Luanda

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A língua beija o céu da boca: Luanda…

E quantas mais carícias são precisas

pra descalçar os pés e o idioma

nesta terra clandestina da memória?

(Luandarilho. Para o meu avô Álvaro, luandense de nascença) 

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Entre o fim de agosto e início de setembro de 2007, estive em Luanda com outros dois colegas de trabalho da ENSP/FIOCRUZ com o objetivo de coordenar uma atividade pedagógica em nível de mestrado, fruto de uma cooperação com o governo angolano a fim de qualificar alguns dos seus profissionais de saúde e, consequentemente, apoiar também a criação de uma Escola Nacional de Saúde Pública em Angola. Embora estivéssemos ali com fins estritamente profissionais, para mim, em particular, a viagem representava igualmente a oportunidade de conhecer, como indicam os singelos versos acima, a mesma terra em que havia nascido o meu avô paterno, num distante ano do início do próprio século passado…

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É curioso notar como certas fronteiras se cruzam, e que tipo de surpresas costumam nos reservar, às vezes, as esquinas do destino. Pois aquela viagem ainda guardaria algo de muito especial para mim. Um dia antes de embarcarmos de volta para o Brasil, por exemplo, eu e meus dois colegas fomos presenteados pelos alunos com uma típica peça de artesanato local. Cada um de nós recebeu a peça que, segundo eles, mais combinava com aspectos de nossas vidas. E como eu havia acabado de me casar, meu presente representava justamente uma angolana grávida, simbolizando a própria fertilidade pela qual, agora, vai tomando forma um novo corpo no ventre da minha esposa. Sim, faz poucas semanas que descobrimos! Poucas semanas que escutei, em sua primeira ultra-sonografia, um coraçãozinho já batendo a pleno vapor, como se a vida e sua misteriosa origem estivessem mesmo ligadas, desde sempre, a essas mágicas terras africanas, lugar de tantos batuques e tambores!
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A fotografia que segue abaixo é, portanto, a expressão de uma carinhosa – e agora inevitável – lembrança que trago de Luanda. A mulher que está ali é Conceição (nome sugestivo!), de cuja hospitalidade gozei algumas das mais delicadas horas nessa cidade. A foto foi tirada no exato ponto onde foi erguido o Museu Nacional da Escravatura, local de onde partiram muitos navios negreiros para o Brasil, esse outro pedaço da África cortado pelas águas do Atlântico…   
 
       
 
Conceição e sua alegria: uma espécie de sorriso dos próprios Orixás!