É possível uma boa morte: a Reportagem “A Vida por um Fio”
Reportagem: "A Vida Por um Fio". Assista aqui!
Hoje no Brasil a morte é uma experiência aterrorizante e angustiante para milhões de pessoas. Não porquê esses sentimentos sejam necessariamente inerentes a morte. Na verdade, temos medo de associar à morte aspectos que parecem fazer parte na "mormalidade" dos serviços de saúde.
Quando um paciente é decretado "terminal" é comum ouvir-se que "não há mais nada a ser feito". No entanto, esse é o momento em que tudo pode ser feito para que a pessoa seja revestida de dignidade, conforto e, em muitas circunstâncias, possa ainda vivenciar até o que se convenciona chamar de felicidade.
Mas perde-se essa oportunidade porque a maioria dos profissionais esão alheios a outras formas de se trabalhar. Dai os tratametnos fúteis, os gestos de obstinação trapêutica, as ações extremadas que "salvam" vidas para mais alguns dias de sofrimento e agonia.
Temos medo de morrer e esse medo se intensifica quando pensamos que a morte possa acontecer no ambiente frio, insípido e desafetivado de uma UTI, longe de quem amamos, longe de quem de fato é importante para nós, longe das possibilidades de se despedir.
Convencionou-se que a relação entre o homem e a morte deve ser pautada pela beligerância. As metáforas dos textos em saúde são reveladoras: "LUTA contra a morte"; "ENFRENTAMENTO da doença" "COMBATE da infeção". Essa linguagem parece ter algum sentido quando existem prognósticos que permitem a utilização de procedimentos que vislumbrem significativas possibilidades de cura. Mas e quando isso não for possível? Continuar a "batalha" signifca transformar os últimos dias de vida de uma pessoa em uma verdadeira câmara de tortura onde a conspiração do silêncio submerge o indivíduo na mentira e nas impossibilidades de ainda buscar viver o mais plenamente possível até o fnal.
Nesta última quinta-feira a TV Brasil exibiu no programa "Caminhos da Reportagem" o tema "A Vida Por um Fio". Podemos vislumbrar em 52 minutos as amplas possibilidades de se lidar com pessoas de forma digna e humana mesmo que não existam mais meios de curar. Assistimos a depoimentos pungentes de profissionais e pacientes, compartihamos belas experiência de vida que nos ensinam a viver melhor, principalmente porque um dia iremos vivenciar a morte.
Cuidado paliativo não é um "segurar na mão do paciente" embora esse gesto em muitos momentos seja amplo de significações importantes. Também não é uma técnica de "acompanhamento da agonia" embora o desconhecimento de muitos profissionais médicos faça com que pacientes só sejam encaminhados para cuidados paliativos no limite de suas distanásias. Muito menos é um campo simplificado de práticas, pelo contrário. Realoca saberes e recursos tradicionalmente utilizados nas práticas estritamente terapêutucas e desenvolve outras tantas ações na especificidade do trabalho e da pesquisa em cuidados paliativos.
Existem diferentes possibilidades de se viver o final da vida do que aquelas que nos acostumamos nos últimos 100 anos, onde a morte e seu manejo passou para o controle dos profissionais de saúde, com destaque para as ações dos médicos. É possível morrer com muito menos sofrimento. É possível morrer na companhia das pessos que amamos. É possível morrer em outros espaços que não seja apenas o hospital como as hospedarias ("hospices") e mesmo em casa.
Assista essa reportagem. Surpreenda-se. Baixe o vídeo e/ou compartilhe seu link com outras pessoas. Exiba-o em rodas de conversa. Se queremos que o trabalho em saúde humanize-se cada vez mais., então é necessário que o trabalho em saúde no lidar com a morte também humanize-se.
Os cuidados palitivos podem ser inspiradores de novos processos de trabalho em saúde como um todo na medida em que destaca os aspectos biográficos dos pacientes, inclui suas famílias nas redes de cuidado (mesmo depois que a morte do paciente ocorre) e valoriza o trabalho em equipe interdisciplinar minimizando os conflitos de ordem corporativa. O Cuidado paliativo inclui nos processos de trabalho em saúde o que nos acostumamos a exorcizar e a negar. Abrem-se as portas para um amálgama de técnica, arte e afeto. Inclui-se a vida,o sofrimento e a morte como partes inerentes da existência.
Ha quase dois mil anos a prédica do imperador romano Marco Aurélio em suas "Meditações" ecoa pela história: "Não desprezas a morte; dá-lhe boa acolhida, como a uma das coisas que a Natureza quer". Lidar com a morte radicaliza o respeito a vida, aprofunda nossa capacidade de acolher e incluir.
PARA HUMANIZAR A SAÚDE DEVEMOS TAMBÉM HUMANIZAR OS PROCESSOS DE TRABALHO NO EM TORNO DA MORTE!
Por Rejane Guedes
Querido Erasmo. Seu post chega para reavivar nossas conversas sobre a temática da morte e sobre nossas atitudes enquanto profissionais de saúde, familiares e enfermos.
Que morreremos um dia é fato. Mas insistimos em empurrar para a caixa escura do esquecimento aquelas reflexões que atiçam os sentimentos de perda, de saudade, de dor.
O vídeo foi elaborado com muita delicadeza e traz a questão com muita pertinência. Merece ser amplamente divulgado.
Agradeço pelo presentão. Divulgarei nos encontros com a equipe do Hospital onde trabalho. Abração. Rejane.