Barreiras para inclusão do surdo no mercado de trabalho: lacuna da transversalidade no contexto das políticas públicas.

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Compreendendo a transversalidade como proposta de superação da histórica fragmentação dos públicos e das políticas públicas, uma análise retrospectiva do contexto das pessoas com deficiência nos revela como é fácil verificar que a invisibilidade, discriminação e negação de direitos fundamentais no Brasil são fenômenos identificados em diversas circunstâncias da vida em sociedade. No caso dos direitos dos surdos quanto ao acesso à escola, bem como da aceitação das diferenças, como objetos para adequação dos conteúdos de ensino, da necessidade de que os professores dos diversos níveis de ensino dominassem a Língua de Sinais Brasileira (Libras), devemos reconhecer que as políticas públicas na área de educação especial, hoje, educação inclusiva, não prepararam gerações de surdos para sua inclusão social.
Uma das maiores dificuldades para que adultos surdos de 20 a 50 anos sejam incluídos no mercado de trabalho formal, por exemplo, resulta da falta de escolaridade dos mesmos, comparada ao exigido pelas empresas. Maioria apenas estudou até o terceiro ano do ensino fundamental, enquanto as empresas exigem o ensino fundamental completo, que corresponde à oitava ou nova série do ensino fundamental. Regra que não deve ser aplicada ao contexto e histórico de discriminação vivenciado pelos adultos surdos, tendo em vista que as escolas até os aceitava, mas, não ofereciam intérpretes ou instrutores de Libras nas salas de aulas.
Aquele incluir por incluir, sem oferecer ao aluno surdo mínimas condições de acompanhar o desenvolvimento/aproveitamento dos demais alunos sem deficiência auditiva, o que frustrava o estudante surdo, penalizando-o, expondo-o, como menos capaz de acompanhar as estratégias de ensino adotadas como regra. Os professores sequer se esforçavam para adequar os conteúdos ao universo, cultura, dificuldades, especificidades da comunidade surda, pois, desconheciam e não se mostravam interessados em aprender seus sentidos, significados, de forma a tornar mais atrativas as atividades escolares.
Nesse ritmo, passaram-se semestres, anos letivos inteiros, impondo ao aluno surdo o desafio de se integrar, adequar a qualquer custo, ou se afastar do programa por perceber que não estava sendo respeitado como sujeito diferente e com necessidades educacionais específicas. Tão descrentes ficavam que, a partir de 2009, nas primeiras turmas do Curso Libras em Contexto, oferecido pela então criada Secretaria Municipal do Idoso e da Pessoa com Deficiência de Três Rios, convidados para integrar os grupos de alunos do curso, mostraram-se resistentes, descrentes, muitas vezes até impacientes diante da dificuldade do ouvinte aprender a Libras. Talvez uma forma de demonstrar que o ouvinte seria tão limitado para aprender a língua de sinais quanto eles para aprender o português escrito, ou o falado, pausadamente.
A propósito, é fundamental que não se perca de vista que, tanto a língua falada quanto à língua de sinais, passam por esquemas e formas de organização mental para que seus emissores expressem o desejado, de maneira que seus receptores entendam o que se está sendo transmitido. Então, não há menor sentido julgar que o surdo com escolaridade fundamental tenha fluência no português escrito, tanto menos que um surdo com escolaridade equivalente ao terceiro ano do ensino fundamental possa escrever, ler e compreender plenamente o conteúdo dos testes aplicados nos exames admissionais para acesso ao mercado de trabalho.
Fato indiscutível é que a administração pública na esfera da educação falhou e tem uma dívida histórica com a comunidade surda, com ônus para as atuais pastas nas três esferas de governo, mas, com peso maior em termos de execução para as pastas municipais, afinal, é nas cidades que os surdos vivem e lá onde devem ser atendidos em suas dificuldades educacionais.
Como bem destaca Juliana Segalla, na obra Manual de Direitos da Pessoa com Deficiência, o direito à educação mereceu especial destaque na Convenção da ONU sobre Direitos da Pessoa com Deficiência, em seu art. 24. Os Estados Partes se comprometem a assegurar um sistema educacional inclusivo em todos os níveis de ensino. Destarte, qualquer Governo ou escola que pratique o ensino segregado, que não ofereça um ambiente de diversidade, estará violando um direito humano de seus educandos. O direito à educação inclusiva não é apenas um direito dos alunos que têm deficiência, porém também daqueles que não as têm, porque TODOS precisam aprender a conviver com as diferenças e assim se desenvolverem plenamente como seres humanos e cidadãos conscientes.

Wiliam Machado
Secretário Municipal do Idoso e da PcD de Três Rios/RJ.