Uma lição de fé, amor e aceitação
No dia 29 de maio, se meu filho, André Luis, estivesse entre nós, teria completado 25 anos. È difícil escrever sem emoção sobre o assunto, mas já consigo pensar e analisar, sem chorar compulsivamente. Resolvi então, escrever e publicar minha história que começou na madrugada do dia 14 de julho de 2012, quando dei entrada na urgência do hospital São Marcos, em Teresina-PI, com o André sentindo fortes dores abdominais.
Naquele momento, não imaginava a luta que eu ia enfrentar durante oito meses. Uma lição de fé, amor e aceitação. Nesse período, também aprendi na prática o que significa acolhimento, humanização. Eu, que por ironia do destino, sou membro do Grupo de Trabalho de Humanização (GTH) de um hospital de referência de alta complexidade.
Depois de passar por vários exames, foi detectado um adenocacinoma sítio primário desconhecido com metástase nos linfonódulos na região retroperitonial. Daí começou uma luta que durou exatamente oito meses. André lutou contra o câncer com muita garra e resignação, sem reclamar. Uma opção difícil para um jovem de 24 anos, que tinha sonhos e com um futuro brilhante. André Luis cursava o último período de medicina na Universidade Federal do Piauí –UFPI e tinha noção que o caso era grave e com um prognóstico ruim.
Levamos para o Rio de Janeiro para ser acompanhado por um especialista do INCA e daí, o pai dele e eu lutamos até o fim a espera por um milagre. Nesse período entre uma internação e outra, ficamos muito próximo, amigos, companheiros. Os médicos tinham que praticamente me expulsar muitas vezes para descansar, já que eu optava por ficar ali, cuidando e acompanhando os procedimentos que os médicos e enfermeiras faziam no André. Fiquei conhecida no hospital, a minha determinação era admirada tanto pelos funcionários quanto pelas mães que estavam passando pela minha situação, ou até por situações menos graves, mas não conseguiram aceitar. Virei um exemplo pois sabiam que meu caso era grave. E sabiam também que eu não desistiria. Recebia diariamente manifestações de carinho de todos, do pessoal da limpeza até dos médicos. Descobri o que significa ser acolhida. Todas as vezes que deixava o hospital, agradecia a Deus por mais aquele dia, mais aquela oportunidade de ficar com meu filho e que, se no dia seguinte, ele me permitisse que o encontrasse novamente, eu seria feliz.
Depois de 30 dias, esse dia chegou, naquela manhã de terça-feira, 26 de março de 2013, dia da novena de Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, quando entrei na UTI, senti que o meu André não estava mais ali, somente os aparelhos ligados e os órgãos funcionando a força. André morreu a noite, às 10:35, na companhia do seu pai amado que ele admirava muito. Tinha saído dali às 7 da noite, cansada de suplicar a Deus por um milagre.
Hoje tenho certeza que o milagre aconteceu: ao saber da notícia, não senti desespero, senti uma profunda paz por Deus ter permitido que ele ficasse comigo todo o tempo possível. Depois da perda, voltei a frequentar o Centro Espírita, onde me dão orientação, conforto e a certeza de um reencontro.
Hoje, sinto-me abençoada e agraciada por Deus por ter sido a mãe do André, o enviado por Deus para eu poder crer com mais força que ele existe e que a vida é um grande ciclo de fé,amor e aceitação. E que mesmo num ambiente hospitalar, podemos nos sentir amados e respeitados.
Descobri com o meu próprio sofrimento a minha relação com o sagrado e a transformação de vida. Com a minha fé, tenho certeza que a vida não foi feita para ser dramatizada. Toda vez que acontece algo que frusta os meus sonhos, tento sonhar dobrado, encontrar novos caminhos e readaptar sonhos antigos. . Sinto que quando temos um foco, uma conexão com esse Deus maior, as coisas se encaixam. Tudo começa a dar certo novamente. Hoje aceito as coisas como elas realmente são, porque creio em Deus. Temos que ter coragem. Muito obrigada por me mostrar esse caminho, André, você me mostrou que o simples é essencial. Hoje entrego, aceito, confio e agradeço.
Despedi do meu filho com um abraço silencioso e completo…..um dia nos reencontraremos e seremos felizes para sempre…..
Lembro da letra da canção do Milton Nascimento que diz:
“Uma mulher que merece viver e amar
como outra qualquer do planeta.
Mas é preciso ter força.
É preciso ter raça. É preciso ter gana sempre.
Quem traz no corpo a marca Maria, , Maria mistura a dor e a alegria..
Por Emilia Alves de Sousa
Oi amiga e parceira de caminhadas susistas,
Pela segunda vez, leio o seu texto, e pela segunda vez sou tomada pela emoção!
Acompanhei a sua trajetória de luta pelo tratamento do André, e sempre encantou-me a sua garra, a sua determinação em busca da cura, ou pelo menos do prolongamento da vida dele, mesmo frente a um diagnóstico desfavorável. Infelizmente, era chegado o momento da finitude dele, e contra os desígnios da vida não há muito o que fazer.
A visão que eu tive de você, "serena" ao lado do corpo do André, ficou marcada pra sempre na minha memória. Quero que saiba, que não está sozinha. Terá sempre a nossa amizade, solidariedade e parceria. A vida segue o seu curso e vamos em frente!
Um beijão!
Emília