REORGANIZAÇÃO DAS VISITAS DOMICILIARES EM FUNÇÃO DA ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO FAMILIAR – O ACS como multiplicador de saúde.
Projeto de intervenção desenvolvido pelos doutorandos da turma VI, na Unidade Básica de Saúde de Bela Parnamirim/Parnamirim-RN (Figura 1), buscou valorizar, intensificar e multiplicar o conhecimento e a participação dos agentes comunitários de saúde no processo de identificação e captação das famílias com risco elevado de acordo com a escala de Coelho e Savassi.
O presente trabalho buscou reordenar as visitas domiciliares em função da estratificação de risco familiar da Escala de Coelho-Savassi. Foi realizado no município de Parnamirim/RN, especificamente na unidade básica de saúde de Bela Parnamirim durante o mês de setembro do presente ano, baseado no tripé: 1) adequada formação dos agentes comunitários de saúde para uso da Escala de Estratificação de Risco de Coelho-Savassi; 2) realização de oficinas teórico-práticas com os agentes comunitários para estratificar o risco de todas as famílias que compõe as microáreas da unidade básica de saúde de Bela Parnamirim; 3) reorganização da visita domiciliar por meio de reunião com toda a equipe da unidade. Neste trabalho, apresentamos o primeiro pilar. Tratou-se de um estudo descritivo de corte transversal. A amostra inicial contou com a participação de nove dos onze agentes comunitários de saúde (81,81%) que desconheciam a escala de Coelho-Savassi. Foram aplicados pré e pós-testes para aferição de conhecimentos prévios e posteriormente adquiridos com o curso, onde observou-se a evolução de 73% do total de acertos. Infere-se, portanto, que o investimento na formação continuada do ACS é fundamental na apropriação do conhecimento e surte um efeito progressivo e promissor, culminando na melhor assistência comunitária em saúde.
Figura 1 – UBS de Bela Parnamirim (Parnamirim/RN)
JUSTIFICATIVA
Historicamente, a existência dos cuidados em saúde no domicílio remonta o período das sociedades antigas, como Grécia e Egito. A compreensão do seu significado perpassou séculos e acompanhou as transformações da assistência em saúde para a família. Porém, com o advento da Medicina Científica e do hospital como instituição de assistência à saúde no século XIX, os cuidados em domicílio obtiveram seu decréscimo e a doença passou a ser institucionalizada. Não obstante, o século seguinte, séc. XX, implodiu na crise da instituição hospitalar e a atenção domiciliar surgiu como extensão do próprio hospital no final da década de 1940, como resolução para a congestão/obstrução de sua crescente demanda (CADERNO DE ATENÇÃO DOMICILIAR, MS, 2012)1.
Acompanhando as crescentes necessidades de realinhamento com as novas políticas públicas em saúde, a terminologia ATENÇÃO DOMICILIAR foi definida pela PORTARIA Nº 2.527, DE 27 DE OUTUBRO DE 2011, do Ministério da Saúde como: “nova modalidade de atenção à saúde, substitutiva ou complementar às já existentes, caracterizada por um conjunto de ações de promoção à saúde, prevenção e tratamento de doenças e reabilitação prestadas em domicílio, com garantia de continuidade de cuidados e integrada às redes de atenção à saúde” (DOU Nº 208 – 28/10/11 – Seção 1 – p.44)2.
A atenção domiciliar constitui-se, portanto, como uma ferramenta de assistência multiprofissional (médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, fonoaudiólogos, nutricionistas, odontólogos, psicólogos, farmacêuticos) direcionadas às pessoas com necessidades de cuidados especiais em saúde e com dificuldades de se locomoverem às Estratégias de Saúde da Família – ESF e/ou ao Hospital e/ou às Urgências/Emergências.
O processo de captação das famílias com necessidades em saúde no domicílio dar-se por meio do cadastro das famílias pertencentes à determinada microárea de um determinado município. O profissional responsável pela captação das famílias é o Agente Comunitário de Saúde – ACS que, além de captar e cadastrar as famílias adscritas em base geográfica definida, deve: 1) orientar às famílias quanto à utilização dos serviços de saúde disponíveis; 2) acompanhar, por meio de visita domiciliar, todas as famílias e indivíduos sob sua responsabilidade; 3) desenvolver ações que integrem a equipe de saúde e a população adscrita à Unidade Básica de Saúde – UBS e 4) manter contato permanente com essas famílias (LEI No 11.350, DE 05 DE OUTUBRO DE 2006)3. Observa-se, consequentemente, que o ACS constitui-se como o elo entre o serviço de atenção primária e a comunidade. Ele é, portanto, o primeiro responsável pela coleta de dados acerca das informações sobre as condições primárias em saúde das famílias adscritas em sua microárea.
