Ao retirar do outro algum atributo que o torne menos humano, estou a um passo do exercício do ódio. É este tipo de prática psicológica que pode ser feita ao chamar um negro de “macaco” ou uma pessoa homoafetiva de “veado”.
Todo exercício de destruição do que é rotulado como “diferente” implica em desconstruir-se parte da humanidade do outro, de preferência transformando-o em monstro ameaçador. Ao chegar a esse nível, estamos preparados para o linchamento literal ou mesmo à indiferença com relação a seres humanos sendo decapitados em presídios.
A psicanálise ensinou que parte das vezes, quando se destaca exageradamente o objeto de temor a ponto de querer destruí-lo, na verdade se quer destruir o que vive internamente no agressor. Entretanto, esse recurso surte efeito apenas momentâneo. É preciso mais e mais exercitar a violência como uma droga que aplaca o impulso que é condenado em si mesmo.
Um homem excessivamente preocupado em evidenciar sua masculinidade e virilidade parece na verdade querer esconder o seu contrário, exprime-se como uma pessoa insegura e que precisa mobilizar energias cada vez mais poderosas para negar profundamente o que se é. Uma homofobia exacerbada mostra alguém em desespero por conta de sua identidade sexual, uma pessoa que no limite será capaz de matar para algemar-se dentro do armário.
Quem assistiu ao filme “Beleza Americana” irá se lembrar do másculo fuzileiro naval reformado que vivia ansioso especulando sobre a possibilidade do filho ser homossexual e ficava indignado por morar perto de um casal gay. Quem viu o filme irá se lembrar do trágico desfecho da crescente espiral de ódio incontido do personagem, incompetente em lidar com o próprio impulso sexual
Todos os dias o filme vem sendo repetido. Muda-se lugares e circunstâncias mas o desfecho é sempre o mesmo. Uma sociedade que entroniza a violência como solução da violência flerta com a barbárie o tempo todo. Dai candidatos com discursos militaristas encontrarem tanta ressonância inclusive na utilização de uma retórica que nega aos homossexuais direitos básicos.
Serão estes políticos pessoas em desespero com medo de sair de seus armários? Se sim, estamos caminhando numa direção cada vez mais perigosa, uma meia volta ao passado quando lunáticos assumiram o poder e encerraram nos campos de concentração tudo aquilo que era interpretado como diferença ameaçadora, não só os judeus mas também os homossexuais. Existe hoje um cheiro pútrido de fascismo no ar.
Por Maria Luiza Carrilho Sardenberg
Olá Erasmo,
Vi na semana passada este belíssimo filme e fiz um post que conversa com o teu:
https://redehumanizasus.net/converter-a-dor-em-luta-pela-vida/
Aqui o filme 120 batimentos por minuto ( completo, mas com o áudio em francês ).
https://www.youtube.com/watch?v=rpPJg_wxz98