Vídeo Mensagem do Ministro da Saúde sobre o dia 18 de Maio
Confira a mensagem do ministro da Saúde, Arthur Chioro sobre o Dia Nacional de Luta Antimanicomial
8 Comentários
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Por Sabrina Ferigato
Excelente a fala do ministro!
É muito gratificante ouvir um ministro tão apropriado das causas da Reforma psiquiatra e se posicionando favoravelmente às bandeiras da luta antimanicomial.
Raphael, vc traz provocações muito interessantes e críticas muito bem vindas. No entanto, concordo com apenas parte delas.
Estamos de acordo que é muito difícil pensar qualquer prática de cuidado numa realidade de subfinanciamento, um ponto frágil que persegue o SUS como um todo e não apenas os leitos psiquiátricos. Estamos de acordo que não é possível fazer Reforma Psquiatrica sem psiquiatras e estamos juntos contra a criminalização da loucura e em favor de uma rede de atenção forte.
Por outro lado, faria alguns contrapontos a alguns dos seus argumentos.
Acredito que essa idéia de considerar a psiquiatria um inimigo oculto já está superada. Não conheço nenhum CAPS que defenda sua existência, sem incluir o psiquiatra como membro da equipe interdisciplinar. Isso é inclusive garantido por portarias que compõe as equipes míninas. Foucault em História da Loucura mostra bem em sua genealogia que o que estava se travando era uma necessidade de desconstrução de certo modelo psiquiátrico hegemônico e não uma luta contra psiquiatras, tanto que grandes ícones e referências teóricas da Reforma Psiquiátrica e da luta antimanicomial são justamente médicos psiquiatras (Basaglia, Saraceno, Oury, Tosquelles, e muitos outros, incluindo psiquiatras brasileiros). No entanto, esse mesmo filósofo nos mostra que esse não é um campo de forças simples: saberes, poderes e produção de subjetividade atravessam esse campo o tempo todo, fazendo emergir determinados modos de pensar a loucura, a doença mental e as respostas sociais dadas e ela.
Discordo de vc que ninguém é a favor dos manicômios. Isso me parece uma afirmativa que desconsidera a história da psiquiatria e a atual existência de milhares de manicômios no Brasil e no mundo duramente defendidos, financiados e mantidos por diversos setores da sociedade. Sabemos ainda que práticas manicomiais são defendidas mesmo fora dos manicômios, como vc mesmo cita.
Em relação ao uso dos termos: Eu particularmente gosto do termo sofrimento psíquico. Justamente pelo motivo que vc o considera frágil. “Sofrimento psíquico é um termo amplo, aberto”… E não é assim a loucura? O sofrimento psíquico INCLUI a doença mental, não a excluii! A fala do ministro se refere à Políticas Públicas de SAÚDE MENTAL que deve considerar justamente a complexidade e a amplitude das ações de promoção, prevenção, tratamento e reabilização de pessoas em sofrimento psíquico, especialmente as pessoas com algum tipo de transtorno mental, mas obviamente, além delas.
Sobre a falta de comunicação entre ABP e Ministério da Saúde, não tenho muito a dizer, mas acho que vale sua mesma teoria sobre os vasos comunicantes… Existem muitos psiquiatras à frente das políticas públicas de estado, no entanto há claras disputas de sentido com espaços como a ABP, que só ganham quando em composição naquilo que é possível. É preciso um movimento, uma abertura?
Por fim, penso que discordamos tb no que tange ao “lugar na loucura”… Lugar de louco não é na rua” vc diz… e pra vc existe um lugar para a loucura?
Se não infantilizarmos os loucos e o incluirmos no lugar de sujeito de direitos, o lugar de cada um é definido singularmente dentro de um contexto de possibilidades. Sem nenhum romantismo, acredito que a loucura é humana, está em toda parte, em maior ou menor grau. Lugar de louco não é no manicômio, não é no Caps, "lugar de louco" é na cidade, no espaço que sua circulação e possibilidades de vida podem construir, incluindo os espaços de tratamento quando necessário.
Acho que estamos travando uma boa conversa, com possibilidades de aprendizado mútuo! Sua fala me conduziu a boas reflexões!
abraços
Sabrina
Por ruiharayama
Rafael,
a sua fala me remete a muitos outros profissionais com quem deparo e falo sobre humanização e Direitos Humanos. E falo de um local difícil, já que sou antropólogo que trabalha na interface com a saúde.