A ferramenta da qual dispõe o ACS para registro de informações acerca de sua microárea é a Ficha A – Ficha de Cadastramento Familiar (ANEXO 1), que alimenta de dados o Sistema de Informação de Atenção Básica – SIAB. A Ficha A constitui-se de informações acerca do perfil sócio-demográfico-sanitário da família conferindo uma estratégica para aprimorar a vigilância em saúde de todas as UBS e possui, portanto, no ACS o principal ator para as essenciais mudanças socioambientais da comunidade na qual estão inseridos.
A Escala de Coelho, Savassi e Lage foi desenvolvida no município de Contagem, Minas Gerias e baseia-se na Ficha A, utilizada pelos ACS. A escala se constitui como instrumento de estratificação de risco familiar, e é direcionada às famílias adscritas a uma equipe de saúde da família determinando seu risco social e de saúde, buscando refletir sua possibilidade de adoecimento. Por meio da Escala de Coelho-Savassi, a equipe multidisciplinar da UBS pode estabelecer as prioridades para as visitas domiciliares (SAVASSI, LAGE, COELHO, 2012)4.
Em consonância com os atributos médicos na Atenção Primária de contribuição, realização e participação das atividades de educação permanente dos membros da equipe da Estratégia de Saúde da Família – ESF, os alunos do sexto ano de Medicina, da Universidade Potiguar – UnP/RN, pertencentes à disciplina de Medicina da Família e Comunidade buscou valorizar o papel desse importante profissional da equipe da ESF, que é o agente comunitário de saúde, fortalecendo suas ações através da apropriação do uso da escala de Coelho-Savassi por parte dos ACS. O presente projeto foi realizado no município de Parnamirim, Rio Grande do Norte, abrangendo os profissionais da Unidade de Bela Parnamirim.
O trabalho possui três pilares: 1) orientação sobre o uso da Escala de Coelho-Savassi para os ACS; 2) realização de oficinas teórico-prático de estratificação das microáreas da UBS de Bela Parnamirim; e 3) redefinição da visita domiciliar com toda a equipe da UBS de Bela Parnamirim. O presente projeto discursa sobre o primeiro pilar.
METODOLOGIA
Tratou-se de um estudo descritivo de corte transversal. A população base foi composta pelos 9 dos 11 agentes comunitários de saúde atuantes na Unidade de Saúde da Família do Município de Parnamirim, em agosto de 2014.
A coleta dos dados foi realizada utilizando-se um questionário semiestruturado, autoaplicável e pré-testado fornecido a todos os agentes comunitários de saúde da unidade de Bela Parnamirim para obter as informações de interesse do estudo. Tal questionário era composto por 15 perguntas objetivas baseado na ficha A e no artigo: Sistematização de um instrumento de estratificação de risco familiar: Escala de risco familiar de Coelho-Savassi. Esse artigo mostra informações básicas para o agente comunitário de saúde sobre este instrumento utilizado às famílias adscritas a uma equipe de saúde. Importante para estimar o risco social e de saúde, refletindo a probabilidade do processo patológico. Este foi disponibilizado para os agentes.
O primeiro pilar do projeto de intervenção foi dividido em três momentos distintos: Primeiramente foi aplicado um pré-teste (Figura 2), um questionário específico com o intuito estimar o conhecimento dos ACS sobre a Escala de Coelho-Savassi e sobre a Ficha A com duração de uma hora. Após, foi ministrado um curso sobre a Escala De Estratificação de Risco Familiar de Coelho-Savassi e a utilização da Ficha A com duração de três horas. Ao término do curso, foi realizado um pós-teste, um outro questionário específico para estimar o conhecimento adquiridos dos ACS durante o curso. É importante frisar que o questionário utilizado no pós-teste foi o mesmo usado no pré-teste (ANEXO 3), com essa medida, tentou-se facilitar a avaliação de retenção de conhecimento. Posteriormente, pretende-se realizar uma oficina de reorganização da visita domiciliar, com duração de 3h, onde os ACS poderão treinar o que lhes foi ensinado. Intenta-se, ainda, realizar uma reunião com toda a ESF, durante e após a oficina, para que todos tenham conhecimento do instrumento e passem a valorizá-lo.
Os dados obtidos por meio dos questionários foram organizados em tabelas para facilitar a interpretação dos números.
Figura 2 – Aplicação do Pré-Teste
RESULTADOS
A unidade básica de saúde de Bela Parnamirim, município de Parnamirim, possui onze agentes de saúde, mas apenas nove aceitaram participar do projeto. Dessa forma, tivemos uma amostragem de 81,8%. Todos realizaram curso de capacitação. Quanto ao gênero, 33% são do sexo masculino e 67% são do sexo feminino. Quando questionados sobre atividade extra, obtivemos resposta positiva de 03 agentes (33%) e 06 respostas negativas dos demais (67%). Ninguém tinha conhecimento da escala antes desse projeto de intervenção. Destes, 55% apresentam idade de trinta a trinta e cinco aos e 45% possuem idade maior que trinta e cinco anos. Dos entrevistados, 67% apresentam ensino médio completo e 33% possuem ensino superior incompleto.
