MÓD. IV – Gestão Participativa e Cogestão / GTH / CTH
Discutir gestão implica em falar sobre poder, organização do processo de trabalho, clínica e atenção. Significa, também, falar sobre sujeito autônomo, capaz de avaliar, criticar, cobrar seus direitos; por isso, nem sempre se estimula e possibilita a formação desse sujeito protagonista de sua própria vida.
O que, comumente, presenciamos é a gestão verticalizada, fragmentada, baseada nos saberes das profissões e categorias; não valorizando o saber popular, das diversas classes, de todos os sujeitos. Isso resulta em não participação e/ou responsabilização dos sujeitos envolvidos no seu processo de cuidar.
Esse, ainda, é o cenário atual apesar de muitas discussões, incentivo e investimentos na multidisciplinaridade. A limitação da autonomia e potencialidade dos trabalhadores; valorização do gerencialismo administrativo na saúde; concentração de poder e tomada de decisões; tarefas essencialmente protocolares, desconectadas de sentido; práticas fragmentadas; diferentes valorizações (remuneração e status de poder). Quando o que precisamos, na verdade, é ouvir todos os trabalhadores, os que estão na ponta da cadeia, aqueles que “pegam” o início do processo de trabalho. No entendimento da Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS (HumanizaSUS), a democratização da gestão em saúde não é exercida apenas no âmbito do sistema e serviços de saúde, mas também diz respeito ao cuidado em saúde (Brasil, 2010)
“A participação social não pode estar restrita às instâncias formalizadas. Ela deve ser valorizada e incentivada no dia-a-dia dos serviços do SUS.” (Brasil, 2010)
É preciso alterar os processos de definição de tarefas, responsabilidade e encargos assumidos pelos trabalhadores, e isso só se dá através de uma gestão mais participativa, compartilhada, democrática. Ela se traduz em um valioso instrumento para a construção de mudanças nos modos de gerir e nas práticas de saúde, contribuindo para tornar o atendimento mais eficaz/efetivo e motivador para as equipes de trabalho. De fato, percebemos em nosso serviço a necessidade de inclusão de todos os sujeitos nos processos de trabalho e do cuidar, não se esquecendo do usuário. Os indivíduos estão cada vez mais informados, politizados, questionadores dos seus direitos. No entanto, precisamos que lembrem também dos seus deveres. Vemos, muitas vezes, a degradação da assistência em nome dos direitos; quando a informação não é bem processada podemos ter situações catastróficas; acredito que estamos vendo isso na saúde; é preciso acreditar e defender o SUS que dá certo para todos nós.
Com esse intuito, a PNH sugere a instituição de colegiados onde os processos de trabalho podem ser discutidos de forma complexa e completa à medida que o colegiado é definido como espaço coletivo tanto dos gestores e dos trabalhadores quanto dos usuários. A gestão não deve ser vista como um lugar ou espaço, campo de ação exclusiva de especialistas: todos fazem gestão. (Brasil, 2010) A inclusão de novos sujeitos nos processos decisórios das organizações de saúde, para se concretizar como prática de gestão necessita da construção de condições políticas e institucionais efetivas.
Mas, sabemos como mudança gera desconforto, principalmente quando implica perda de poder, de autoridade… ainda estamos longe de conseguir trabalhar nesse modelo que inclui todos no processo de gestão e cuidado em saúde. É preciso envolvimento de todos; é preciso sair da zona de conforto e confrontar a realidade atual, a qual mostra um indivíduo que pode discutir o que é melhor para ele, por exemplo.
A PNH, para fins didáticos, distingue arranjos/dispositivos de cogestão em dois grupos distintos. Os arranjos dizem respeito à organização do espaço coletivo e permite o acordo entre desejos e interesses de usuários/trabalhadores/gestores. Os dispositivos são mecanismos que garantem a participação ativa de usuários e familiares no cotidiano das unidades de saúde.
A organização de espaços coletivos de gestão para a produção de acordos e pactos entre usuários, trabalhadores e gestores tem se tornado práticas imprescindíveis nos serviços de saúde. Destacamos os Grupos de Trabalho de Humanização (GTH) e a Câmara Técnica de Humanização (CTH).
Grupos de Trabalho de Humanização (GTH)
Os GTHs são coletivos organizados, participativos e democráticos que se destinam a empreender uma política institucional de resgate dos valores de universalidade, integralidade e aumento da equidade na assistência e democratização da gestão, em benefício dos usuários e dos profissionais de saúde. (Brasil, 2010)
É um dispositivo criado pela PNH para o Sistema Único de Saúde (SUS), com o objetivo de intervir na melhoria dos processos de trabalho e na qualidade da produção de saúde para todos. O GTH institui-se em qualquer instância do SUS e é integrado por pessoas interessadas em discutir os serviços prestados, a dinâmica das equipes de trabalho e as relações estabelecidas entre trabalhadores de saúde e usuários. (Brasil, 2012)
Entre suas atribuições, destacamos pesquisar e levantar os pontos críticos do funcionamento do serviço; promover o trabalho em equipe multi e interprofissional; melhorar a comunicação e a integração do serviço com a comunidade. (Brasil, 2010)
Câmara Técnica de Humanização (CTH)
Trata-se de um fórum proposto para agregar instâncias/serviços/sujeitos com o objetivo de compartilhar experiências do/no campo de políticas/ações de humanização, compondo redes e movimentos de cogestão. Constitui-se através de representações de institucionais formalizadas ou com sujeitos interessados nas discussões e encaminhamentos acerca de planos de trabalho e avaliação de experiências. Funciona pautado no mapeamento e ajustes contínuos à luz dos princípios e diretrizes da PNH. Seu caráter pedagógico e observado através das análises e destaque de indicadores do processo de implementação e seus alcances, podendo servir como referência para outros serviços. (Brasil, 2010)
“Uma nova arquitetura de gestão deve permitir o aumento do contato entre as pessoas, possibilitando o encontro das diferenças.” (Brasil, 2010)
Brasil (2010), ressalva alguns dispositivos que fomentam a participação ativa de usuários, familiares e redes sociais no cotidiano de serviços de saúde, tais como: Equipe de Referência; Projeto Terapêutico Singular; Direito a acompanhante em consultas, realização de exames e em internações; Visita aberta; Espaços de escuta qualificada de usuários e trabalhadores: ouvidoria, gerência de agenda aberta, etc.
Portanto, é necessário o engajamento e a inclusão de todos os diferentes sujeitos para que possamos instituir mudanças que favoreçam usuários e trabalhadores de saúde; GTH por si só não provoca mudança. Mesmo quando, devidamente, instituído nem sempre conta com o apoio de fato da gestão e nem mesmo daqueles que se propõem a fazer parte dele. Precisamos sair das nossas zonas de conforto e lembrar que os usuários, muito mais do que o profissional de saúde, está em constante desconforto.
Referências:
1. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. Gestão participativa e cogestão / Ministérios da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. – 1. ed. 1. reimp. – Brasília: Ministério da Saúde, 2010.
2. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Grupo de Trabalho de Humanização / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. 2. ed. 6. reimp. – Brasília: Editora do Ministério da saúde, 2012.