Do meu local, só tenho a contribuir com um ponto de divergência: O lugar do louco é na rua sim, assim como é no Caps e no hospital e aonde mais ele quiser ir, assim como todos nós. Não podemos pensar que exista um lugar especial para essa população, hoje em dia.
Se pensarmos em uma territorialidade exclusiva contemporânea, podemos pensar nos fenômenos da crackolândia, onde se instalam usuários abusivos do Crack. Aqui no Rio de Janeiro, logo na saída para a Ilha do Governador e Aeroporto do Galeão, essa população tem uma vida ativa e uma divisão social de tarefas que só mostra como o ato de ocupar os espaços é uma decisão política e consciente até mesmo quando achamos que todos estão fora de si. Mas ao contrário do que se pensa, a crockolândia é uma região onde diversas pessoas interagem, umas voltam somente para dormir, outras aparecem para visitar amigos e fazer uso recreativo do crack antes de seguir para uma jornada de trabalho e toda sorte de cenas que você possa imaginar.
Se fora da assistência do Estado e do controle institucional esses coletivos se organizam, porque ainda achamos que uma vigília total irá protege-los de qualquer mal? Qualquer tipo de espaço territorial especial terapêutico deve ser combatido, como as comunidades terapêuticas.
Espaços territoriais especiais é diferente de espaços para especialistas. E é aí que temos um contato, isso é diferente de defender a existência de locais onde especialistas se agregam, ora, o CAPS não é um local desses, assim como o INCOR, o INCA e os setores Psiquiátricos? Qual melhor espaço para a formação dos profissionais de saúde do que naqueles onde a população ensina a esses profissionais o que é viver com determinado acometimento ou passar a sua experiência de sofrimento e perturbações, a formação dos especialistas se dá nesse cotidiano. Mas o cotidiano dessa população não pode ser nesses espaços.
O processo de saúde-doença é também um processo de criação daquele que cuida e aquele que é cuidado. O que precisa ser sempre ponderado é que nessas instituições totais o modelo de restrição territorial é uma das medidas terapêuticas, o modelo do manicômio e prisão não são transferências, são a mesma realidade. Prendemos aqueles que não podemos mais deixar nos manicômios, e por vezes queremos prender os pacientes psíquicos em eternos tratamentos que impedem sua vida em comunidade.
A produção do discurso das políticas públicas baseadas em evidências científicas foi a mesma que serviu de base para a construção do racismo científico. Qualquer política pública deve inserir dados científicos, da população acolhida e dos profissionais envolvidos, não há elemento melhor que o outro, mas a conjugação de diversos fatores. O olhar que coleta as evidências sempre tem uma lente cultural.
Por Marcelo Dias
Bem-vindo à rede!
Ter se "arriscado" postando aqui mostra sua vontade de compartilhar, de escutar o outro e viver a possibilidade de mudanças. Mas também de ser ouvido.
Fiquei pensando sobre o lugar do psiquiatra e da psiquiatria nestes anos de Reforma e sobre a necessidade de "definições" que você coloca por exemplo quando fala sobre os sujeitos com "sofrimento psíquico". Você realmente acha melhor "defini-los pela doença"?
Mas qual seria o papel do psiquiatra dentro da Reforma Psiquiátrica? Há um papel definido? O psiquiatra deve ser definido também pela doença do outro e consequentemente ter exclusividade sobre o "tratamento"? Não por acaso, estamos constatando o aumento do número de psiquiatras formados na lógica biologizante, claramente a serviço do capital.
Mas é verdade, a indefinição e a falta angustiam mesmo. Por isso buscamos às vezes as definições, sejam de palavras ou lugares, e assim tentamos definir não só nosso lugar profissional, mas o lugar do louco!
Sobre os psiquiatras serem inimigos ocultos, bom, acho que alguns podem ser considerados mesmo, mas não por serem psiquiatras, mas por sustentarem uma postura de anulação do sujeito. O psiquiatra que não pensa em clínica ampliada trabalha sim numa lógica manicomial, mesmo que trabalhe num CAPS.
