“Unidade Básica” mostra o SUS que não se vê na TV

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Debates
deboraligieri 09/09/2016

 

No próximo dia 11 de setembro de 2016 estreia pelo Universal Channel o primeiro medical drama brasileiro, “Unidade Básica”. Diferenciando-se das inúmeras séries americanas deste gênero, que retratam histórias sobre a vida dos profissionais médicos numa emergência hospitalar, ou, de uma forma geral, em ambiente hospitalar, esta inova. E como!

 

Pra início de conversa, é nova a senda narrativa escolhida, partindo da realidade do campo da Saúde Coletiva. Estamos assim diante de uma escolha nada inocente e produto de outra ordem simbólica, bem diferente do plano por onde se movem as produções televisivas hoje.

 

“Unidade Básica” insere os serviços e equipamentos públicos de saúde no campo das séries médicas, território ficcional dominado pela presença de hospitais privados, trazendo às telas de tv a disputa entre a visão hospitalocêntrica, de tratamento à doença instalada, e e os cuidados primários à saúde, mais focada na prevenção e na promoção à saúde. Dentro da série, há um certo embate entre as medicinas de família e comunidade, e as subespecialidades, através das personagens representadas pelo ator Caco Ciocler (Dr. Paulo) e pela atriz Ana Petta (Dra. Laura). Mas, assim como no Brasil o setor privado de saúde é suplementar ao público, e a atenção hospitalar é complementar à atenção básica, ao longo da série veremos que não há polos, mas concepções (e pessoas) que se relacionam.

 

Se em “House”, “ER”, “Grey’s Anatomy”, entre outras séries sobre a rotina de equipamentos de saúde, o foco é mais voltado aos dilemas pessoais e profissionais dos médicos, em “Unidade Básica” temos um aprofundamento das discussões sobre os conflitos dos cidadãos. Fugindo do clichê biomédico, que aborda muitas vezes o sujeitos apenas pela sua doença, em “Unidade Básica” o atendimento é focado na saúde, e em trazer para a cena principal a vida das pessoas. O nome dos pacientes dá o título a cada um dos episódios e a relação entre os profissionais e os usuários do SUS é o que conduz a narrativa da série.

 

Abordar o trabalho em saúde como uma composição entre usuários e trabalhadores de saúde não é trivial. Encontrar-se no espaço da mesma rede social, composta por usuários e trabalhadores de um território comum, favorece a produção de cidadania e vínculos terapêuticos. A série mostra esta mistura de um modo belo e forte. A cena de abertura não é outra senão um mapa do território coberto pela UBS.

 

Assista a série e comente aqui conosco. Venha pra nossa praça pública, a RHS, conversar e compor com todos os diferentes olhares que esta bela produção há de construir. Juntos!
 

Texto escrito pela usuária do SUS Débora Aligieri e pela trabalhadora do SUS Maria Luiza Carrilho Sardenberg, e revisado por Mariana Oliveira, Patrícia Silva e Ricardo Teixeira

 

Link da “Unidade Básica” no portal do Universal Channel: https://universal.globo.com/programas/unidade-basica/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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8 Comentários

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Por Ana Rita Trajano

Querida Débora e tod@s da RHS, Parabéns e Agradecimentos pelo compartilhamento desse belo trabalho!! Iremos assistir a também divulgar bastante. #ContinuamosEmLuta #EmDefesaDoNossoSUS #EmDefesaDaNossaDemocracia

Beijos saudosos,

Ana Rita Trajano

Por Fátima Couto

Bom dia!

Parabéns pelo excelente trabalho.

Um forte e caloroso abraço!

    Por deboraligieri

    Olá, Fátima.

    Essa parece ser mesmo uma produção nacional pra gente se orgulhar! Problematizar a saúde pública em uma série televisiva sem cair em maniqueísmos não é tarefa fácil. “Unidade Básica” veio como uma forma de defesa do SUS através do debate qualificado (dentro e fora da tv, pois só o lançamento já repercutiu em inúmeras discussões sobre o SUS nas redes sociais e na mídia), assim como a gente busca fazer aqui na rhs.

    Me junto a você e dou os parabéns à equipe de “Unidade Básica” pelo excelente trabalho!

    Abraços,

    Débora

Por patrinutri

E já se foram 2 capítulos… Quero mais! Adorei ver o dia a dia da Unidade Básica retratada na TV.

Sei que não se trata de um reality show portanto há sim fantasia, romance. mas sobre tudo vi os atores representando a vida numa afinação de roteiro direção e atuação.

