ser criança e adolescer em uma sociedade desigual – Fórum PENSES – Unicamp
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Sobre o evento
As crianças e os adolescentes reais, que vivem no Brasil nos dias de hoje, em seus diferentes espaços geográficos, sociais, culturais e políticos brincam, brigam, estudam, constituem suas próprias subjetividades, sonham; enfim, vivem e lidam e batalham com a vida que têm.
A criança e o adolescente muitas vezes não são vistos como sujeitos históricos em si, plenos de subjetividade, que já vivem e não constituem meros futuros de um adulto. Nem miniaturas, nem apenas devir. Assim, crianças e adolescentes têm sido sistematicamente avaliados tendo por referência o modelo de um adulto idealizado, pura razão, “pronto”, símbolo de maturidade. Daí, crianças e adolescentes têm sido rotulados de imaturos, despreparados, rebeldes, indisciplinados, apáticos, improdutivos etc. Além disso, ignora-se que também o adulto nunca está “pronto”, sempre está evoluindo e podendo aprender, se transformar.
As crianças e os adolescentes, assim como os adultos, são “sujeitos datados e situados”, como bem disse Paulo Freire; são histórica e culturalmente construídos. São todos diferentes uns dos outros. Porém, também são resultados e expressões do modelo de sociedade fundado na desigualdade. Todos diferentes entre si, mas a maioria em situação de desigualdade, por inserção social, etnia e gênero.
Dependendo da inserção social, ou da “pertença social” do indivíduo – o ser criança, o adolescer e o ser adolescente são muito diferentes – desiguais – assumindo significados e valores específicos.
Assim, se compararmos os dois extremos da pirâmide social brasileira, encontraremos em seu ápice, crianças e adolescentes vivendo um longo período de descomprometimento com a própria sobrevivência, sendo preparados por meio de recursos diversos, para a realização de seus projetos futuros. Crianças e adolescentes que incorporam, via de regra, o papel atribuído a eles pela sociedade capitalista urbano/industrial: de consumidores por excelência, em processo estimulado pela publicidade, através dos meios de comunicação de massa.
Crianças e adolescentes são, assim como os adultos, subjetivamente constituídos pelo, para e como consumo.
Os meios de comunicação levam também, implícita ou explicitamente, mensagens, que ao se incorporarem ao imaginário desses jovens, dão a eles a certeza de serem o centro das relações sociais, fazendo com que se sintam gratificados por sua beleza, sua vitalidade, seu grupo, seu smartphone, seu tablet, seus games, …, enfim, pelo que possuem.
No caso específico dos adolescentes, são, segundo Marilena Chauí, tão gratificados que correm o risco de se tornarem infantilizados, incapazes de suportarem e trabalharem a frustração; incapazes de tolerarem a solidão e autoritários em relação a tudo o que não condiz com a bela imagem que possuem de si mesmos e de suas ideias e valores. Adolescentes a quem é roubado o direito de serem sujeitos de sua própria vida, na medida em que suas próprias condições de vida facilitam seu apego à obtenção de bens e o reduzem a mero consumidor, reduzindo seu espaço subjetivo e objetivo.
Por outro lado, na base da pirâmide encontraremos crianças e adolescentes que, por estarem expostos à necessidade de garantir a própria sobrevivência, encontram-se impossibilitados de experimentar esse tempo da vida enquanto período de descomprometimento em relação ao processo produtivo. Alguns, como os “meninos de rua”, por exemplo, não podem usufruir da prerrogativa de construir projetos para o futuro, por estarem comprometidos e marcados por uma posição social que foram obrigados a assumir desde o nascimento. Por estarem sempre no limite entre a fome, o frio, o medo, a morte, sua visão de mundo é referida ao aqui e agora e as expectativas para além do momento presente não são, normalmente, elaboradas, porque não há segurança de estarem vivos em um momento futuro.