Por fim, não posso deixar de falar nas relações hierarquizadas e disputas de poder. Não é nada fácil mudarmos a maneira como nos relacionamos com o outro, seja trabalhador ou usuário. O fato de estarmos aqui dialogando numa rede já implica uma certa horizontalidade. Complicado seria se, na tentativa de mantermos nossa liderança, estivéssemos transformando nossa antiga liderança manicomial em liderança pela resistência às mudanças,,,,
Por fabiobhalves
Caro Rafael, seja bem vindo.
Este espaço sustentará o debate nas diferenças.
Saudações de Fábio BH e até a VITÓRIA!!! ( Coordenador da PNH )
Caro Raphael,
Seja muito bem-vindo à nossa rede com este teu aproach que busca a composição das idéias sobre um assunto tão complexo como esse.
A complexidade é tamanha que demanda muitos desdobramentos de várias ordens.
Alguns deles , como por exemplo a concepção do sofrimento psíquico como doença, já nos levaria a uma boa e instigante conversa. Esta modulação e suas consequências tem sido objeto de muita polêmica e postarmo-nos de um "lado" ou outro não parece ser a atitude mais produtiva.
A RHS cumpre a função de ser uma ágora aberta que acolhe todo tipo de expressão possível e potencializa as trocas de idéias e práticas, num movimento de democracia virtual.
Que outras vozes se juntem nessa deriva que vc abre por aqui!
Iza Sardenberg
Coletivo de editores/curadores da RHS
Por fabiobhalves
Caro Rafael, seja bem vindo.
Este espaço sustentará o debate nas diferenças.
Saudações de Fábio BH e até a VITÓRIA!!! ( Coordenador da PNH )
Por rafaelbernardon
Prezados colegas:
agradeço o acolhimento e os comentários. Sinto-me bem em poder participar deste espaço e compartilhar algumas opiniões e experiências. Atuo em gestão, mas também trago a experiência da ponta, de um hospital psiquiátrico moderno, o CAISM Santa Casa da Vila Mariana, onde presto assistência e interajo com a rede psicossocial.
Inicialmente comento o uso do termo "lugar de louco não é na rua", um exagero provocativo e proposital. Na verdade, creio que ninguém ache que lugar de paciente psicótico seja perambulando pelas ruas, francamente agudizado, delirante, em situação de desamparo e mendicância. Para mim, configura negligência. Não gosto, tampouco, do termo "louco". Pejorativo, desde o código penal de 1830, onde já se rotulavam os psicóticos de "loucos de todos os gêneros". Lugar dos nossos pacientes, pessoas com doença/transtorno/sofrimento mental é na sociedade, exercendo sua cidadania, tendo convivência participativa, mas sendo protegido se necessário, na minha opinião. Sabrina, quando você diz "é definido singularmente dentro de um contexto de possibilidades" eu acho excelente! Carece de reconhecermos mais as impossibilidades de muitos frágeis que estamos deixando desamparados, jogados, sem tratamento ou assistência social adequada. Ou pior, presos.
A questão do biologizante me remete a 1952. Vejam. O maior artífice da reforma e desinstitucionalização é o sr remédio. Na década de 40 havia nos EUA 560.000 internados. Com a introdução da clorpromazina (Amplictil) em 1952, o alívio dos alívios, o primeiro tratamento farmacológico para esquizofrenia, a população dos manicômios e hospitais caiu 200.000 em 20 anos; em 1994 era de cerca de 90.000 pessoas, mesmo com o crescimento populacional americano. O mesmo aqui. Há um componente biológico, uma disfunção estrutural, funcional, sináptica, na neurotransmissão, como queiram. Mas não deixa de haver questões dinâmicas, sociais, laborais, às vezes legais, etc. Cada um tem seu espaço e especificidade, dentro do seu campo de conhecimento. Dependemos muito de equipe. Na minha seara (forense) – demais! O médico tem papel de fazer o diagnóstico médico. Isso não define o paciente, mas define a conduta médica, abrindo um leque de ações desde preventivas às terapêuticas, sendo bem sucinto. Define se vai medicar, ou não. Não acho que deva haver "monopólio", mas cooperação, trabalho em equipe, complementariedade, sem uma competitividade que muitas vezes me é reportada como um grande desconforto que afasta o psiquiatra da rede. Perdem todos.
Basaglia e Sararaceno, deixo pra outro post!
