Importância do reconhecimento do abuso infantil por profissionais da saúde
Laura Helena Salsa1 e Victória Cracco Moro2
1 Graduanda em Enfermagem pela Universidade Federal do Paraná – UFPR
2 Graduanda em Medicina pela Faculdade Pequeno Príncipe – FPP
O abuso infantil é um fenômeno social e de saúde pública. O enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes envolve o reconhecimento precoce dos casos pelo corpo médico e encaminhamento apropriado. Entre os tipos de abuso encontram-se a violência sexual, psicológica, física, institucional (negligência) e patrimonial. De acordo com os dados coletados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) de 2023, o perfil epidemiológico geral das crianças e adolescentes que sofrem violência infantil no Brasil é caracterizado por um número maior de casos em pacientes mais jovens (0-4 anos) do sexo feminino. Nesse contexto, é importante salientar que os responsáveis legais (pai e mãe) são os principais agressores (independente do tipo de abuso). E, normalmente, o abuso ocorre na residência da criança/adolescente. Em ambos os sexos, predominam-se os casos de negligência, sendo sua incidência ligeiramente maior no sexo masculino. A violência física segue o mesmo padrão percentual entre os sexos. Já no sexo feminino em específico, o abuso sexual e psicológico foram de 2,5 a 3 vezes mais notificados do que em meninos. Em termos de notificações, é importante ressaltar que a subnotificação ainda é extremamente presente nesse cenário – principalmente no que diz respeito à negligência, violência psicológica e patrimonial. E, mesmo com a “baixa” quantidade de dados, o cenário é preocupante: de acordo com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, só nos 4 primeiros meses de 2023, o disque 100 registrou mais 17,5 mil violações sexuais contra crianças e adolescentes, sendo que em quase 14 mil o cenário é caracterizado pela casa da vítima, do suspeito ou de familiares. Com relação à violência física ou psíquica (93% das denúncias) os números de denúncias são ainda mais alarmantes: passam dos 30 mil. Considerando essa alta incidência de notificações, é importante que o profissional da saúde saiba reconhecer esses pacientes e realizar o encaminhamento adequado. Um exemplo de reconhecimento do abuso sexual infantil ocorreu durante prática na graduação de medicina: “Não foram necessários muitos dias de estágio na Unidade Básica de Saúde para que já tivéssemos contato com crianças que apresentavam sinais de violência. Uma criança de 10 anos e outra de 12 chegaram à unidade, uma com hematomas visíveis e ambas com comportamentos retraídos. A criança de 10 anos foi à unidade queixando-se de dor de garganta, enquanto a de 12 anos relatava dor ao urinar. Ambas pareciam receosas e eram constantemente interrompidas pelo acompanhante presente. Durante a consulta, foi necessário afastar o acompanhante e estabelecer um vínculo de confiança, com a esperança de que elas se sentissem à vontade para compartilhar suas vivências familiares. Infelizmente, após várias tentativas de diálogo, apenas uma das crianças relatou as situações de violência a que estava sendo submetida. Ainda assim, realizamos duas notificações de violência infantil, pois a notificação não exige confirmação do caso. A criança que conseguiu contar foi encaminhada ao agente comunitário, que a direcionou para a assistência social”. Essa experiência ressalta a responsabilidade do profissional de saúde em identificar sinais de violência, mesmo os mais sutis, que poderiam passar despercebidos em atendimentos superficiais. O profissional deve agir como um agente de proteção e intervenção, sempre preparado para lidar com essas situações e pronto para acionar a rede de apoio e proteção, garantindo um ambiente seguro para essas crianças e adolescentes.
BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos. Disque 100 registra mais de 17,5 mil violações sexuais contra crianças e adolescentes nos quatro primeiros meses de 2023. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2023/maio/disque-100-registra-mais-de-17-5-mil-violacoes-sexuais-contra-criancas-e-adolescentes-nos-quatro-primeiros-meses-de-2023. Acesso em: 11 nov. 2024
CORREIA, J. VIOLÊNCIA INFANTIL: O PERFIL EPIDEMIOLÓGICO NO BRASIL A PARTIR DE DADOS DO SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO (SINAN). Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 25 set. 2023. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/61712/1/VIOL%C3%8ANCIA%20INFANTIL%20O%20PERFIL%20EPIDEMIOL%C3%93GICO%20NO%20BRASIL%20A%20PARTIR%20DE%20DADOS%20DO%20SISTEMA%20DE%20INFORMA%C3%87%C3%83O%20DE%20AGRAVOS%20DE%20NOTIFICA%C3%87%C3%83O%20%28SINAN%29.pdf. Acesso em: 10 nov. 2024.