O questionário empregado teve o intuito de avaliar o conhecimento prévio da escala de Coelho-Savassi e da Ficha A do SIAB. Também é objetivo do projeto orientar a aplicação de tal escala. No pré-teste os acertos foram de cinquenta e dois (total), apresentando 41%. Já no pós-teste, observa-se um resultado animador, os acertos totais aumentaram para noventa (total), 71% de acerto. Podemos constar um aumento de 73% do rendimento dos agentes comunitários de saúde após o curso.
Quando questionados sobre a importância do trabalho, considerando uma nota de 0 (mínima) e 10 (máxima), dois (22%) agentes comunitários de saúde consideram entre 4-7 e oito (78%), avaliam entre 8-10.
DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
Pôde ser observado, por meio das respostas dadas no Pré-Teste, uma dificuldade inicial do entendimento das ações necessárias ao manejo da estratificação de risco, visto que todos os ACS desconheciam a escala. Observamos também o interesse dos ACS em absorver o conhecimento compartilhado através da discussão sobre o artigo: Sistematização de um instrumento de estratificação de risco familiar: Escala de risco familiar de Coelho-Savassi, já que observamos um aumento de 73% do total de acertos. Infere-se, portanto, que o investimento na formação continuada do ACS é fundamental na apropriação do conhecimento e surte um efeito progressivo e promissor. No entanto, sabe-se que esse passo inicial não é o suficiente para a equipe da Ubs crescer. Portanto, o projeto possui um continuum. Nesse primeiro momento com os ACS, o projeto ainda prevê a realização de uma oficina, onde os ACS poderão colocar em prática tudo o que foi compartilhado no momento inicial, fixando, o conhecimento e criando mais familiaridade com o novo instrumento.
Notou-se ainda, durante a realização da palestra sobre a Ficha A do SIAB, várias dúvidas sobre a sua utilização, mesmo já tendo recebido treinamento para usá-la. É estimulante perceber que o presente projeto ajudou os ACS a esclarecer as dúvidas e fixar conceitos pré-estabelecidos. Pode-se constatar esse fato pelo aumento de 60% dos acertos relacionados às questões da Ficha A.
Pode-se afirmar que a meta principal da palestra ministrada, que foi fomentar conhecimento aos ACS sobre escala de Coelho-Savassi, foi atingida, visto que ocorreu um aumento de 101% do número de acertos relacionados as questões sobre a escala.
Reitera-se, por fim, a importância da realização do projeto subsequente, pois melhorando e treinando os agentes comunitários de saúde, bem como fomentando o trabalho em equipe poderemos obter uma estratificação de risco mais fidedigna, condizente com a realidade na qual Bela Parnamirim está inserida. Isso facilitaria consideravelmente a seleção de pacientes para a visita domiciliar e a elaboração de projetos terapêutico-singulares para as famílias. Consequentemente, tal ação geraria um impacto mais significativo na redução da morbimortalidade da comunidade.
REFERÊNCIAS
1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica.
Caderno de atenção domiciliar / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2012;
2. DOU Nº 208 – 28/10/11 – Seção 1 – p.44. Pesquisado em 01.09.2014: ftp://ftp.saude.sp.gov.br/ftpsessp/bibliote/informe_eletronico/2011/iels.out.11/Iels205/U_PT-MS-GM-2527_271011.pdf ;
3. LEI No 11.350, DE 05 DE OUTUBRO DE 2006. Pesquisado em 01.09.2014: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11350.htm ;
4. SAVASSI, L. C. M; LANGE, J . L; COELHO, F. L. G. Sistematização de um instrumento de estratificação de risco familiar: Escala de risco familiar Coelho-Savassi. Journal of Menagement and primary health care, v.3, n.2, p.179-185, 2012;
5.DUNCAN, Bruce Bartholow et al. Medicina ambulatorial: condutas de atenção primária baseadas em evidências. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013;
Lícia Marah Figueredo de Mesquita
Petronílio de Sousa Ferro Neto
Stefânia Cardoso da Silva
Victor Andrade Nunes
Por Luciane Régio
Você teria alguma foto para subir no post?
Da UBS, ou dessa pesquisa, para que possamos divulgar melhor na RHS, no FB, twitter, carrossel…
Bem interessante o trabalho de vocês, parabéns!
Os ACS são pessoas importantes nas equipes, e deixar isso em evidência, produz saídas nos territórios.
AbraSUS,
Luciane
Coletivo de cuidadores da rhs