Tendem a carregar um sentimento de profunda desvantagem em relação às demais classes sociais, principalmente por perceberem que consumir é um privilégio dos mais abastados, impossível para quem não tem satisfeitas suas necessidades mais elementares: comer, vestir, morar… Esse sentimento é agravado pelo apelo ao consumismo, promovido pela indústria do marketing, que se dirige a todos indiscriminadamente, acenando para a possibilidade de todos terem acesso a todo e qualquer bem.
Os extremos da sociedade brasileira nos escancaram algo que tendemos a ignorar, o fato concreto de que pessoas com pertenças sociais distintas não vivem a infância e a adolescência como um mesmo processo; mais gritante nos extremos, a desigualdade de acesso e oportunidades se manifesta em todos os segmentos da sociedade, na medida em que a inserção social seleciona, a priori, as (im)possibilidades de acessos econômicos, educacionais, culturais de cada pessoa ou grupo social.
Porém, os efeitos de uma sociedade fundada na transformação de cidadãos em consumidores são sentidos por todos, tenham ou não a possibilidade de consumir. Para esse modelo de sociedade, é fundamental a “democratização” dos sonhos de consumo, dos objetos desejados; assim, se mantém o status quo financeiro e político.
A erotização e consequente perda da infância, a banalização da privacidade são exemplos modelares do que hoje acontece. O estreitamento do espaço da invenção no brincar, pela propaganda pervasiva de brinquedos industrializados. A venda de alimentos acoplada a brindes para crianças, com todas as consequências para sua saúde, é outra manifestação deste processo. A perda de hábitos alimentares regionais pela invasão de empresas de fast food, disseminando a ingestão de alimentos super processados, com excesso de calorias, sódio e fósforo tem produzido gerações de crianças e adolescentes com vários problemas de saúde importantes, além das previsíveis repercussões futuras, com patologias crônicas nos adultos: obesidade, diabetes, síndrome metabólica, bulimia, anorexia, osteoporose em jovens…
Associe-se o cientificismo disseminado sobre alimentação, criando o que vem sendo denominado terrorismo nutricional, em que sofisticados conceitos de bioquímica e fisiologia são apresentados de modo superficialmente equivocado, e estará preparado o terreno para a erosão de saberes populares construídos ao longo de muito tempo, consolidados em hábitos alimentares que vêm sendo perdidos.
Diferentes barreiras se colocam a serem vencidos na vida de muitos; obstáculos econômicos, geográficos, culturais, biológicos, psicológicos. Porém, todos constituem sua própria subjetividade, cada um a seu modo, imersos em seu ambiente histórico, social e cultural; todos aprendem e evoluem, todos brincam, falam e pensam, todos sonham e desejam. Todos têm direitos, mais ou menos respeitados, cada um tem suas próprias possibilidades e limites, muitas vezes definidos por problemas de saúde, mas todos podem se transformar, todos podem aprender e se desenvolver em seu próprio tempo, ritmo e maneira.
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O evento será transmitido em tempo real pelo portal da UNICAMP
14 e 15 de Setembro de 2015
Sobre o Evento
O título do evento já nos coloca a necessidade de perguntas: o que é ser criança? o que é ser adolescente? como é deixar de ser criança e se transformar em adolescente?
O ideário dominante parece entender que as crianças – todas as crianças, sem distinção de inserção social, de etnia, de valores, de acesso a cultura, pois o ideário dominante também faz acreditar que existe simplesmente “a criança”, “a infância” – vivem em um mundo mágico e maravilhoso, feito de sonhos e fantasias, regado a sorvetes e chocolates. Do mesmo modo, os adolescentes (todos os adolescentes) são rebeldes, descompromissados, bagunceiros, alegres, extrovertidos, atrevidos.
Assim, a infância seria o melhor período da vida, o paraíso que será inevitavelmente perdido, suplantado por uma época de crises, conflitos e aborrecimentos. Porém, essa é apenas uma ideia superficial e equivocada, apesar de bastante enraizada na mente dos adultos. Adultos que, por sinal, esquecem do que sentiam, pensavam, desejavam, quando eram eles mesmo crianças e adolescentes.
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Realização
Apoio
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Por patrinutri
Muito bom sabermos deste evento!
Bjs Pat