NATAL E SONHO
A maioria de nós parece guardar boas lembranças do natal: aquela ansiedade da criança à espera do presente sonhado ainda sobrevive escondida no coração dos adultos. Aquela percepção de que existia um menino Deus enchia a alma de fantasias na esperança de que seus poderes também fossem nossos, já pensou? Poder ficar invisível; materializar um brinquedo; mandar no pai e na mãe; e se o avô morresse, a gente podia trazer de volta!
Natal me lembra infância, dos primos, da algazarra, da noite em que podíamos dormir tarde, do dia em que boquiaberto descobri que o relógio do Papai Noel era suspeitamente parecido com o do meu pai. Descobrir que Papai Noel não existe plantava uma semente de dúvida que germinava dia após dia.
Natal também podia ser perda de uma parte da inocência e a busca angustiada por toda a vida daquele sentimento que afirmava o sonho e a realidade como uma coisa só. Quando buscamos sociedades mais justas e solidárias é como se caminhássemos na direção do paraíso perdido do Natal.
Hoje o natal anda meio escondido pela pilha de presentes, cartões de crédito e dívidas. Celebramos os deuses do consumo e parte dos sonhos desembarcou no televisor com alta definição de imagem ou no carro com os mais recentes recursos da tecnologia. Os miseráveis querem mesmo um franguinho assado porque peru continua sendo carne de “rico”.
Milhões de manjedouras espalham-se pelo mundo enquanto o menino deus é assassinado numa escola paquistanesa pelo atrevimento de estudar, morto nas periferias porque foi verbo que se fez carne num corpo negro ou jaz abandonado de amor e afeto num apartamento de classe média enquanto pais trabalham e ganham dinheiro meio sem saber porquê.
Mas não deixemos o amargor que a vida pode trazer nos roubar o sonho que o Natal pode deixar. Nosso desafio é transforma-lo em realidade palpável não só no dia 25 de dezembro mas a maior parte do ano. E nesse sentido, com ou sem fé, todos podem estar irmanados. Se na semana de Natal os espíritos parecem estar mais sensíveis às necessidades do corpo e da alma, o desafio do resto ano é compreender que existe algo mais que transformar as carências em presentes.
Desejamos que todo dia possa ser Natal. Enquanto isso não for possível, que o amor e a dádiva possam ser nossa bússola na busca do humano e que o Menino Jesus não precise mais nascer em estrebarias.
FELIZ NATAL!
Por miguel angelo maia
Belo, sempre belo e tocante Erasmo
Há um muito de ondas de ódio no ar, há um muito de desencanto e desalento em que nem todos os piscas piscas universais parecem estimular um pouco de confiança. Talvez seja porque estamos nos dando conta que a esperança, tão decantada em votos e hipocrisia, seja aquela última 'praga' deixada no fundo da caixa de Pandora e, sinal de crescimento, estejamos começando a nos dar conta que esperar só já não é suficiente.
Esperamos em nosso luxo confortável, no sofás de seda e nos plasmas cada vez maiores, como se pudéssemos, peixes, viver num aquário. É mais do que hora de aprendermos que não teremos presente se matarmos o futuro em nome de um passado por demais conservador que, ganancioso, espera que esperemos enquanto, pisoteando nossos maiores sonhos com alpargatas de aço, faz do mundo seus champagnes e caviás, consumidos muitas vezes com os desvios de rios de verbas públicas que deixam de ser públicas para servirem de ostentação medíocre daqueles que, insensíveis, acham que o mundo deve ser o melhor lugar do mundo somente para eles mesmos e os seus.
Enfim, não quero ser pessimista, quero ser lúcido. A esperança vai já se tornando há muito uma 'má consciência" e, talvez, possamos dizer, ela hoje é o ópio do povo. Não é mesmo a toa que estamos vemos a violência se espalhar. Afinal qual é o submetido que, no limite, após ver o vazio de sua potência se estender numa espécie de campo de concentração dos oprimidos disfarçado em pão e circo, não vá acabar se convencendo que não fazer nada é ser cúmplice de seu próprio assassinato, numa espécie de suicídio consentido em que o assassinado finge que sua morte é falta de sua própria capacidade de produzir vida, quando isto lhe é negado por todos os lados?
Mundo difícil, dias difíceis e tenho tudo para acreditar, os motivos mantenho comigo, que 2016 será um ano de contorções sociais violentas pelo mundo todo. Há um grito de vida espalhado pelo planeta e nascer, ou quem sabe renascer, é algo violento que se faz entre contorções, sangue e dor, até que venha o choro da vitória, quando o ar finalmente abre os pulmões da vida que se afirma.
Enfim, atenção e cuidado sempre, principalmente nos julgar os acontecimentos.
Diria, não divergindo, mas reafirmando sua intenção: que Jesus continue nascendo na manjedoura de nossas almas entorpecidas pelo luxo fácil e consumível, porque, como penso, o que nos vem de potência energética quando vivemos o Natal não é idílico, não é nostálgico, mas um impulso quase a-histórico de que toda vida ao vir á luz é pobre, frágil e desprovida de forças, mas que, amparada, pode se transformar em qualquer coisa para o bem ou para o mal.
O apocalipse não será jamais a ira de Deus, de qualquer Deus, seja lá o nome que lhe confiemos ou aprendamos a confiar, o apocalipse é coisa de homens, demasiadamente humanos que, diante da vida e de sua vida, desqualifica todas as outras e, ente Jesus e Barrabás, crucifica o amor e resolve ser, não composição, mas ladrão de potências. O mundo está cheio de falsos profetas…
Confiemos sim, mas não só na confiança da esperança, mas na do esforço de não esmorecermos frente ao cansaço de defender qualquer vida, ainda que precisemos utilizar a nossa, no limite, para que isto seja possível.
Não nos conformemos nunca, sejamos sempre combatentes e guerreiros das lutas inglórias, com prudência, atenção e cuidado extremo de não confundirmos aquilo que somos com o que todo mundo deve ser.
Renasçamos todos na manjedoura, portanto…
Nem mártir, nem avatar, apenas ínfima poeira de partícula cósmica, mas que, por ser, já é toda diferença e diferente.
Não confiemos em ninguém igual ou que promova a igualdade como extirpação de toda diferença. Para mim, germe do fundamentalismo assassino e do messianismo dos infernos.
Só acreditaria num Deus que sabe dançar…
Bjs na alma.