O sofrimento dos trabalhadores da saúde: A perspectiva de um assessor sindical
Depois das denúncias, recorrentes, de infecções hospitalares causadas por fezes de pombos e da permanência de ratos nas dependências de um Hospital de Porto Alegre, o sinal de alerta está emitindo luz vermelha nos recônditos das consciências dos cidadãos gaúchos.
Atualmente (segundo o noticiário de jornal, rádio e TV) é a lotação das emergências do SUS e de UTIs neonatais que tiram o sono da população e das nossas gestantes. Além disso, temos as bactérias resistentes a antibióticos que tem levado os hospitais e a vigilância sanitária a buscarem medidas de contenção ao alastramento da infecção de pacientes internados em áreas fechadas.
São tantos os problemas e tão óbvias as conseqüências para os trabalhadores e usuários dos serviços de saúde públicos e privados, que nem temos dificuldade em perceber que estas denúncias, antes de oportunismo político, devem-se a preocupação das lideranças dos trabalhadores saúde em perceber a situação de sofrimento psíquico em que se encontram os trabalhadores que devem cuidar da saúde da população.
A sociedade precisa se perguntar:
Como vivem, quantos empregos precisa ter para sobreviver, que nível de salários e que jornada de trabalho o profissional da enfermagem é obrigado a suportar?
Qual apoio, eles que administram os tratamentos de ponta prescritos e permanecem 24 horas ao lado dos enfermos, sofrendo assédio moral constante e suportando a pressão de trabalhar em sistemas de saúde com problemas de gestão e de organização, tem da parte de seus conselhos profissionais?
Quantos pacientes atende simultaneamente, um Auxiliar ou Técnico em Enfermagem na emergência de nossos hospitais?
Como fica o atendimento a população com as condições de trabalho precárias que são impostas aos trabalhadores da saúde?
Devemos considerar que embora o sistema público de saúde coexista com o sistema privado complementar que atende a uma parte da classe média brasileira, a mão de obra é majoritariamente a mesma. Temos trabalhadores de todas as profissões da saúde que trabalham em mais de uma instituição de saúde, muitas vezes em uma pública e em outra particular.
Assim sendo, as condições de trabalho afetam os dois tipos de usuários, pois que, eles são atendidos pela mesma mão de obra. Dos médicos especialistas, aos porteiros e às equipes de enfermagem, somos uma só categoria – os trabalhadores da saúde.
Para que a Humanização das relações de trabalho seja efetivada é preciso pensar o SUS como um sistema de saúde nacional, gerenciado a partir dos municípios e de sua realidade local.
Para uma parcela importante da classe média brasileira o SUS é um abrigo generoso em termos de opção de mercado de trabalho.
Ou seja, nestes cerca de oito milhões de trabalhadores, segundo dados do MS, trabalham lado a lado profissionais com renda anual em torno de 200.000,00 reais e aqueles que não chegam a ganhar mais de 5 ou 6.000,00 reais por ano (terceirizados, agentes de saúde, auxiliares de enfermagem, etc…).
A variação ocorre dentro de um mesmo município, muitas vezes na mesma instituição, no caso das capitais, e entre municípios de porte diferente, conforme a capacidade de ser ou não centro de referência para a alta complexidade.
Como ilustração da variação de renda, cito o relato de uma ligação de um médico para o setor de RH de um grande hospital do SUS. Ele precisava receber seu comprovante de rendimentos para a declaração de imposto de renda. Queria que fosse enviado por e-mail porque não tinha tempo de ir até o hospital.
Quando a funcionária do RH lhe disse que era um documento importante e que tinha de ser entregue em mãos, o mesmo disse que tinha vários empregos e que naquele hospital ele não trabalhava, apenas fazia plantão de sobreaviso. Evidentemente, por questões legais não posso identificar o profissional nem a instituição. Mas pergunto: quem de nós não conhece um caso igual? Mais ainda, como no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde – CNES consta o nome e CPF de cada trabalhador contratado, o Ministério da Saúde com certeza tem esta informação de forma oficial.
Outra questão é que não importa a renda. Da forma em que os processos de trabalho em saúde estão organizados atualmente o fenômeno do adoecimento no trabalho é tão universal como o SUS: – Afeta de professores universitários com vários vínculos de trabalho no SUS, até o funcionário da limpeza da empresa terceirizada ou cooperativa que presta serviço no PSF, ou no grande hospital.
Para pensarmos a Política Nacional de Humanização devemos considerar os interesses mais imediatos dos trabalhadores da saúde e a relação destes, enquanto força de trabalho com o dos gestores enquanto empregadores de mão de obra.
Estas questões devem aparecer em muitas rodas de conversa e os papéis não devem ser, em minha opinião, mantidos fora do debate. Há uma dimensão em que gestão e atenção são indissociáveis, mas nunca serão a mesma coisa.
Há que se prover condições adequadas para a atenção em saúde poder ser adequadamente realizada. Se isto não pode ser feito ao custo de 75 bilhões de reais por ano (aproximadamente o valor atual) que o seja ao custo de 100 ou 120 bilhões por ano. Não importa. A questão é que devemos ter uma indústria do cuidado e da atenção do tamanho da nossa demanda e de acordo com os desafios da efetivação plena e histórica do SUS.
Por Marindia Borges dos Santos
Marco, ao ler e refletir sobre o seu texto, vários exemplos me foram lembrados. INFELIZMENTE a maioria de nós trabalhadores precisamos ter mais de um trabalho pra conseguirmos ter uma vida mais digna.
Nesta semana em uma roda de enfermeiros aqui da secretaria, falávamos do quanto nos sentimos desvalorizados, agora a novidade é nos tirar a insalubridade, então nos perguntamos: até onde vão a custa do salário dos trabalhadores agariar recursos para outras finalidades.
É difícil humanizar quando paira um sentimento de desmotivação e de desencantamento.
Quando fechou o Hospital,fiz a escala de enfermagem para o PA Municipal e falava com os técnicos se queriam fazer plantão e por diversas vezes me questionava, qual o tempo que tiravam para dormir? e então me respondiam que já estavam acostumados trabalhar 8 horas por dia na saúde pública e fazer plantão de 12 no hospital.
Então nesta reunião de enfermeiros que mencionei, sugeri que façamos um grupo de trabalho, para montar nosso Plano de Cargos e Salários, é o que nos dá esperança de um salário mais digno.
É, a valorização do trabalhador está longe na nossa realidade.
Marindia Borges dos Santos
UP HumanizAÇÕES