O que pode a RHS? O que pode um corpo? Nas cinzas de Santa Maria…
Este texto era para ser só um comentário ao post "o dia depois de amanhã", de Marcos Pires de Porto Alegre, mas depois de pronto, achei melhor postá-lo, como um agradecimento à RHS e a todos os companheiros que direta ou indiretamente apoiaram na tragédia de Santa Maria.
Acho que montamos, com a ajuda sem par da RHS, uma máquina expressiva criando um público que, ao invés de consumir passivamente o que a mídia espetaculariza para diliuir o afeto, soube fazer rede de solidariedade e, sem escamotear a dor, deixou-se contagiar pelo sentir, sentindo na própria pele, junto aos que sofriam a dor, que o que se passava dizia respeito a todos nós, pois estávamos todos sufocados e morrendo juntos na fumaça que não era uma fatalidade, mas resultado de uma série de coisas que deixamos todos um pouco para lá e que levava nosso futuro nos sonhos abortados de todos aqueles jovens e na ferida incurável de todos nós que, vivendo, passamos a ser sobreviventes daquele triste acontecimento, fruto de um encontro sem par de cotidianas e rotineiras negligências.
Através da RHS, podíamos acompanhar como atores e não como mero espectadores o vívido daquele tristeza toda, não para dela participar como em um espetáculo, mas para, dentro do possível, ajudar como podíamos no enfrentamento da situação.
Belos humanos estes que lá estiveram e ainda estão, labutando no dia a dia, ultrapassando o próprio cansaço e, por isto, merecendo não só nossos calorosos e sinceros aplausos, mas também nosso cuidado intensivo, pois, mesmo na solidariedade, todo corpo tem limites e precisa restabelecer-se.
Se há alguma essência humana, acho que não é possível coloca-la em palavras, mas estas pessoas que se doaram certamente a expressaram em suas ações e, no meio do caos, atuaram como demiurgos, pois criaram um mundo diferente do mundo midiático, um mundo em que, estando todos nós, na verdadeira acepção da palavra, em Santa Maria, podíamos através dele partcipar de alguma forma, tirando-nos de nossa tão incômoda impotência.
Choveu na RHS formas de poder ajudar, que se multiplicaram pela facebook em cada postagem que orientava neste sentido. Através da carne e do sangue de nossos companheiros que lá estavam, formamos uma só corpo de ação e, assim, sem estarmos fisicamente lá, pudemos todos fazer um pouco do que era preciso e, de pouco em pouco, vimos não só uma tragédia em desdobramento, mas uma frente humana em rede para dar conta da situação.
Que bela máquina expressiva é a RHS, pois tendo a cara do Brasil, permitiu que nosso país canalizasse através dela ofertas de ajuda, que choveram de vários espaços, de forma que Santa Maria ficou realmente diante não só de nossos olhos, mas de nossas possibilidades.
Acho que o fim do mundo anunciado para 21/12/2012 atrasou-se um pouco. Pois em Santa Maria o mundo acabou, mas não sem fazer emergir um outro mundo possível, aquele em que podemos ser atores de nossa própria vida e, menos anestesiados, nos darmos conta que estamos em meio e também somos responsáveis por viver em um mundo aonde vidas se perdem em fumaça.
Que a fumaça de Santa Maria nos acorde para outras tantas pelo país aonde vidas também se perdem e que possamos nos manter nessa rede que foi formada e que mostrou sua potência, pois conseguimos, inclusive, ultrapassar o espaço e o tempo e, num átimo, habitarmos todos Santa Maria, fazendo toda a diferença.
Miguel Maia
Por Luciane Régio
Miguel! que a vida seja outra, que o especialismo dê lugar-valor à vida de comunidade, que o trabalho ocupe outro lugar cheio de afetos – amor e cumplicidade – e, não mais de soluções mágicas, esse vivido dói…
Luciane