INTERNATO EM SAÚDE MENTAL: Relato de Experiência no Centro de Atenção Psicossocial Rostan Silvestre
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
FACULDADE DE MEDICINA
INTERNATO EM SAÚDE MENTAL
ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
ANA CAROLINA VEGAS PENA
ARLINDO GABRIEL MAMEDE COSSOLOSSO
GUILHERME BERNARDO VIEIRA
MARIA LUIZA BONFIM DE PAULA
INTERNATO EM SAÚDE MENTAL: Relato de Experiência no Centro de Atenção Psicossocial Rostan Silvestre
Essa postagem se trata de um relato de experiência vivenciado pelos discentes pertencentes ao 5º ano do curso de medicina da Universidade Federal de Alagoas referente às vivências adquiridas no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Rostan Silvestre durante o estágio em Saúde Mental. O grupo é composto pelos acadêmicos: Ana Carolina Vegas Pena, Arlindo Gabriel Mamede Cossolosso, Guilherme Bernardo Vieira e Maria Luiza Bonfim de Paula.
INTRODUÇÃO
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) atuam como um serviço substitutivo ao modelo tradicional hospitalocêntrico protagonizado pelo hospital psiquiátrico, o qual é o modo mais arcaico de lidar com o sofrimento do paciente psiquiátrico. Ele atua principalmente ao ver o sujeito doente como capaz de ser reabilitado psicossocialmente em sociedade, para isso atuando nos âmbitos pessoal, social e familiar para a reinserção do sujeito em sociedade, o que se manifesta como uma visão concreta antagônica ao modelo anterior e situa o movimento alinhado ao movimento de luta anti-manicomial, o qual objetiva retirar o estigma hospitalar do tratamento da pessoa em sofrimento psiquiátrico. Para isso o CAPS opera sobre uma lógica central de territorialidade utilizando uma equipe de caráter multiprofissional para desenvolver atividades diversificadas, trespassando atividades em grupo e individuais , oficinas terapêuticas e de criação, atividades físicas, atividades lúdicas, arte-terapia, além da medicação, que antes era considerada a principal forma de tratamento. Neste serviço, a família é considerada como parte fundamental do tratamento, tendo atendimento específico (grupal ou individual) e livre acesso ao serviço, sempre que se fizer necessário.
Na esfera estrutural, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) se classificam conforme seu público alvo e objetivo, podendo se dividir em CAPS I, CAPS II e CAPS III, referentes ao contingente populacional que atendem e em CAPS infantis (CAPSi) e no CAPS Álcool e Drogas (CAPS AD). A categorização dos CAPS, assim, proporciona uma abordagem diversificada e adaptável, refletindo a complexidade das necessidades de saúde mental da comunidade atendida.
LOCAL
O CAPS Rostan Silvestre é classificado como CAPS tipo II, sendo situado na cidade de Maceió, estado de Alagoas na Rua Dr. Augusto Cardoso, s/n, no bairro da Jatiúca. Ele é responsável pela assistência aos I, II e VIII Distritos Sanitários do Município de Maceió. Por conseguinte, ele atua prestando assistência a enfermos com transtornos mentais pertencentes a todas as faixas etárias residentes em mais de 20 bairros em que mantém a atuação.
Essa unidade apresenta uma vasta gama de atividade oferecidas ao usuários, podendo se citar Consultas psiquiátricas, visitas domiciliares, grupos terapêuticos, oficinas de artesanato, atividade física, auriculoterapia, grupos de meditação e outras estratégias de acolhimento, as quais são efetivadas por profissionais das mais diversas áreas, como os profissionais da enfermagem, terapia ocupacional, assistência social, psicologia e psiquiatria, os quais em vários momentos desempenham papéis que fogem da sua área de formação, evidenciando o caráter interdisciplinar da unidade.
APRENDIZADOS
Ao participar do estágio tivemos a oportunidade de participar de diversas atividades presentes na unidade, de forma a perceber o papel de grande importância que elas representam na reinserção social do paciente e criação de sentimento de pertencimento do usuário, tanto em grupo como em sociedade em geral.
No CAPS Rostan foi possível participar de uma vasta gama de formas alternativas de terapia, todas elas ancoradas em uma abordagem terapêutica holística e interdisciplinar capazes de gerar vínculos duradouros com os assistidos na unidade, de forma a tornar o CAPS um verdadeiro segundo lar para vários, onde se visualiza um espaço de socialização e interação importante entre os pacientes e deles com os profissionais, o que acreditamos potencializar o fim terapêutico da unidade e tornar as pessoas incluídas em um microcosmo capaz de preparar eles para o retorno em sociedade.
