STF discute intervenção da Justiça no sistema de saúde pública do Brasil

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Claudia Oliveira
 

Do UOL Notícias
Em Brasília
 

 

Garantir o atendimento ao paciente e coibir arbitrariedades. Este foi o ponto em comum dos discursos proferidos nesta segunda-feira (27), na primeira de uma série de seis audiências públicas que o STF (Supremo Tribunal Federal) realizará sobre o SUS (Sistema Único de Saúde). O objetivo é buscar informações que possam subsidiar as várias ações que tramitam no Tribunal envolvendo, entre outras questões, fornecimento de medicamentos, suplementos alimentares e próteses, criação de vagas em UTIs, realização de cirurgias e fila de transplantes.

"Essa é uma das questões mais sensíveis que hoje afeta as decisões não só do Supremo, mas de todo o judiciário brasileiro. Temos muitos casos que aqui chegam em que os Estados se rebelam contra decisões judiciais. Daí a necessidade desse subsídio", ressaltou o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, ao final da reunião de hoje, da qual participaram representantes do Ministério Público, do Ministério da Saúde, da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), entre outros especialistas.

Para o defensor público geral da União em exercício, Leonardo Lourea Mattar, o Judiciário se manifesta quando há um "déficit" na prestação do serviço pelo Estado. "Não se trata de substituir a administração pública pelo judiciário, mas de atuar em situações específicas, quando há falta de vontade ou planejamento. Nesses casos o Judiciário pode e deve intervir para corrigir defeitos na administração pública".

Mattar afirmou que "culpar o sistema de Justiça por falhas no sistema de saúde é culpar o cidadão que recorre ao Judiciário para resolver seu problema". Disse ainda não ser possível justificar para um cidadão que a ação dele não será deferida porque a doença dele não está prevista no sistema de saúde ou no orçamento. "Essa justificativa é muito cruel", afirmou, arrancando aplausos da platéia ao final de sua fala.

O público aplaudiu também (até ser advertida pelo presidente do Tribunal) o representante do Ministério da Saúde. O secretário de Atenção à Saúde, Alberto Beltrame, criticou o pagamento, pelo Estado, de tratamentos que ainda estão em fase experimental. Segundo ele, isso pode acarretar riscos para o próprio paciente, além de ser um desperdício de recursos.

O Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) aprova o posicionamento do Ministério da Saúde. Presente à audiência, o presidente da entidade, Osmar Terra, disse em entrevista que garantir o direito integral à saúde não significa justificar abusos. "Há um esquema montado para se receitar sempre o remédio mais caro, mesmo quando há um similar de menor preço. Mas a ação judicial nunca menciona o medicamento mais barato."

Terra, que também é secretário de saúde do Rio Grande do Sul, argumentou ainda que "é falsa a tese de que os advogados são bonzinhos e os gestores são malvados, não querem dar remédio". "Quem tem que pagar por experiência (de medicamento) é o laboratório, não o poder público. "Eu já fui obrigado a dar na Justiça, R$ 200 mil, R$ 300 mil para tratamento que não faz efeito nenhum".

Em sua fala, o procurador-geral da República, Antônio Fernando Souza, lembrou que a descentralização das decisões no sistema de saúde não pode servir como argumento para deixar de atender o cidadão. Para ele, quando não houver políticas públicas de atendimento à população, há uma "responsabilidade solidária" dos entes federativos (União, Estados e municípios) de garantir o fornecimento do serviço, sob o risco de "frustrar o direito de muitos cidadãos que vivem em regiões pobres do país".

O advogado-geral da União, José Antônio Dias Tóffoli, posicionou-se contra as decisões judiciais que bloqueiam verbas públicas para cumprir liminares. "Há um caso no interior de São Paulo em que o gestor entregou a chave da prefeitura dizendo que não tinha mais nem 1 centavo para investir em saúde depois da decisão judicial".

As próximas audiências sobre o sistema de saúde serão realizadas nos dias 28 e 29 de abril, 4, 6 e 7 de maio.