Habitamos o fundo de um poço de singularidade. Esse poço pode ser percebido como mais um, num conjunto incontável de pontos agrupados em um espaço tridimensional. Esses pontos se movem na velocidade da luz por uma quarta dimensão, onde tempo e espaço são aspectos de uma mesma realidade. Então, a borda dos pontos é margeada pelos pontos vizinhos. Parecemos próximos porque os pontos são nossos corpos no mundo, sempre atulhados, semelhantes uns aos outros em sua sina trágica de ser no mundo.
Mas esse ponto é a borda visível. A singularidade afunda nesse ponto até o inalcançável espaço denso de onde a alma dos seres emerge. Não importa a empatia, que é real, todos comungam, paradoxalmente, de uma identidade comum e de uma solidão incontornável.
Não podemos saber até onde somos iguais pois a clausura do comum é um abismo de solidão. Essa igualdade fundamental é a de não podermos nos tocar até a profundidade nua da alma. Presos na perspectiva limitada de uma aproximação e um afastamento que se prolongam em linhas opostas.
O poder é político, moral, filosófico e ideal. Ele é puro jogo de linguagem. Como o fundo do poço, ele é infinito em seu jogo, em sua dança conceitual, seu eterno oscilar de uma ponta a outra da extensão de seus múltiplos extremos.
No entanto, em seu aspecto pontual, o poder é concreto. É sim, a manifestação de jogos de linguagem. Mas é uma manifestação objetiva, física em seus efeitos. Ele é manifestado através da coerção ou liberação do espaço para a circulação dos corpos. Todo o resto, ainda que determinante, desaparece no efeito visível do poder. Assim – onde e com quem, como e para que seu corpo prossegue, ocupa, ou é reprimido, vedado, excluído – são os efeitos concretos do poder.
Desse modo é que ainda que numa profusão de encontros, em constantes toques – as vezes choques, as vezes impulsos sinérgicos – todos temos, simultaneamente, a sensação de imersão no todo e na singularidade, na companhia solidária e na solidão opressiva.
Uma é outra, empatia e solidão, são como a vida e a morte. Não existe luz sem o queimar contínuo da vela, não há vida sem o sentimento de intensa comunhão e profundo isolamento.
Todos os valores são assentados na soma de opiniões convencionais. Não há valor em si mesmo. Mas sim, o desejo por cada gesto individual de adesão a uma convenção artificial sobre o que é o bem, o belo e o verdadeiro.
Das profundezas do “ego” que rompe o tecido do espaço/ tempo, em direção ao infinito abissal e a infinita elevação, ansiamos pela coincidência do maior número possível de gestos existenciais.
A história – do mérito, da qualidade, da excelência e da genialidade – se resume ao desespero com que buscamos afastar as grades da solidão.