Economia solidária: amor e trabalho coletivo

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Economia solidária, amor e trabalho coletivo, cooperativo, associado, que produz vida, cidadania, liberdade… No Congresso Paulista (https://redehumanizasus.net/65664-o-publico-na-saude-publica-a-producao-do-bem-comum)  e no Fórum de Direitos Humanos e Saúde Mental (https://redehumanizasus.net/65653-mesa-militante-da-reforma-psiquiatrica-no-i-forum-de-direitos-humanos-e-saude-mentalsp), vivendo uma semana intensa de descobertas em São Paulo, encontrei com pessoas dessas oficinas (oficineiros/usuários dos serviços de saúde mental, guerreiros/trabalhadores de saúde), que há muito tempo me interessava em conhecer! A Sabrina Ferigato também contou de sua vivência, num post super emocionante desta semana! https://redehumanizasus.net/65726-centro-de-convivencia-casa-dos-sonhos-ensinando-e-aprendendo

Em encontros e conversas com o coletivo do Armazém das Oficinas de Campinas e da Ecosol de São Paulo, tocando nos produtos, saboreando alguns, a sonhação da reforma psiquiátrica e a magia, na inclusão de um lugar social para a loucura, produz encantamento, afetação, conquistas, se faz escutar muitos sem voz através da arte! Da experimentação em oficinas de vida…

É a partir do livro sobre Saúde Mental e Economia Solidária, que estou lendo, cujo nome é Armazém das Oficinas: um olhar para além da produção, com Rimoli e Cayres na organização e, também, desses encontros/conversas/afetação em São Paulo, que começo a contação dessas histórias de possíveis !! Uma capa belíssima feita na Oficina de Papel Artesanal.

 

A oficineira me mostrou as capas do livro e disse: “pode escolher, todas são lindas, tem muitas cores e foram feitas nas oficinas… tem esta azul, a vermelha…” Capa feita pela Oficina de Papel Artesanal e impressa pela Oficina da Gráfica. Fiquei agarrando um monte de florezinhas coloridas, perguntando do que eram feitas, já abraçada a um exemplar… E ela me respondeu que eram de fibra de bananeira, e me contou dos processos feitos em etapas, por vários oficioneiros, cada um com uma habilidade, um gosto… Digo que quero um cartão com o endereço da loja, já que o RS é longe, e as flores, mesmo firmes, os caules finos não resistiriam. Balançando o vasinho cheio delas e através das flores eu a via sorrir e se divertir com meu jeito de curtir, bem proposital (risos e gestos comunicam)… Vou perguntando e ela me mostra de tudo. Parei nos suportes de guardanapos, que eram flores da mesma fibra, lindos, de muitas cores. Imagino a mesa, a toalha e os amigos… Tudo muito bonito, acabamento perfeito! Encantada nos ladrilhos coloridos, bem acondicionados em metais, madeiras, viraram bandejas, lustres, espelhos, pratos de decoração… que ganharão "casas".

 

 

 

O NOT (Núcleo de Oficinas e Trabalho) existe há 22 anos, atualmente, com 15 oficinas e trezentos usuários/oficineiros (da rede de saúde mental): 

Do louco ao usuário do Sistema de Saúde Mental, do trancafiado e indigente ao oficineiro, ao sujeito, com seus afetos, subjetividade, cuidados de saúde, histórias, documentos,benefícios sociais, residente em casa, com familiares: um cidadão brasileiro, que pode se expressar no Jornal Candura e na Rádio Maluco Beleza e brincar no carnaval no Bloco "Unidos do Candinho", além de ir à praia, ao cinema, a piscina e comer muito bolo nos aniversários de seus colegas de oficina.

 

Sigo lendo o livro, lembrando dos encontros, quando paro… 

A maioria dessas oficinas redesenha a ocupação espacial, dando novos sentidos às instalações, que foram, outrora, enfermarias e necrotério, do hoje denominado Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira. (SSCF)

Ocupação em uma reconfiguração política, da política da vida, das potências do cuidado em liberdade, da produção coletiva e trabalho associado como meio de mais vida, a qual pode ser pensada nesse pertencimento, no lugar de "oficineiro" e não mais o "louco", de artista, inventor, pintor, fabricante, brincante, expositor, uma pessoa com consciência ecológica, um colega de oficina, um parceiro, o companheiro quando a crise do outro chega e é preciso revesar: mais que um projeto da saúde, um projeto de vida; (…) relações subjetivas que se articulam na produção de vida (p.18).

 

Armazém das Oficinas foi o nome escolhido para a marca dos produtos e serviços das oficinas e é também o nome do espaço de comercialização, situado em região nobre de Campinas, próximo a um grande polo gastronômico e cultural da cidade. O local abriga a loja, o aconchegante "Café do Armazém"e três oficinas: Gráfica, Vitral Plano e Culinária Eventos.

