Cantos, Contos e Encontros. Companheiro Siqueira? Presente!
Desenrolei de dentro do tempo a minha canção
não tenho inveja às cigarras: também vou morrer de cantar (Cecília Meireles)
Queridos amigos, nesse momento em que as palavras nos faltam, recorremos às imagens que chegam agora.
Elas são do “Mano”, o amigo Siqueira, chegando antes de todos ao Panatis para conversar com os usuários na sala de espera; do companheiro trabalhador animando nossas rodas e nos encantando com sua oratória que desfiava-se generosa entre poesia, música e política. Com ele, visitar Antero de Quental, Neruda, Chico Buarque, Che Guevara, Fidel, Jorge Amado e Euclides da Cunha era possível a qualquer hora e a um só tempo.
Para quem o procurava, indicava-se o lugar que houvesse mais gente. Além de todas as artes, nele pulsava uma potência de vida que atraía as pessoas ao seu entorno: na copa, no consultório, nos corredores, no espaço de reuniões, no estacionamento da unidade, na sala onde os agentes de saúde se encontravam. Sua arte de conversar contagiava. O amigo conversador, grande militante do SUS, amante dos pássaros e remador das águas do Rio Potengi, era também nosso companheiro nos contos da vida.
A quimioterapia não o impediu de se fazer presente. Nas visitas à sua casa, advertia: “avisem quando tiver Tenda que eu vou.” E vinha. A Tenda do Conto parecia desafiar o seu corpo a mostrar o quanto podia. Quando menos esperávamos, ele chegava arrumado portando sua viola no Panatis, em soledade I, na praça, na Universidade, nos eventos, onde quer que houvesse Tenda, advertindo que ia ficar pouco tempo porque não estava se sentindo muito bem. E conversava, cantava, contava uma história, cantava de novo e ia ficando… “A Tenda é fogo que acende a chama e abre o povo pra cidadania. O povo aqui fala de um jeito que nunca nenhum senador ou deputado conseguirá falar. Aqui é o Brasil em miniatura”, dizia. Ele era o Brasil em toda a sua grandeza. Amava gente com cheiro de gente. Amava as vozes da nossa gente.
Nele, o sertão ardia em toda a sua “grandeza cantável”.
Nosso menino passarinho cantou cantigas do mar para o sertão como quem brinca de inverter os caminhos do rio; cantador da amizade, das saudades que se anunciam no sol que castiga e na terra que arde de sede; da secura do riacho à água que corre dos olhos. “E o rio a correr, e a fonte a cantar (…) quem há de dizer a saudade no meio das águas rolando também…”
Quão privilegiados fomos por este convívio! Que bela arte essa de partir somando vidas, juntando gente! Quanto aprendizado com esse seu dom de ser capaz de ser feliz!
Entre a dor da partida e a saudade, a alegria de uma certeza. Seguiremos juntos, amigo. De portas e janelas abertas para quem quiser chegar, encurtaremos distâncias. Deixaremos sempre “rede na varanda e bule de café em cima do fogão…” Veremos o mar quebrando na praia e repetiremos sem cansaço: é bonito, é bonito…
Seus braços continuam a nos envolver. Persistiremos nas nossas andanças e não nos faltarão as canções; o seu pulsar estará ritmando o bater dos nossos pés e os nossos aplausos… e sua voz crescerá nas vozes da nossa gente…a alegria e a valentia de quem nunca precisou dormir pra sonhar permanecem nesse chão que você salpicou com estrelas…no nosso rio, no nosso mar, no nosso sertão e no nosso horizonte…até onde a vista puder alcançar.
Por Rejane Marta de Medeiros
Jack,
Que belas palavras para descrever nosso amigo. Uma pessoa sábia de coração puro mesmo. Sentiremos sua falta e quando ouvirmos a música "Tocando em frente"(Almir Sater) será impossível não lembrá-lo. 🙁
Rejane Medeiros.