O AMOR ALÉM DA FIGURA DO HOSPÍCIO

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Com ela aprendi muitas coisas. Uma delas foi que eu poderia escutar, ajudar e aconselhar os outros .

O seu jeito diferente não me assustava. Nem mesmo seus gritos e frases repetitivas tais como:

-“Eu não sou subversiva! Não me prendam! “

Foi o que fez a ditadura militar na cabeça dela. Maldito período de repressão , capaz de

atormentar mentes, de destruir e desencorajar muitos viventes. 

Ela era minha tia, me tinha muito amor e isso superava qualquer problema… era o bastante.

Me tornei sua principal amiga. Comecei  logo cedo a ouvi-la.

Eram muitas histórias de sofrimento.
.
Vozes que iam e vinham, dias e meses marcados por internações no

hospício.

E eu ouvia atentamente , ouvia como uma criança que quer e não têm como ajudar,

ouvia ainda bem menina os seus lamentos. Porém, uma frase ficou na minha memória, era

uma súplica:

-“Eles misturam todo mundo. Há alguns que me queimam, que me agridem. Isso tem que

acabar!!!”

O que me atormentava mais era saber que a qualquer hora ela voltaria para aquele terrível

lugar .

E sempre me contavam histórias do tipo: '‘Sua tia foi viajar"

Era a reposta que eu tinha quando percebia a sua ausência

Vivemos muitos anos em sintonia, com muito amor e compreensão. Um pouco antes da

sua derradeira viagem, arrisquei fazer uma pergunta :
“ Porque eu sempre fui sua

sobrinha preferida ? “ Ao que ela rapidamente me respondeu :

– “ Você foi a única criança que se aproximou de mim, que me deu ouvidos e atenção”

Senti-me importante e muito especial.

Hoje fico imaginando ela viva comemorando o 18 de maio no meio dos movimentos de luta antimanicomial.

Onde ela estiver estará feliz.