(Matheus Falcão, de São Paulo) – No último dia 07, na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), aconteceu o debate “Universalismo x segmentação: para onde vai o sistema de saúde brasileiro?”.
Com as presenças de Sueli Dallari, professora titular da Faculdade de Saúde Pública da USP, e Ligia Bahia, professora do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o evento teve como objetivo discutir o futuro do sistema de saúde brasileiro, em um cenário de tensão entre a expansão da universalidade e as diversas possibilidades de segmentação, com a implementação de políticas públicas focalizadas ou a ampliação da saúde suplementar, por exemplo.
Abrindo a discussão, Sueli Dallari abordou o paradigma dos direitos sociais construído no último século, desde o Pacto pelos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas até o reconhecimento formal de direitos sociais nos sistemas jurídicos nacionais com a criação de garantias, bem como os novos movimentos no âmbito jurídico que tentam lidar com as questões decorrentes da constitucionalização desses direitos, como o neoconstitucionalismo. A professora destacou que a ideia de direitos sociais vem sendo questionada globalmente.
Em seguida, Sueli defendeu a importância do equilíbrio democrático na sociedade, compreendido como a efetivação de suas escolhas políticas. Segundo a professora, é necessário que se reforce os mecanismos de formulação democrática de políticas de saúde, que devem ser normatizadas pelo direito. Essas normas, muitas vezes elaboradas dentro da estrutura do Poder Executivo, simbolizam decisões políticas importantes, como a incorporação de tecnologias de saúde pelo Sistema Único de Saúde(SUS) e as restrições à liberdade individual em favor da vigilância em saúde.
Concluiu fazendo referência ao economista George Akerlof (Nobel de Economia em 2001) e seu artigo sobre o mercado de seguros (“Market for lemons“), chamando a atenção para indicativos da insustentabilidade desse setor, em razão do fenômeno conhecido como seleção adversa, no qual compradores e vendedores de determinado mercado não possuem as mesmas informações, o que resultaria em produtos de menor qualidade e mais caros. Reafirmou assim a importância de sistemas públicos com financiamento estatal.
Logo a seguir, Ligia Bahia iniciou sua exposição questionando se o sistema de saúde seria emancipador. Para a pesquisadora, a ideia de universalização não está, necessariamente, relacionada ao conceito de emancipação, uma vez que a universalização pode criar outras estratificações sociais, como acontece no sistema brasileiro com a associação do SUS à pobreza. Essa ideia está fortemente ligada à focalização de políticas públicas, isto é, a adoção de iniciativas públicas voltadas somente a um segmento da população, em detrimento de uma política universal, situação que ocorre em alguns países nos quais o sistema de saúde público é residual, atendendo apenas a população de menor renda.
Ligia lembrou ainda que a necessidade de políticas sociais acompanhou o processo de industrialização, uma vez que instituições de solidariedade tradicionais, como a família e a igreja, foram sendo deslocadas pela ideia de individualismo econômico e de mobilidade social. Além disso, o mercado, mais adiante, deixou de ser visto como a melhor forma de alocação de recursos e de eficiência econômica. Com isso, o Estado passa então a dispender recursos em políticas sociais. No Brasil, uma delas, seria a política de saúde universalizante.
Os gastos públicos em saúde, contudo, merecem questionamento quanto à sua adequação a uma política universal. Ligia apresentou diversos dados sobre a cobertura do sistema público e sobre os gastos médios, demonstrando diferentes aspectos que revelam a segmentação interna do sistema, como gastos diferentes para procedimentos semelhantes nas esferas federal, estadual e municipal. A professora destacou a necessidade de se abrir a “caixa preta” do gasto público em saúde.
Ligia concluiu apresentando o avanço do setor privado de saúde suplementar, formado por planos e seguros de saúde, demonstrando que, embora o sistema privado apresente crescimento, com incentivos governamentais razoáveis, é mais caro e cobre menos pessoas do que o público.
Organizado pelos professores Fernando Aith e Mário Scheffer, do departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, com apoio dos Centros Acadêmicos Oswaldo Cruz e do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), o evento encerrou a disciplina “Política e sistemas de saúde”, direcionada aos estudantes de pós-graduação da USP.
Os professores agradeceram aos presentes, especialmente às convidadas, destacando sua inestimável contribuição para o campo da saúde coletiva no Brasil.
Por Maria Luiza Carrilho Sardenberg
Oi Matheus, como vai?
Que tal colocar uma foto para que o teu post vá para o carrossel da rede?
abraSUS!!!