De entender que a saúde /É a solidariedade.

(Jota Gomes)

 Fortaleza,  março de 2007