O cuidado em liberdade, premissa essencial do modelo de atendimento do CAPS, permeou cada atividade, com os usuários que eram convidados a participar de forma voluntária, preservando sua autonomia para escolher seu engajamento nas diferentes oficinas oferecidas ao longo de sua permanência na instituição.
A utilização de atividades relacionadas à desenvolvimento de habilidades, como a oficina de artesanato em coco, ressaltam o papel de inserir o indivíduo produtivamente em sociedade, a partir do ensino de habilidades que podem gerar ganhos monetários como também podem ajudar no retorno do sentimento de autossuficiência, a partir do momento que a pessoa produz algo para ela, mesmo com as limitações impostas pelo transtorno.
Outras formas de terapia importantes que visualizamos no cotidiano do CAPS foi as relacionadas ao bem-estar do paciente, sendo uma delas a de automassagem e outra a de beleza pessoal, ambas atuam fortemente no sentimento de que a doença não limita quem é você, sendo importante a consciência corporal como forma de sentir que você ainda está ali e que deve se cuidar independente de o quão longe de si a pessoa esteja se sentindo nos últimos tempos.
As terapias em grupo, notadamente exemplificadas pelo Grupo de Ouvidores de Vozes e por atividades lúdicas coletivas, como as relacionadas ao cinema e ao carnaval, atuam estimulando a sociabilidade dos usuários. Isso proporciona um sentimento de pertencimento e união, ao saberem que outras pessoas compartilham dos mesmos problemas. Além disso, essas atividades contribuem para a criação de vínculos entre os usuários da unidade, gerando a sensação de união e a percepção de que a pessoa não está sozinha em sua jornada.
Outro ponto relevante, especialmente em relação aos ouvidores de vozes, é a oportunidade de ressignificar conceitos previamente cristalizados sobre o transtorno. No caso específico, a abordagem das vozes busca compreender o significado delas, em vez de simplesmente silenciá-las. Esse enfoque revelou-se benéfico para os pacientes, evidenciado pelo fato de que vários deles passaram a entender a presença das vozes sem vê-las como um elemento limitante em suas vidas. Ao participarem das atividades no CAPS, muitos passaram a abraçar a possibilidade de conviver com as vozes no cotidiano, uma alternativa que antes parecia pouco viável para eles.
Através dessas atividades, foi possível compreender a importância dos CAPS no cuidado dos pacientes, estabelecendo uma abordagem que visa realizar um atendimento psiquiátrico mais humano e voltado para a ajuda ao paciente. Incentivar a participação do paciente nas atividades desenvolvidas nesse serviço de saúde revelou-se, por vezes, tão ou mais importante do que o uso de medicações. Ao acompanhar de perto o paciente, conseguimos visualizar seu funcionamento e separá-lo de sua condição, passando a enxergá-lo como uma pessoa dotada de sonhos, personalidade e hábitos. Essa perspectiva é crucial para direcionarmos nossos esforços a um atendimento mais pessoal e humanizado quando nos deparamos com os pacientes no contexto do atendimento básico, tornando-nos mais compassivos e empáticos em relação às condições apresentadas por eles.
Por Ana Carolina Vegas
Realizar esse estágio no CAPS, no ano de 2024, foi muito enriquecedor para nossa formação médica. É essencial que se conheça como funciona esse serviço, para que sua indicação seja precisa e correta, quando necessário. Os funcionários e usuários nos receberam com muita atenção e carinho, de modo que pudemos ficar imersos na realidade do ambiente e conhecer as mais diversas histórias de vida, experiências e perspectivas sobre o serviço. Ao adentrar no serviço, me deparei com uma atmosfera acolhedora, permeada pelo compromisso da equipe em promover a saúde mental da comunidade. Pude aprender como os mais diversos casos, desde transtornos de ansiedade e depressão até transtorno bipolar e psicoses. A abordagem interdisciplinar adotada pela equipe, composta por psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais e outros profissionais, proporcionava uma visão completa dos usuários, considerando tanto os aspectos psicológicos quanto sociais. Participei também, de forma ativa de sessões terapêuticas em grupo, grupos de ouvidores de vozes, atividades artesanais, momentos de meditação, onde pude observar a empatia dos profissionais e dos próprios usuarios uns com os outros ao lidar com os relatos dos pacientes. Cada interação era marcada pela busca de compreensão profunda, visando não apenas a remissão dos sintomas, mas também o fortalecimento das habilidades de enfrentamento e resiliência emocional, para que possam lidar bem com sua condição e não necessariamente querer transforma-la completamente.
Essa experiência não só aprimorou meu entendimento clínico, mas também consolidou minha convicção na necessidade de uma abordagem integral à saúde, que englobe tanto a dimensão física quanto a mental. O contato direto com pacientes e profissionais dedicados me deixou motivada a continuar explorando a área da saúde mental ao longo da minha jornada acadêmica e profissional.