Sujeitos em Movimentos uma análise crítica da Reforma Psiquiátrica Brasileira

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Sujeitos em Movimentos: Uma Análise Crítica da Reforma Psiquiátrica Brasileira na Perspectiva dos Experientes

Ana Paula Müller de Andrade

RESUMO
Esta tese é o resultado de um trabalho de pesquisa que teve como objetivo desenvolver uma análise crítica do processo da reforma psiquiátrica brasileira, considerando as articulações entre os processos de desinstitucionalização e as configurações de gênero presentes no mesmo, a partir do ponto de vista das “usuárias” e “usuários” dos serviços de saúde mental, denominados aqui como experientes. Para tanto foi realizado mapeamento e análise da reforma psiquiátrica no Brasil e em Santa Catarina assim como uma pesquisa de campo de caráter etnográfico nas cidades de Joinville-Santa Catarina, Barbacena-Minas Gerais e visitas aos serviços de saúde mental das cidades de Torino, Trieste e Gorizia na Itália, tendo como foco os sujeitos e suas experiências nestes locais. A reforma psiquiátrica brasileira é um processo complexo, composto de inúmeros planos, atravessamentos e configurações que tem gerado transformações objetivas e subjetivas na vida das pessoas. Os sujeitos, inseridos e precariamente constituídos em suas experiências e em processos de (des)subjetivação criam estratégias micropolíticas que movimentam as complexas relações de poder marcadas pela dimensão de gênero, por hierarquias e por disputas arduamente protagonizadas por eles neste contexto. São tais experiências e sujeitos que permitem reconhecer lógicas, desejos e atualizações do manicômio presentes no contexto atual e também os avanços e impactos da reforma psiquiátrica na vida das cidades onde são realizados movimentos de abertura e resistência aos saberes, poderes e fazeres instituídos hegemonicamente. Tais movimentos fazem circular sujeitos e também interpretações sobre a loucura, o louco e a suposta doença mental, que se articulam entre os modelos religioso, dos nervos e, sobretudo, biomédico declinados em práticas e discursos de disciplina, controle e resistência. Através dos processos de desinstitucionalização, foco central da reforma psiquiátrica brasileira, foi possível perceber tanto os diferentes sentidos dados a ela quanto às múltiplas reformas realizadas de forma cotidiana, rizomática e incessantemente pelos sujeitos.

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No final desse dia, fomos até uma feira de artesanato que acontecia na cidade (eu acredito que a intensa programação deste dia tenha a ver com a preocupação de Augusto de me acolher na sua cidade)e enquanto caminhávamos pelos corredores me disse: “Tá te sentindo um peixe fora d’água? Tu não conhece ninguém, né?!Concordei, mesmo que minha sensação fosse de que aqueles movimentos estavam me conduzindo cada vez mais pra dentro “d’água” do trabalho de campo da pesquisa.

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Daniel,[…] me disse:ahh...a reforma psiquiátrica…pra mim a reforma psiquiátrica anda igual um caranguejo, vai assim…depois vai assim….(colocando seu corpo emmovimento para demonstrar as idas e vindas.)”.Talvez seja outra possibilidade de definir tal processo, se pensarmos nos movimentos e nas andanças erráticas do caranguejo (e também deste processo).

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Enquanto eu e Nilza íamos de ônibus para uma atividade para a qual ela tinha me convidado, passamos na frente do Hospital Regional de Joinville, onde fica a Ala Psiquiátrica e então ela me mostra o mesmo e me diz:“Eu luto nisso e tudo, mas eu não concordo com a ala psiquiátrica no regional. É tudo junto, quem está em surto junto comquem não está e eu não conseguia dormir direito porque fica uma gritaria. Eu não acho isso certo não, porque a pessoa de recuperação do mental tem que ser diferente.”

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(…) eu encontrei a minha terapeuta ocupacional na conferência estadual aí ela falou assim: “eu sempre desconfiei que você era bipolar mas eu não podia falar porque eu não era a médica, eu não era a psiquiatra então eu… eu… eu fiquei assim”. Então qual que é o valor de um CAPS, se as pessoas que tão convivendo com você não podem dar uma opinião. Inclusive agora ela tá estudando para o vestibular de medicina porque ela quer se tornar uma psiquiatra. (…) mas é… não adianta fazer as terapias,fazer as coisas e deixar tudo na mão do médico. Se ela desconfiava porque que ela não falou?”
(Fragmento do Diário de Campo)-
Mateus
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