Clínica nos serviços de Saúde Mental
A clínica não é somente às práticas médicas, mas de todas as profissões que lidam no dia-a-dia com diagnóstico, tratamento, reabilitação e prevenção secundária. Para isso necessita um Planejamento em Saúde eficaz que promova mudanças nos serviços, ele precisa, necessariamente, de um diálogo com a clínica. Campos (2000) defende que os serviços de saúde têm uma dupla finalidade: produzir valores de uso (práticas produtoras de saúde, curadoras, cuidadoras e preventivas) e sujeitos trabalhadores mais autônomos e prazerosos. Pensamos o Planejamento em Saúde como dispositivo (Onocko, 1998).
Para o Planejamento em Saúde vir a ser uma ação que se preocupa com o mundo das finalidades e com a eficácia, é preciso que planejadores da Saúde Coletiva, não sejam surdos às questões relativas aos modelos clínicos. É importante desenvolver reflexões sobre a clínica nas suas múltiplas especialidades: assim, na Saúde Mental, ou no combate às drogas, ou na Saúde da criança, ou da família, ou da mulher, a clínica deveria ser sempre interrogada à luz da sua produção, da sua eficácia.
A constituição da clínica no espaço dos serviços públicos de saúde relacionado com sua produção social e histórica, nos serviços de saúde mental encontramos situação semelhante, ainda que neles possam ser reconhecidas outras influências, diretamente vinculadas à sua especificidade e à crítica do sistema manicomial que marcou fortemente essa área. Após a criação do SUS, ocorreu uma forte crítica ao modelo de tratamento asilar, com tudo o que ele acarreta de submissão, isolamento e discriminação negativa. O ímpeto da Luta Antimanicomial criou focos de cegueira, espaços recalcados, nossos próprios pactos denegatórios. Essa, luta se assemelha a toda luta. Deixando de ser exclusivamente técnico, exclusivamente clínico. Esta influência, em muitos casos mal interpretada como abolição da doença e da clínica, tem contribuído para um certo esvaziamento da discussão sobre a clínica nos serviços substitutivos de saúde mental. Nos vários serviços de saúde mental nos últimos anos, é visto que a doença foi negada, negligenciada, oculta por trás dos véus de um discurso que, às vezes, e lamentavelmente, transformou-se em ideológico. Nesta linha, é possível reconhecer no discurso de alguns membros da comunidade antimanicomial certa idealização da loucura, negação das dificuldades concretas e materiais do que significa viver como portador de sofrimento psíquico e minimização do verdadeiro sofrimento que se encarna nesses pacientes, por exemplo, no surto psicótico. Os ideólogos da psiquiatria continuam a sustentar teses bizarras, como a da origem puramente genética, o tratamento condutista que repete o asilo fora dele, a continuidade das camisas de força e, lamentavelmente, até do eletrochoque.
O que se quer ressaltar é a necessidade de se ampliar a clínica no serviço público de Saúde Mental. Particularmente sobre uma clínica das psicoses. Continuam sofrendo milhares de pacientes psicóticos. Apesar de todos os avanços, ainda, em muitos lugares do país, poucas vezes se oferece a esses usuários, como alternativa terapêutica, algo mais que remédios, uma internação de vez em quando, e, no melhor dos casos, uma luta para ele também se engajar. Contudo, quando isso acontece pela equipe sem qualquer manipulação do usuário, isso pode vim a ser um magnífico recurso terapêutico. Assim, no caso dos serviços substitutivos, o objetivo declarado de evitar as perdas de laços sociais e familiares é importante tratar também as famílias. Na maioria dos serviços que conhecemos existe algum espaço destinado ao trabalho com as famílias.
E essa não é uma tarefa fácil nos serviços públicos, muitos dos quais encontram-se burocratizados ou submetidos ao gerenciamento autoritário. A compreensão dos aspectos subjetivos envolvidos pode contribuir para repensar nosso papel como apoiadores das equipes.
A multidisciplinaridade, a autonomia da comunidade, da família e do paciente, a compreensão que o paciente tem sobre tal doença, o vínculo entre o profissional e o usuário e o devido acolhimento é fundamental para se elaborar um cuidado que seja ideal para o paciente, considerando os determinantes e condicionantes da saúde do mesmo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPOS, G. W. de S., 1997. Uma clínica do sujeito: por uma clínica reformulada e ampliada. Campinas, mimeo.
ONOCKO, R., 1998. O Planeja-mento no Divã ou análise crítica de uma ferramenta na gênese de uma mudança institucional. Dissertação de Mestrado, Cam-pinas: Departamento Medicina Preventiva e Social/FCM/UNICAMP
AbraSUS!
Bisa Camargo
Por Emilia Alves de Sousa
Muito importante as suas reflexões sobre a clínica. A produção de saúde se dá numa relação coletiva, com encontros e compartilhamento de saberes, e o trabalho de cada profissional é importante para a integralidade e resolutividade das necessidades do usuário, onde cada um se reconheça como protagonista do seu tratamento, fortalecendo vínculos de coresponsabilidade e de afeto.
Você conhece as iniciativas de trabalho do Hotel da Loucura, no Instituto Nize da Silveira no Engenho de Dentro/Rio de Janeiro? Se não, vale a pena dar uma visitada nas publicações compartilhadas aqui na rede. Iniciativas que trazem um novo modo de produzir saúde mental, valorizando o protagonismo do usuário, a partir da arte e da interatividade.
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AbraSUS!
Emília