MANIFESTAÇÃO CONTRA AS DETERMINAÇÕES DE INTERNAÇÕES COMPULSÓRIAS AOS USUÁRIOS DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS

13 votos

images_0.jpg

 

O Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP SP) e a Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) manifestam publicamente seu repúdio diante do conteúdo da matéria veiculada na mídia televisiva do município de Ourinhos localizado no interior paulista, que divulga como algo positivo para a cidade o fato de ser “pioneira em adotar internações compulsórias na região”. A reportagem veiculada por um importante canal de televisão da região publicou no dia 17 de março de 2015 notícias sobre o drama das drogadições e a atitude da Secretaria de Saúde do município, junto ao Ministério Público e à OAB, na construção do projeto de internação compulsória direcionado à população de dependentes químicos.

O referente projeto do município afronta diretamente as duras conquistas do Movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira que, desde a década de 1980, luta contra os processos de exclusão, internação de pessoas em intenso sofrimento psíquico e usuários de álcool e outras drogas em manicômios, hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas.

Dentre as conquistas do Movimento da Reforma Psiquiátrica destaca-se a Lei 10.216/01 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas em intenso sofrimento psíquico e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, estabelecendo o acolhimento dessa população na Rede de Atenção Psicossocial e em serviços substitutivos à internação como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

A internação só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Dessa maneira, a lei prevê três modalidades de internação: internação voluntária, involuntária e compulsória. Salvo as especificidades de cada modalidade de internação, aqui, ressalta-se a internação compulsória que, conforme prevista na Lei da Reforma Psiquiátrica, deve ser determinada àquelas pessoas que cometeram algum ato definido como crime pela legislação penal, casos pelos quais esses sujeitos serão recolhidos em hospi­tais de custódia, como manicômios judiciários, em vez de serem encami­nhados para a prisão. Embora essa seja a única situação prevista em lei para a internação compulsória, atualmente, o poder judiciário tem ignorado essa regra do princípio da legalidade e ampliado as hipóteses para determinar internações aos usuários de álcool e/ou outras drogas.

Dessa forma, podemos compreender que a Secretaria de Saúde de Ourinhos e o Poder Judiciário do município, ao criarem um projeto de internação compulsória direcionado aos usuários de álcool e/ou outras drogas, não apenas promovem um grande retrocesso do Movimento de Reforma Psiquiátrica, como também infringem a Lei 10.216/01. É válido destacar que esta lei Federal foi construída em meio às mobilizações socais de luta e resistência que sempre levantaram a bandeira da desospitalização e da garantia de assegurar direitos à saúde em âmbitos substitutivos à internação hospitalar.

Por fim, entendemos que a prática de internações compulsórias como forma de tratamento viola os direitos humanos desses usuários, na medida em que desconsidera a complexidade do uso prejudicial de álcool e outras drogas, deslocando-o de um cenário social e cultural. Nos posicionamos, então, ética e politicamente, a favor de uma proposta de cuidado em Rede Intrassetorial –  já prevista pelos equipamentos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) – e Intersetorial, por meio da corresponsabilização e promovendo constante diálogo na construção de possibilidades de atenção ao usuário e ao contexto em que este está inserido.

XIV Plenário do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo
Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme)

Abril/2015