PRIVILÉGIOS E DEFICIÊNCIA, COMO ASSIM?
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Ato de natureza inconsistente, maldoso, preconceituoso, desagregador, inconsequente, repugnante, estampado em Outdoor, na cidade de Curitiba, na manhã de 30 de novembro de 2015, pedia pelo fim dos privilégios para deficientes, causador de imensa surpresa para o segmento social organizado de pessoas com deficiência. Sim, ficamos surpresos pelo fato de ainda existir quem acredite realmente que somos privilegiados, considerando o precário nível de conhecimento de muitos quanto à diversidade e complexidade que envolve a condição humana de estar (de) eficiente. Estar, no sentido de achar-se em certas condições, é diferente de ser, designado por antonomásia, nossa existência real e absoluta.
Por mais que grupos extremistas tentem se passar por representantes da maioria, na verdade, expressam ideais típicos de minorias que militam na marginalidade, porque reconhecem que agem na contramão do estado de direito de sociedades onde vigoram princípios jurídicos que punem preconceitos e discriminações. No caso dos autores do Outdoor em baila, a vida clandestina fulcrada na covardia, os mantém reféns da própria mediocridade que os destrói.
Bem distante dessa insensatez, a maioria da sociedade humana preserva características da nossa existência real e absoluta, rotineiramente observadas no comportamento das crianças ao interagirem com as diferenças, quando por espontaneidade se apresentam acolhedoras, disponíveis, fraternas, solidárias. Preconceito e discriminação são manifestações de marmanjos (as) mal resolvidos, frustrados, incompetentes, maliciosos, sobretudo, covardes porque vivem no limbo.
Com efeito, é preciso ser muito forte para viver com dignidade a experiência da deficiência, seja ela de qualquer natureza, característica, dimensão. Os fracos preferem a autodestruição, a morte. Conheci muitos ao longo dos últimos 21 anos! Não escolhemos, ao menos por esses planos existenciais, experimentar quaisquer tipos de deficiência, mesmo que nos transitórios sintomas anestésicos pós-cirúrgicos, quando não há quem não se “borre” de medo de não mais sentir ou comandar parte do corpo inerte.
É sabido da histórica deficiência das instituições e políticas públicas brasileiras para que pessoas com deficiência tenham garantidos direitos equivalentes aos das pessoas sem deficiência, no livre acesso às diversas esferas da vida em sociedade. Na educação, por exemplo, ainda temos muitas escolas das redes públicas e particulares instaladas em ambientes inadequados, sem recursos humanos, instrumentais e equipamentos acessíveis para alunos com deficiência, por isso, a formação, habilitação e capacitação escolar dessas pessoas ficam aquém dos demais, gerando a necessidade de tratamento diferenciado sim, como o recebido, evidentemente.
Muitas crianças surdas, cegas, com paralisia cerebral, entre outras, são integradas, mas não incluídas nas turmas regulares. Um faz de conta comum em muitas escolas da rede pública e particular de ensino, cujos prejuízos se mostram evidentes em avaliações posteriores ao término dos ciclos do ensino fundamental. Onde estão os supostos privilégios? Privilégios de quê?
No âmbito da inclusão no mercado de trabalho os reflexos da formação escolar deficitária, de responsabilidade da instituição de ensino e não da pessoa com deficiência, não nos fazem menos capazes que os demais, ao contrário, pesquisas constatam rendimento similar ou acima da média para (de) eficientes. Na realidade, a convivência com o descaso nos torna vacinados e resistentes aos venenos da intolerância.
Quanto ao acesso aos serviços de saúde e reabilitação, acreditamos em tempos melhores, com a implementação da Rede de Cuidados da Pessoa com Deficiência no Sistema Único de Saúde – SUS, para que os menos favorecidos social e economicamente falando, possam ser atendidos em Centros Especializados de Reabilitação, como pessoas com deficiência das Classes A e B. Tenho certeza de que os autores dessa inconsequente campanha publicitária nem de longe imaginam quantos jovens paraplégicos, vítimas da violência urbana, de acidentes de trânsito, acidentes de trabalho, entre outras causas, perderam a vida tão precocemente por falta de tratamento de saúde e reabilitação. Milhares de vidas ceifadas pela incompetência do Estado. Então, onde estão os privilégios?
Tomando certos cuidados de cunho informativo, não existem razões para a negação do direito à sexualidade e reprodução para pessoa com deficiência, até porque faz parte da natureza humana, além de garantidos pela Convenção da ONU sobre nossos direitos. Em contrapartida, uma jovem surda não tem acesso ao Pré-Natal, sequer é atendida por profissionais de saúde que dominem a Língua de Sinais Brasileira – Libras. Da mesma forma, excluídas do direito à reprodução, milhares de mulheres paraplégicas, tetraplégicas, amputadas, mastectomizadas, prevalecem à margem dos programas da Rede Cegonha.
Temos isenções para a compra de automóveis devido às péssimas condições das nossas vias públicas, da falta de planejamento para a mobilidade urbana nas cidades brasileiras, do escasso número de coletivos adaptados que realmente funcionem quando precisamos utilizá-los. Ainda que tivéssemos vias públicas com padrão do norte europeu, dos Estados Unidos, Canadá, Japão, teríamos garantidos esses direitos, devido aos itens de bagagem necessários a atender nossas necessidades específicas, de ordem funcional, sensorial ou fisiológica.
Há quem se incomode pelo fato de existirem vagas de estacionamento específicas para pessoas com eficiência, inclusive, ocupando-as com desculpa de estar em situação de pressa. Entendemos e até as perdoamos, porque também são capazes de jogar lixo nas vias públicas, furar filas, se malocar em filas exclusivas para idosos, gestantes e pessoas com deficiência. Afinal, não se pode esperar dessas pessoas comportamento similar ao da sociedade japonesa, porque seguem seus instintos mais primitivos, nada civilizados.
Como a existência humana é infinita, onde todos haveremos de experimentar as diversas manifestações da condição humana, porque Deus é justo, ensejo que os extremistas ao retornarem possam se encontrar com semelhantes que os acolham, independente da roupagem externa que apresentem. A Lei do Retorno é inevitável, não plante espinhos e pretenda colher flores.
Wiliam Machado
Cadeirante, RN, MsN, PhD
Por Carlos Rivorêdo
William é demais pessoas humanas,
perplexidade é o que me vem ao tomar conhecimento dessa manifestação de profundo distanciamento da ética, do mundo, do outro. O niilismo é uma praga que se expande no mundo, hoje.
Para os psicopatas autores de tal manifestação, nos resta a denúncia perplexa, inclusive tomando nas mãos a Lei.
Há que se produzir, politicamente, uma denúncia e uma exigência de providências às esferas competentes, para localizar e submeter às sanções da Lei tal manifestação pública de Niilismo, para garantir que esse crime seja devidamente evitado no caminho do encontro de outros tantos niilistas e fascistas como este (estes).
A cada dia que passa fico mais perplexo diante da direção e do sentido que essa nossa sociedade toma.
Beijo todos,
Carlão.