Alvorada das trevas
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/pf-investiga-ameaca-de-envenenamento-de-dilma/
As condições de subdesenvolvimento no Brasil existem apenas para os pobres. Suas escolas, seus serviços de saúde, seu saneamento básico, o transporte público e a infraestrutura são as mesmas de nações do chamado terceiro mundo.
Mas há um Brasil desenvolvido. Nele as condições de trabalho e os salários são de primeiro mundo, as vezes maiores, até que de países com PIB e IDH bem superiores aos nossos.
Esse é exatamente o caso do judiciário, legislativo, tribunais de contas, ministério público, tribunais militares, setores de comando dos serviços públicos, e no mundo dos executivos das grandes empresas. Os recursos para a manutenção dessa desigualdade são drenados da produção e do trabalho da maioria.
A estratégia para perpetuar essa forma perversa de desigualdade social é de um lado, fazer crer que todos somos afetados da mesma forma pelas condições sociais e econômicas. E de outro lado, afirmar direitos legais sem nunca divulgar o seu custo real e não comparar qualitativamente os benefícios de cada tipo de serviço público.
Desse modo é que os gastos em saúde se concentram no componente hospitalar, que sempre pode ser acessado pelos mais abastados como no caso de transplantes que não são cobertos pelos convênios privados. Já, a atenção básica em saúde e a assistência social sofrem com a falta de recursos por que seu público imediato são as pessoas pobres.
O mesmo se dá com o sistema judiciário. Para impor a impressão de ordem social, em meio ao caos e anomia decorrentes da desigualdade social, ele é operado em majestosos prédios por uma elite super remunerada.
No entanto, na imprensa todos aparecem como vítimas. Uma situação paradoxal onde todos se acreditam lesados. O culpado é sempre um ente maligno, impessoal ou coletivo, bem adequado a generalização imprecisa.
Por isso a demonização da esquerda e das políticas de promoção da igualdade são uma linha de demarcação precisa de nossa tradição de intolerância à igualdade social. A resistência a perda dos privilégios advindos da exploração de mão de obra escrava é o paralelo histórico com a situação que estamos vivendo atualmente.
A situação está mais ou menos como o início da queda no limiar de uma catarata: Tudo se acelera, o corpo experimenta a sensação da perda de peso. Curiosamente, se tem a impressão de uma calmaria. Ao mesmo tempo, a angústia se transforma em horror na medida em que a iminência do impacto toma a consciência.
Mas até o choque com a água, com as rochas, o sufocar com os pulmões cheios de água, ou mesmo o primeiro fôlego de sobrevivente na margem tranquila, ainda vai se passar algum tempo.
No entanto, não restam muitas dúvidas. A euforia e as transformações do início do milênio correm sérios riscos
A aceleração do ressentimento e do ódio não vai frear antes do impacto. Não podemos retornar a hegemonia negociada da primeira década do século XXI. A carta ao povo brasileiro comprou a tolerância do sistema monetário e financeiro no Brasil e no mundo.
Mas essa concessão não foi suficiente para nos proteger da fúria fascista que deseja o extermínio da tolerância e da diversidade em nome da verdade única e da justiça divina.
Quando o Papa Bento XVI escreveu que o terrorismo não era pior que o relativismo, a verdadeira mensagem era menos ambígua: O mundo sólido do dogma e da teologia é mais sedutor do que a realidade complexa em que vivemos. A realidade líquida em que os extremos se tocam é o verdadeiro inimigo do fascismo e da intolerância.
A tríade formada pelo bem, o belo e o justo quando se travestem de "a verdade" condenam a diversidade de modos de ser, como meros erros. É então que o conservadorismo degenera em niilismo. Aquele silencioso desespero que todo o dogma, paradoxalmente, pretende combater.
É com mórbida alegria que os oráculos do ódio vomitam sua intolerância nas redes sociais. Sua indignação moralista mal esconde a euforia destruidora que anima suas palavras de ordem.
Aurora das trevas: Prever, na expectativa de que assim não vejamos o augúrio, de fato, acontecer. Muito embora, nesse mundo a água não suba queda acima…