Confesso que ver o Dr Paulo, num primeiro momento, hostilizando a novata, me incomodou um pouco, mas depois me veio a memória dos profissionais de saúde em geral que recebem os novatos nas UBS com ares de “sempre foi assim e é assim que vai ser”… que passei a vê-lo como humano de muitas lutas solitárias ,sem ser ouvido ou compreendido em seus valores e saberes.

Depois me incomodou o Dr Paulo que fuma e bebe e vai ao boteco, mas depois vi um profissional integrado na comunidade no qual trabalha, que se entrega de corpo e alma ao que faz.

O tom de realidade com a personagem que esconde a medicação me troxe muitas memórias do dia a dia da saúde coletiva. E a interveferência de outras crenças e culturas na vidas das pessoas como a religião e fé que devem acima de tudo serem consideradas como presentes.

Foi lindo! Adorei, foi um entretenimento com desfechos bons da saúde, experiências exitosas de cuidado e relações de equipe.

A presença da Dra Laura retratando outros modos de ver a saúde foi um importante contraponto. Junto com a realidade da estagiária de medicina que tem medo de atuar na comunidade, que está distante de sua vida real, achei sensacional. Mostrar que há no espaço da formação muitas vezes uma “defornação” profissional é muito importante.

Que venham novas histórias, outros capítulos e muito debate!

Quanto aos comentários nas redes sociais cobrando um maior destaque da equipe de enfermagem na história… seria bom que a equipe fosse mais protagonistas e não só os médicos, mas como já disse no princípio… não é um reality show e temos que dar espaço para o lírico, arte e cultura na série também , senão será uma reprise do dia a dia e não é isso que queremos.

Bjs Pat

 

Por stella nicolau

Estava ansiosa pela estréia. Achei bem bacana o nome da Unidade Básica ser Cecília Donnângelo, uma precursora do campo da Saúde Coletiva no Brasil, que não era médica mas do campo das ciências sociais e faleceu precocemente em 1983. Concordo com as primeiras críticas que vi nas redes sociais acerca da abordagem mais médico-centrada e com poucos profissionais da equipe multi. Entendo que se trata de uma obra de ficcção e não de um documentário, e dessa forma é preciso fazer algumas sínteses, condensar várias personagens em uma, o que é comum em adaptações de romances para miniséries (o que não é o caso na Unidade Básica). Achei bacana apresentar o agente comunitário, mas no primeiro episódio, insinua-se que ele tivera um pequeno flerte com a cuidadora de uma usuária, o que pode dar margens a questões da ordem da mistura de papéis profissionais com os pessoais. Entretanto o ACS reside na comunidade em que trabalha e pode sim acontecer de se envolver emocionalmente com usuários da UBS, porém é importante problematizar essas questões no seriado. O jeitão pouco ortodoxo de Dr Paulo também pode gerar polêmica: por um lado aparece seu envolvimento afetivo com a comunidade, frequentando os espaços públicos, sem problemas em fumar e beber (não se comporta como aquele que deve dar exemplos, não encarna o profissionalde saúde modelo, mas uma pessoa intensa e envolvida no seu ofício), mas por outro aparece como um pouco invasivo nas condutas das colegas. Enfim, acho que o ganho inicial é a própria discussão sobre as diversas lógicas médicas de se abordar a doença e o sofrimento. Se a série conseguir problematizar essa questão acho que já está no lucro. 

Por patrinutri

Pra quem perdeu no domingo, aí estão os horários alternativos: Universal Chanel

14/9 às 18h05 – 1º 
14/9 às 18h35 – 2º 
16/9 às 18h – 1º
16/9 às 18h30 – 2º

Por Guilherme Bruno de Lima Junior
Impressões sobre o 3o e 4o episódios de #unidadebásica.
 
Não consegui assistir no domingo, então vi a reprise hoje às 19h na Universal. Gostei muito das histórias!
 
