Sobre Trabalho e Formação Continuada em Saúde: A Disciplina Psicologia e SUS
Entre as diferentes disciplinas ofertadas na Residência Multiprofissional em Saúde do Adulto e do Idoso do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (HUPAA) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) temos a disciplina específica Psicologia e SUS, esta facilitada pelo Profº Dr. Sergio Aragaki (consultor da Política Nacional de Humanização e referência no Estado de Alagoas) a convite da Profª Drª. Cristina Camelo. A presente publicação é um relato das experiências vivenciadas durante a disciplina, destacando diálogos pertinentes para se pensar a formação e o trabalho em Saúde.
Pego emprestado para dialogar sobre a disciplina a palavra grega Paidéia, que está relacionada à formação educacional do homem grego na polís. A educação grega a partir da perspectiva Paidéia buscava uma formação para a vida, na qual conhecimentos culturais, espirituais e éticos eram repassados aos estudantes gregos. A lógica Paidéia estava relacionada a uma formação educacional ideal, com a finalidade de tentar desenvolver todas as potencialidades do homem. O objetivo era formar cidadãos; homens bons, virtuosos e éticos. A figura do professor era constantemente presente na vida educacional da criança, apoiando-a nas variadas disciplinas ofertadas naquele tempo.
A partir da noção de Paidéia, Campos (2001) elabora o termo Apoio Paidéia como uma metodologia de trabalho em Saúde. Segundo o autor, “o efeito Paidéia é um processo social e subjetivo em que pessoas ampliam a capacidade de compreender-se a si mesmas, aos outros e ao contexto, ampliando, em consequência, a possibilidade de agir sobre estas relações” (CAMPOS:2001, PAG. 2). A metodologia Paidéia seria então o reconhecimento deste jogo de relações no trabalho em saúde, buscando formas de intervenção nesta dinâmica. Os sujeitos não percebem o efeito Paidéia em suas vidas; aprendem vivendo, em ato. Campos (2001) continua citando que a função do apoiador – o sujeito que busca intervir no campo das relações – seria tentar expandir a capacidade das pessoas lidarem com o poder, com a circulação de afetos e com o saber. Este lidar no momento do trabalho, enquanto fazem coisas e no cumprimento das tarefas cotidianas.
Trazendo para este cenário a disciplina Psicologia e SUS, penso que os diálogos e os posicionamentos discutidos na disciplina eram parecidos com a lógica da educação grega e com o que é proposto por Campos (2001), uma vez que as discussões expandiam-se para além da contextualização das teorias psicológicas no hospital, ramificando-se a questões éticas e políticas, modos de ser e viver, modos de atuar nas clínicas. O trabalho vivo, no acontecimento. A figura do professor que possuía, por assim dizer, o suposto saber era desconstruída e compreendida a partir de um olhar de facilitador/formador/apoiador.
Os diálogos produzidos eram voltados a partir da experiência dos residentes em seus cenários de prática (Clínica Médica, Clínica Cirúrgica e Neurocirúrgica, Unidade Básica de Saúde e Ambulatório), levando em consideração questões referentes ao trabalho multiprofissional, relações de saber-poder no contexto hospitalar, institucionalização, afetos, entre outros. As conversas sobre afetos, angústias, inquietações vivenciados no cotidiano do trabalho eram colocadas na roda, onde se discutiam formas de lidar com situações as mais diversificadas e complexas possíveis. O embasamento teórico que norteava as discussões era a Política de Humanização; seus princípios, diretrizes e metodologias de trabalho.
A figura do professor/apoiador era fundamental para a reflexão do trabalho, no qual eram questionados os diferentes saberes no campo da saúde, as relações estabelecidas entre os profissionais no ambiente de trabalho, as dificuldades enfrentadas pelos residentes nos cenários e as possibilidades de mudanças.
Penso que a disciplina Psicologia e SUS a partir de um olhar da Humanização em Saúde era deveras importante para, no mínimo, desestruturar ideias, conceitos e modos de trabalho muitas vezes rígidos, mecanicistas. A partir da educação grega, acredito que o trabalho em saúde deve ser vivenciado para além da técnica e da objetividade, incluindo o pensar e o agir do trabalhador e, quem sabe, produzir ações no campo das artes, da cultura, entre outros. Por meio da proposta de Campos (2001) sobre o apoio Paidéia, considero que as instituições inseridas no campo da saúde poderiam ofertar encontros e dialogar mais sobre as relações de poder no trabalho, a circulação dos saberes e os afetos que estes produzem nos trabalhadores. Penso ainda que um apoiador seria fundamental para facilitar estes encontros, muitas vezes tensos, complexos e desafiadores; mas que podem se tornar leves, instigantes e produtores de mudanças.
REFERÊNCIAS
CAMPOS, G. W. S. PAIDÉIA E GESTÃO: Um ensaio sobre o Apoio Paidéia no trabalho em saúde. 2001/2003. Disponível em: https://www.gastaowagner.com.br/index.php/artigos/cat_view/6-artigos
Por Sérgio Aragaki
O SUS não está pronto. Está em contínua produção, da mesma maneira que tudo na vida. A vida se constrói, se analisa, se desfaz parcialmente para correções de rota para alcançar os desejados objetivos.
Os diferentes saberes quando respeitados, trazidos para o diálogo e para uma negociação que inclua todos e todas e não tudo, mas o possível que pode ser sustentado coletivamente, produz uma saúde melhor, uma vida melhor.
Foi muito emocionante compartilhar essas vivências com vcs.
Sigamos juntxs.
Abs,
Sérgio