Sim, o Café é super frequentado, com uma diversidade de salgadinhos e outros, além do atendimento em Eventos! Servindo também quentinhas. É tanta criatividade, movimento e possibilidades que anima, principalmente, aos participantes, que recebem uma bolsa-oficina, de acordo com sua participação (horários) e empenho (avaliado no coletivo!). Ainda é pouco, mas a qualidade dos produtos e serviços prometem expansão…

 

 

(…) são pessoas que enfrentam os desafios com muita coragem, acreditam no projeto e principalmente na capacidade dos oficineiros, que são contagiados e demostram essas alegria e entusiasmo a cada nova peça produzida, a cada nova tarefa cumprida, na apresentação da oficina aos visitantes, estagiários e voluntários que observam e comentam essa característica. – Sobre os trabalhadores, coordenadores à frente do projeto.

Oficina de Culinária e Nutrição (restaurante e refeições "transportadas"), Oficina de Culinária e Eventos, Cantina e Café (com pão de queijo delicioso, bolos confeitados, salgados, bolachas…).

 

 

Não há grades, portas trancadas, sujeira, escuridão e nem tristeza: muito pelo contrário, sempre há conversas, risadas, brincadeiras e muita música.

 

Parcerias para a qualificação, com o Sebrae, com uma profissional da área de marketing e uma agência de comunicação, os produtos ganham mercado, qualidade e valor de uso, revertendo em renda… A economia solidária e o movimento antimanicomial nascem da mesma matriz – a luta contra a exclusão social e econômica. Uns são excluídos (e trancafiados) porque são loucos, outros porque são pobres. (…) A matriz comum de ambos é uma sociedade que fabrica pobres e loucos de modo casual e inconsciente. (Paul Singer – Coord. Nac. de Economia Solidária)

 

O NOT tem atividades de artesanato, alimentação, agricultura orgânica, jardinagem e prestação de serviços! Se a Oficina de Culinária e Eventos já é uma ideia maravilhosa, minha surpresa em conhecer a história da Oficina Agrícola! No final da década de 80, o hospital psiquiátrico Dr. Cândido Ferreira tinha o trabalho dos "pacientes" vinculado a troca por cigarros e um pouco de liberdade. Havia o Grupo da Horta, nessa época, sendo que o terreno de plantio foi cedido por uma vizinha da instituição, que cedeu esse local, a cerca de 2km do hospital… O trajeto era feito à pé, e na hora do almoço alguém ia de bicicleta emprestada buscar as refeições. A partir dessa oportunidade, os produtos cultivados orgânicos, forneciam matéria prima para as refeições e eram vendidos na comunidade, abrindo outras frentes de trabalho, como Serviços de Jardinagem. Atualmente, vinte e dois anos após o início das atividades, ela encontra-se subdividada em seis grupos, organizados em frentes de trabalho e com capacidade para acolher setenta pessoas. (…) São elas: Agricultura Orgânica, Jardinagem, Limpeza Ambiental.

 

Resuminho das Oficinas em Campinas: 

Oficina de Papel Artesanal, Oficina da Gráfica, Oficina de Culinária e Nutrição (Restaurante, Quentinhas, Cantina e Café), Oficina de Culinária e Eventos, Oficina de Agricultura Orgânica, Serviços de Jardinagem e Limpeza Ambiental, Oficina de Vitral Plano, Oficina de Mosaico, Oficina de Marcenaria, Oficina de Serralheria, Ateliê de Cerâmica e Artes, Oficina de Velas, Oficina de Construção Civil e Ladrilho Hidráulico, Oficina de Costura, Oficina de Pintura…

 

E ainda falta a segunda parte, do livro devorado quase todo ontem, durante o dia de férias, até esta madrugadinha. Abrindo brechas nessa desaceleração do tempo (férias), estou encantada! A continuidade do livro promete, pois tem como título: Os Atores e suas Vozes.

 

Para finalizar essa deliciosa descoberta, como se não bastasse serem super empreendedores, essas pessoas militantes da luta antimanicomial, organizaram a geração de trabalho e renda em nível local e regional!! Em Campinas, com o Fórum Gera Renda e, em São Paulo, com a Rede de Saúde Mental e Economia Solidária (Ecosol), apostando na inclusão social pelo trabalho! Abaixo, algumas palavras do Centro de Convivência e Cooperativa (CECCO Raul Seixas), que se anuncia na delicada arte de produzir encontros… E outros produtos encontrados nos dois eventos em Sampa 🙂

 

                                                       Girafinha de papel jornal e tecido 🙂

  

Marca de roupa "Deeanto"*. É uma marca inovadora no mercado de roupas masculinas e femininas voltada para os afro-descendentes e admiradores da cultura afro-brasileira. A ideia do nome Deeanto vem de "adiantar", um neologismo criado, de "adiantamento" (adiantamento pelo trabalho realizado, momento esperado pelos afro-descendentes na mão do patrão) Espia só: https://www.deeanto.blogspot.com

 

E, pensando em outros posts que escrevi, sobre o Nise da Silveira, em que a arte é por si só terapêutica (movimento psíquico), poética, cirandada, atuada… e que o seu valor é esse, da potência da vida, do dionísio, do riso, da esperança e do amor…