No terceiro episódio, várias temáticas relevantes à Atenção Primária foram trazidas. O eixo norteador foi a Síndrome de Münchhausen por procuração, que é um transtorno em que as pessoas simulam doenças ou sintomas em outras pessoas, mais comumente em alguns pais que simulam doença nos filhos, com alguma finalidade de ganho secundário (p.e.: atenção e compaixão que a mãe recebe por consequência da situação do filho). Não é propriamente comum na Atenção Primária, mas mostra como o trabalho multiprofissional é imprescindível para se fazer o diagnóstico e se abordar de forma adequada (foi ótimo terem introduzido o assistente social e o psicólogo no episódio).
Outras questões interessantes
– discussão da Dra. Laura com o Dr. Paulo sobre diagnósticos raros versus os comuns, como as “viroses”. A propósito: quando um médico diz que a pessoa está com uma virose, é pouco provável que ele o tenha feito porque não sabe o que está acontecendo, ao contrário de uma crença popular bastante disseminada (“se o médico disser que você está com uma virose é porque ele não sabe o que está acontecendo!”). Alguém já ouviu aquela expressão: “tem bico de pato, pé de pato, pena de pato e faz quá quá… É muito provável que seja um pato!”? Pois é, com a “virose” é a mesma coisa. Os sintomas são tão característicos que até quem é leigo consegue frequentemente fazer um diagnóstico deste tipo em algumas infecções mais comuns. Mas pra quem não vê um pato todo dia, poderiam até pensar que seja um bicho mutante raro de Patópolis…
– impacto dos exames para as pessoas: existe uma cultura de exames entre muitos médicos e também entre muitos pacientes de que “quanto mais, melhor”. O que quase ninguém esclarece é que exames podem dar resultados “falso-positivos” ou “falso-negativos” em várias situações e isso não é culpa do laboratório, mas uma limitação do próprio exame. Isso, quando não causam danos à pessoa. No episódio mostraram a solicitação de um exame invasivo e o impacto de adoecimento que causou na família pela preocupação e tristeza pela criança. Quem trabalha na Atenção Primária pode já ter ouvido falar do termo “prevenção quaternária”, que significa um conjunto de ações para evitar malefícios associados aos atos (médicos e também de outros profissionais da saúde) que sejam desnecessários ou excessivos. É preciso se avaliar individualmente a necessidade e os impactos de cada exame solicitado para cada pessoa, para que eles não causem mais mal do que bem às pessoas envolvidas. Neste caso, “menos é mais” (frequentemente)!
 
Já o quarto episódio for fenomenal por vários motivos:
– Mostrou que sim, emergências chegam nos Centros de Saúde/Unidades Básicas de Saúde! E a equipe precisa estar capacitada e preparada para atuar nesta circunstância, apesar de todas as adversidades (o desfibrilador estava na manutenção na cena). E isto não é nenhum problema, a rede de saúde é que deve estar preparada para responder rapidamente quando acionada nestes casos. 
– Tema Hiperutilizadores: existem pessoas que por diversos motivos utilizam os serviços de saúde com uma frequência muito maior que a média da população. Pejorativamente, são conhecidos como “poliqueixosos”, mas até a hiperutilização é um sintoma. A forma como Dr. Paulo atuou, orientando uma das pacientes que se encaixa neste exemplo, é uma técnica bastante utilizada pelos MFCs: pedir a pessoa para ir todos os dias em um determinado horário na unidade. Isto é uma forma de se permitir a escuta qualificada da pessoa. Isto também acontece porque a pessoa não se sente ouvida e que suas queixas não são valorizadas. Com o tempo, principalmente o trabalho em equipe para ajudar a pessoa a se conectar com outros vínculos sociais, a situação consegue ser solucionada. Mas é preciso se ter um olhar isento de julgamentos e preconceitos para se conseguir abordar objetivamente. Médico, principalmente, não é juiz. Nem policial!
– Alcoolismo: tema super relevante, muito comum e de complexo tratamento. A cirrose é uma consequência grave do hábito. Fiquei pensando em qual médico durante a sua formação não ficou eufórico em encontrar algum “caso” de cirrose, mas evitava ou até desdenhava da abordagem do alcoolismo. Quase todo mundo quer buscar o raro, mas o comum (que nem por isso deixa de ser complexo), quase ninguém quer. É, trabalhar na APS não é pra qualquer um…
– “Você vai fazer residência em ‘empurroterapia’? “ =)))
– A morte do paciente e a presença do seu médico atestando seu óbito mostra como é forte o vínculo de quem se propõe a acompanhar alguém longitudinalmente. 
– A cara de deslumbramento da Dra. Laura ao perceber a conexão entre os casos, o território e os envolvimentos familiares foi impagável! Felizmente já existe uma ferramenta chamada “genograma” que vem exatamente para mapear estas e outras informações. Mais do que doenças genéticas, como o nome à primeira vista pode denotar, ele ajuda na compreensão dos padrões de comportamentos familiares, relações entre as pessoas, dinâmica familiar etc. Não é à toa que frequentemente é terapêutico: às vezes basta se fazer o genograma junto com a pessoa ou as pessoas para que apareça uma solução para algum problema que precisamos abordar. Fiquei positivamente surpreso com a apresentação e a forma como foi feita pela série.
 
Como já disse antes, tô gostando da pegada, #universal!