Creio que a aproximação de hospitais psiquiátricos e RHS pode ocorrer, assim como tem sido feita a integração deles à RAPS em São Paulo. Acho que a ABP tem toda a disponibilidade para auxiliar e opinar junto ao MS. Agradeço as boas vindas do Fábio, coordenador do PNH, pessoa muito admirável e inspiradora. Sinceramente espero que da troca de ideias surjam progressos e aproximações.
Abraços!
Por rafaelbernardon
Sr Ministro, caros colegas da saúde:
sou psiquiatra, atuo na saúde pública junto à SES-SP e à Santa Casa de SP. Vou arriscar um primeiro post neste fórum, estimulado pela fala do nosso ministro. Inicialmente, vejo esta data como oportunidade para reflexões. Fala-se em luta, em militância, como se estivéssemos em guerra, como se o inimigo oculto e não declarado (pelo menos aqui) – a medicina e a psiquiatria – quisessem o mal do doente mental. Vejo sempre com reticência quando começamos a deixar de chamar as coisas pelo nome, minimizamos gravidade, utilizamos o subterfúgio do eufemismo, eivados de boas intenções, e acabamos desqualificando aquilo que o paciente ou usuário apresenta. Sofrimento psíquico é um termo amplo, aberto, cabendo desde para a angústia pela derrota do Corinthians, até o sofrimento pelo delírio persecutório de um esquizofrênico ou a angústia e tristeza de um deprimido grave. Sem defini-los pela doença. Mas pessoas COM doença, assim como alguns têm diabetes, câncer, hipertensão.
Tivemos muitas conquistas desde a 'carta de Bauru'. Precisávamos evoluir e evoluímos, ninguém é a favor de manicômios. Mas, tampouco, podemos defender uma política de subfinanciamento que, propositadamente, mantém pessoas em condições subumanas, em hospitais de crônicos a R$ 35 – 45 por dia (inclusos comida, vestuário, remédios, equipe enfermagem, limpeza, médicos, outros profissionais de saúde, nutrição, cama, etc), apenas para provar a tese de que aquela instituição é inadequada e deve sumir do mapa. Acho perverso. E ponto! Porque são milhares. Fins justificam os meios? Ou o certo seria manter condições dignas e pactuar a desinternação gradual, sempre que possível?
Defendemos, todos, uma assistência ambulatorial, comunitária, abrangente e de qualidade. Com resolutividade na atenção básica, em rede. No entanto, a restrição à existência do hospital especializado precisa ser repensada e revista. Há espaço para INCOR, Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, AACD, Instituto do Rim, Instituto do Câncer – todos hospitais especializados – por que não pode haver o hospital especializado em psiquiatria, como retaguarda à rede? Na Santa Casa, temos o Centro de Atenção Integrada em Saúde Mental, um modelo interessante, não há nada de manicômio, assim como o Instituto de Psiquiatria do HC-FMUSP, e seria ignorância assim denominá-los.
Há o que se comemorar, mas não esqueçamos. Lugar de louco, não é na rua! Não é romântico a liberdade sem limites de viver a loucura, a psicose ao léo, ao relento. Cabe ao Estado zelar pelos vulneráveis, sem crítica ou sem discernimento. Abandonados à própria sorte, sem famílias ou instituições que deles cuidem, acabam se tornando duplamente "sofredores psíquicos", ao terem contato com drogas como o crack. A política das residências terapêuticas não os atinge. Mas a polícia, sim. Esta é outra faceta, que deve ser olhada atentamente: a criminalização. São presos, e acumulam-se em cadeias. São 7% da nossa população prisional de 550.000. Identificados, com medida de segurança decretada (tratamento compulsório pelo código penal), são cerca de 600 aguardando vaga para transferência para, aí sim, manicômio judiciário. Detalhe, em carceragens comuns, com pouco ou nenhum tratamento. Culpa do juiz, ou sa saúde pública?
São vasos comunicantes. Se o sistema civil deixa muitas brechas, o forense incha.
Vejam, temos uma das psiquiatrias mais avançadas do mundo, e, paradoxalmente, Ministério da Saúde não se comunica com a Associação Brasileira de Psiquiatria há anos. Temos que investir em ações e programas baseados em evidências!
Segue a referência:
Prevalence of Mental Disorders among Prisoners in the
State of Sao Paulo, Brazil
https://www.plosone.org/article/fetchObject.action?uri=info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pone.0088836&representation=PDF