O Risco da “Ditadura” das Cesarianas

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Esta matéria saiu no jornal "O Dia" de 28 de janeiro deste ano. O interessante a destacar aqui é o comparativo entre a saúde pública e privada. A ênfase nas práticas de cesarianas se encontra no sistema privado. Quais seriam os motivos? Parece haver aqui uma relação perversa entre os interesses mercadológicos da prática obstétrica junto a um maior empoderamento da clientela que acaba mercantilizando os medos referentes ao parto. Sei de situações em que mulheres praticamente impõem a cesariana, algumas vezes por motivos absolutamente questionáveis como, p.ex, querer que a criança nasça de um signo e não de outro. Outro dado interessante é que se levássemos em conta apenas o SUS, a taxa de cesarianas decresceria significativamente. Não seria talvez pelo fato dos valores repassados não serem "estimulantes" economicamente? O  determinante econômico parece ser um fantasma a rondar as maternidades!

 

"O risco da ‘ditadura’ das cesarianas

Ministério diz que grande número de bebês prematuros no País é caso de saúde pública

Rio – O elevado número de cesarianas realizadas no Brasil tem causado um grave problema de saúde pública: muitos bebês prematuros em razão da antecipação do parto. A conclusão é do Ministério da Saúde, que estuda estratégias para a redução das intervenções cirúrgicas. Em 2005, 43% dos bebês brasileiros nasceram de partos cesarianos, o que colocou o País como líder neste tipo de parto. Segundo a Organização Mundial de Saúde, a taxa de cesarianas considerada normal é até 15%.

"A maior dificuldade é convencer as pessoas de que estamos com um sério problema de saúde pública. A cesariana com data marcada com base na ultra-sonografia erra a idade do bebê em mais ou menos duas semanas. E o nascimento precoce não é indicado. Já no parto normal, a criança nasce na hora em que tem que nascer. A cesariana só deve ser indicada quando ela for realmente necessária", afirma a médica Daphne Rattner, técnica do ministério na área da saúde da mulher.

De acordo com o governo federal, a cesariana desnecessária está associada, no caso das mulheres, a lesões acidentais, reações à anestesia, infecções e hemorragias. Além do maior desconforto e da recuperação mais lenta e dolorosa. "As cesáreas eletivas ainda interferem na amamentação e no estabelecimento do vínculo afetivo do bebê com a mãe", explica Daphne. "As faculdades de medicina pararam de ensinar partos normais. A visão da obstetrícia passada hoje é cirúrgica. Tem hospital de faculdade em que o aluno não vê, não participa de parto normal", afirma a médica.

O maior problema está na rede particular. Segundo o ministério, se forem considerados apenas os partos realizados no Sistema Único de Saúde (SUS), a taxa de cesarianas em 2005 cai para 28,6%. Segundo pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que avaliou o prontuário de 437 grávidas em duas unidades particulares no Rio, 91,8% das indicações de cesáreas foram inadequadas. O trabalho revelou ainda que apenas 8% das mulheres submetidas a cirurgias haviam entrado em trabalho de parto.

"Com a banalização da cesariana, as mulheres não estranham mais que os médicos indiquem tantas cirurgias e acabam abrindo mão de seu desejo inicial por um parto normal”, afirma a epidemiologista Silvana Nogueira da Gama, da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fiocruz, que participou do trabalho.

MEDO DE SENTIR MUITAS DORES EM PARTO NORMAL

Grávida de quatro meses, a estudante Suellen de Castro Vieira, 24 anos, ainda não decidiu entre parto normal ou cesariana. Ela admite ter medo de sentir dor em um parto normal. A estudante conta que seu médico já falou que a cesariana é melhor para o bebê.

"Acho que os médicos preferem cesariana porque é mais cômodo para eles. O médico não quer correr o risco de ter que sair de casa de madrugada porque a bolsa da paciente estourou. Tudo pode ser planejado", disse Suellen, acrescentando que seu médico foi taxativo. "Ele disse que seria cesariana. Mas ainda vou resolver".

A epidemiologista Silvana Nogueira da Gama, da Fiocruz, lembra que muitas pacientes erram ao pensar no que é um bom parto. “Existe uma crença de que a qualidade do atendimento obstétrico está ligada à tecnologia usada no parto operatório”, explicou a médica."

 

 

Pâmela Oliveira