Uma história a ser contada

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Inicio essa fala com um poema que dedico a todos os Agentes Comunitários de Saúde que hoje completam 20 anos de luta em busca de uma saúde com qualidade. O poema intitulado “VOCÊ SABE DE ONDE VENHO“ foi escrito em 2002, num livro denominado Os SINAIS VERMELHOS DO PSF, de uma grande estudiosa e apaixonada, assim como eu, pela Estratégia de Saúde da Família, a paraibana Fátima de Sousa:
VENHO DO VERDE MAIS BELO
DO MAIS DOIRADO AMARELO
DO AZUL MAIS CHEIO DE LUZ
CHEIO DE ESTRELAS PRATEADAS
QUE SE AJOELHAM, DESLUMBRADAS
FAZENDO O SINAL DA CRUZ

VENHO DO MORRO, DO ENGENHO
DAS SELVAS, DOS CAFEZAIS
DA BOA TERRA DO COCO
DA CHOUPANA ONDE UM É POUCO
DOIS É BOM, TRÊS É DEMAIS

VENHO DAS PRAIAS SEDOSAS,
DAS MONTANHAS ALTEROSAS
DO PAMPA, DO SERINGAL
DAS MARGENS CRESPAS DOS RIOS,
DOS VERDES MARES BRAVIOS
DA MINHA TERRA NATAL!

QUEM EU SOU
EU NÃO SOU PAULISTA
DA RESISTÊNCIA PUJANTE,
DE UMA FORÇA ALTRUISTA,
QUE NASCEU BANDEIRANTE.

EU NÃO SOU CARIOCA
DA BELEZA SOLSTICAL,
CUJA ALMA INVOCA
UM ALEGRE CARNAVAL

EU NÃO SOU MINEIRO,
DA PRECIOSA PEDRA,
DO PERFIL MATREIRO…

EU NÃO SOU NORDESTINO
DO TRABALHO SOFRIDO,
SUOR DE HOMEM E SORRISO MENINO,
SOBREVIVENDO NA SECA COM SEU TINO…

A MINHA PELE NÃO TEM COR,
O MEU SANGUE É COMPANHEIRO
GUARDO NO MEU ESPLENDOR
O ORGULHO DE SER BRASILEIRO
EU VENHO DO BRASIL…
SOU BRASILEIRO
OCHENTE, UAI, TCHE.

Caros Agentes Comunitários de Saúde, a sua história não começa há 20 anos, em 1994, ela se inicia, sim, há alguns anos antes, quando nossos vizinhos cearenses tiveram a bela ideia de convocar pessoas que moravam nas comunidades, principalmente mulheres, para tentar combater a mortalidade materna e infantil, que naquela ocasião, no final dos anos 80, compunham os mais cruéis indicadores do nosso amado nordeste, chegava a 70 crianças morrendo de diarreia ou desnutrição no primeiro ano de vida. Esses bravos companheiros conseguiram a façanha de diminuir a mortalidade infantil. Era preciso expandir essa experiência, foi o que fez o Ministério da Saúde, que em 1991 criou o Programa de Agentes Comunitários de Saúde, novamente iniciando pelo nordeste e só chegando na terra potiguar nos idos de 1994.
E ai, assim, começa a história de vocês. E hoje, relendo o livro Contos, Cantos e Encantos de Felipe Camarão; Histórias do PSF, vi um texto de autoria de Rudnilson Candido, elencando os 10 anos de aniversário de vocês. Peço licença para descrever alguns trechos: “ Dessa forma, iniciamos o nosso trabalho no ano de 1994, nesta Unidade de Saúde. No inicio, temerosos, curiosos, indecisos, com uma nova missão. Muito de nós, apesar de morarmos no mesmo bairro, não nos conhecíamos. Era, outrossim, um exercício de aprender a conhecer o outro, respeitar as diferenças. Tratava-se de um ano político, as pessoas olhavam com desconfiança, achando que era mais uma forma de manipulá-las. Aos poucos fomos conquistando nosso espaço, mostrando a comunidade que éramos importantes neste novo modelo, conhecendo de perto cada morador da área, repartindo um pouco seus anseios e sofrimentos…. Não foi fácil chegar até aqui. Os desafios são muitos, inimagináveis, mas é preciso tentar. Ficamos felizes e olhamos para trás e no túnel do tempo trazemos algumas vitórias, a diminuição da mortalidade infantil e materna, o acompanhamento das gestantes, diminuição das diarreias,, formação de grupos de hiperdia, gestantes, idosos, adolescentes…”
Bem, caros Agentes, venho hoje parabenizá-los por essa bela trajetória de 20 anos, mas acima de tudo vim agradecer, por ter participado durante 16 anos dessa história e dizer que com vocês aprendi muito, o que sou hoje, grande parte devo a vocês que me ensinaram a amar o seu lugar, ensinaram-me o que é “não ter e ter que ter pra dar”, parafraseando o compositor Djavan, ensinaram-me a dividir, a persistir, a ser tolerante, a lutar por dias melhores, por esse bairro tantas vezes discriminado, ensinaram-me até a escrever, com palavras que vieram do coração, vieram da minha alma. Quero agradecer o que fizemos juntos, o que construímos juntos, o que repartimos juntos; as nossas alegrias, quando conquistamos os prêmios; as nossas tristezas, quando perdíamos alguém da comunidade, seja, um idoso, uma criança, um jovem. Agradecer pelas “Caminhadas Pela Vida”, quantos de nós estávamos lá para pedir paz nos trilhos; agradecer pelas inúmeras peças de teatro que tanto conquistou os olhares da comunidade, inclusive, o teatro saindo dos muros, indo até o outro lado da cidade com o Auto de Felipe Camarão. Lembram do Fórum de Qualidade de vida? tanto que queríamos que as nossas crianças que sobreviveram a mortalidade infantil, pudessem viver dignamente. Partilhamos juntos as missas em favor da vida, a transformação do bairro, lembro bem, que iniciamos o Saúde da Família ainda com algumas ruas de areia, e hoje todas são pavimentadas, a saída do antigo Lixão, da conquista pela quadra de esportes do Djalma Maranhão, dos aniversários do bairro, da FEIRARTE, do “Pastoril do Peixe-Boi Encantado”, do “Terapia e Arte”, do “Conviver para Melhor Viver”, do livro já citado anteriormente, e mais recentemente das “Meninas que Vi Crescer”.
Acredito que tenha sido uma bela história de amor, de aprendizado, de grande afeto. Levarei comigo, onde estiver, em que mares eu for, que um dia pude contribuir para a melhoria da saúde de uma terra de nome Felipe Camarão, e comigo, lutaram os bravos guerreiros que se chamam AGENTES COMUNITÁRIOS DE SÁUDE.
Obrigada.
Felipe Camarão, 01 de Setembro de 2014.
Meine Siomara Alcântara