Aborto. Eu quero decidir.

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Estimativas de 2005 da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que ocorrem a cada ano no planeta cerca de 87 milhões de casos de gravidez indesejada. Desses resultam entre 46 milhões e 55 milhões de abortos. Diariamente ocorre no mundo um aborto a cada 24 segundos.  Segundo estimativas de 2001, 10% das gestações no Brasil terminam em aborto. Ocorrem cerca de 1,5 milhões de abortos a cada ano. Cálculos do Ministério da Saúde, por sua vez, revelam que 3,7 milhões de mulheres entre 15 e 49 anos induziram aborto (7,2% do total de mulheres em idade reprodutiva). Isso não levando em consideração que o número  é altamente subestimado, por arcaicamente o aborto ainda ser ilegal e não ter como ser mensurado realmente, pois não é algo que se possa sair contando por aí… O que me faz recordar o caso da Jandira…

Jandira, 25 anos, mãe de dois, foi levada a uma clínica de aborto clandestina e “desapareceu”. E é isso que acontece em um país que criminaliza a liberdade de escolha da mulher.

Sempre tive na minha cabeça que uma mulher que quer fazer um aborto não está interessada se sua vizinha acha um crime, ou se o seu pai considera a legalização um genocídio. Uma mulher que quer fazer aborto vai fazer esse aborto. Ou vai ao menos tentar, seja numa clínica ou em casa com remédio, torcendo para que não precise ir ao médico fazer uma curetagem, ser denunciada e presa. Uma mulher que estiver passando pelo desespero de uma gravidez indesejada vai colocar sua vida em risco porque o Estado não nos dá o direito de escolher legalmente o que queremos, então burlamos a lei. Uma mulher que está desesperada para abortar vai abortar. Quer você, o Estado ou Deus gostem ou não. Não dá nem pra dizer que quem tem dinheiro sempre vai na clínica clandestina que vai oferecer algo com "mais qualidade", olha o que aconteceu com a Jandira.  Ela pagou quatro mil e quinhentos reais e morreu. Imagina o que acontece com quem não tem nenhum dinheiro. Com as mulheres negras, pobres, da periferia.

É por essas e outras, que eu, mulher, jovem e que por algumas vezes já tive o medo de ter uma gravidez indesejada, me pergunto o porque um problema de saúde pública, ainda pode ser pautado por valores meramente morais… A legalização do aborto não é uma questão de crenças, tabus ou religião, que sequer deveriam ser envolvidos nessa questão. É uma questão de saúde pública e deve ser tratada como tal. 

Recém-eleito presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) afirmou, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, que a ampliação do direito ao aborto só será votada passando-se por cima do seu cadáver. E, enquanto isso, passamos por cima de cadáveres de mulheres que são levadas a realizar abortos de forma clandestina. Esses corpos se acumulam pelo país diante da hipocrisia, do machismo, da intolerância, do falso moralismo e do fundamentalismo.  Penso que cada morte dessas deveria ser colocada na conta de quem joga um problema de saúde pública para baixo do tapete.

Penso que não há alguém, em sã consciência, que seja a favor do aborto. Ele é ruim sim, é um ato traumático para o corpo e a cabeça da mulher, tomada após uma reflexão sobre uma gravidez indesejada ou de risco. Ninguém fica feliz ao fazê-lo, mas faz quando não vê outra saída. E por muitas vezes, não há.

O que deve ser discutido realmente é o direito ao aborto e não o aborto em si.  Defender o direito ao aborto não é defender que toda gestação deva ser interrompida. E sim que as mulheres tenham a garantia de atendimento de qualidade e sem preconceito por parte do Estado se fizerem essa opção. Promover métodos contraceptivos são importantes, mas eles não excluem a discussão sobre a ampliação desse direito. Porque erros de prevenção vão acontecer. Acontecem o tempo todo.E enquanto discutimos quando começa a vida (sobre isso dificilmente chegaremos a um consenso), mulheres morrem nesse processo. Negar o “direito ao aborto'' não vai o diminuir o número de intervenções irregulares.

É uma vergonha ainda considerarmos que a mulher não deve ter poder de decisão sobre a sua vida, que a sua autodeterminação e seu livre-arbítrio devem passar primeiro pelo crivo do poder público que decidirão quais os limites dessa liberdade dentro de parâmetros. Parâmetros estipulados historicamente por homens. Defendo o direito de nós, mulheres, decidirmos sobre nossos corpos mas mais que isso, o dever do Estado de garantir esse nosso direito.