Meus agradecimentos e despedida do Apoio Institucional do Ministério da Saúde

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Encontro realizado em Santa Cruz, com Coordenadorias Regionais de Saúde e serviços da Macro Vales, em setembro de 2016, última roda que participei como apoiaodora do MS.

Neste mês de outubro deixei de trabalhar como Apoiadora Institucional do Ministério da Saúde, função que desenvolvi nos últimos 5 anos, induzindo a implementação do Sistema Único de Saúde. Trago estas palavras como forma de fechar este ciclo, agradecer muitas pessoas e publicitar algumas informações e aprendizagens.

Foi na faculdade de Psicologia que conheci o SUS e fiquei muito surpresa com a ideia de que havia atendimento em saúde disponível, sem que eu precisasse pagar e que o acesso à saúde é um direito de todos. Naquela época minha vó sofria com problemas de visão devido à diabete não controlada, morava no interior e havia cessado os recursos locais que ela podia acessar. Com vinte e poucos anos convenci minha mãe a trazê-la para Porto Alegre e buscar tratamento aqui. Conseguimos o acesso e conseguimos uma grande melhoria na visão da vó, que estava ficando completamente cega.

Tenho lembrado muito desta experiência ultimamente, porque já se passaram uns 10 anos, há uns 3 minha vó já partiu, e ainda temos essa alta concentração de serviços na capital e região metropolitana do RS, com desigualdades regionais significativas na oferta de atenção à saúde. E tivemos algum aumento no investimento na saúde neste período. Imaginem daqui a 20 anos se aprovada a PEC 241, teremos um cenário de decadência de um sistema que já tem suas limitações.

Este é um momento que não encontrei mais uma perspectiva de realizar apoio institucional representando a instituição Ministério da Saúde, e quero, com essa lembrança sobre minha vó, contar quando passei a desejar o SUS como cidadã e como trabalhadora. Passei a desejar trabalhar com uma equipe multiprofissional, considerando as vulnerabilidades e articulando uma rede de cuidados. Nunca mais deixei de estudar e me apaixonar pela Reformas Psiquiátrica e Sanitária no Brasil. Mas para trabalhar com o SUS, tive que ter paciência e perseverança. Logo que me formei me deparei com uma realidade de poucos concursos e muito concorridos. Foi só a partir do mestrado que encontrei um espaço de trabalho no SUS, primeiramente como pesquisadora e depois como Apoiadora Institucional do MS.

Os anos de busca desta entrada no SUS foram de um desejo tão grande e de uma dedicação tão sincera que tive o privilégio de entrar por uma bela porta, a Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. Comecei como parte da equipe da coordenação nacional, em Brasília, com a tarefa de articular os apoiadores descentralizados ao nível central, assim como o nível central ao território, através deles. Nosso tema principal era a inclusão e desenvolvimento dos dispositivos da PNH nas redes temáticas.

A PNH (HumanizaSUS) foi criada em 2003 para colaborar na construção do SUS em seus aspectos fundantes: integralidade, universalidade e equidade. Inspirada nas experiências do SUS que dá certo tem dado visibilidade à ferramentas para a aproximação da atenção e da gestão; a ampliação da comunicação e o fomento às grupalidades; o compartilhamento da clínica; o respeito aos trabalhadores; a produção de redes de atenção à saúde; a democratização dos processos de trabalho e a inclusão dos gestores, trabalhadores e usuários nos debates do SUS. 

Foi um privilégio aprender sobre a PNH e tantas outras políticas do nosso SUS, assim como conviver com muitas pessoas de todos os cantos deste país que a criaram e a mantém viva todos os dias. Quando comecei, em 2012, o Ministério da Saúde estava investindo forças na implementação das redes temáticas. Eram os tempos do Apoio Integrado, em que muitas secretarias e áreas do MS tinham seus apoiadores espalhados pelo Brasil induzindo a implementação das redes. Respaldados pelo decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, que regulamentou a lei nº 8.080/90, a Lei Orgânica da Saúde, dispôs sobre a organização do SUS: o planejamento, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, entre outros. Éramos um grande grupo a serviço de que estes papéis virassem realidade.

Depois de 2 anos de trabalho em Brasília, passei a desenvolver o trabalho de apoiadora de território no Rio Grande do Sul, primeiro como apoiadora da Humanização, depois como apoiadora das redes. Estas mudanças na direção do trabalho do apoio foram intensas desde o começo da crise política no Brasil, estou me referindo aqui ao último ano de mandato da Dilma, em que já começam a acontecer grandes mudanças no modo como a gestão do MS passou a orientar o apoio. Estas mudanças de orientação se intensificaram em 2015, quando o PMDB passa a gerir a pasta da saúde na figura de Marcelo Castro, daí em diante, não houve duração superior a quatro meses para cada orientação da gestão ao trabalho do apoio.

Neste período foi possível vivenciar o estrago causado pelo modo como se tem feito política neste país, desestabilizando setores tão cruciais para nossa sociedade, como é a saúde pública. Foi possível visualizar o desmonte do SUS em andamento pelas mãos tanto da gestão federal quanto estadual. O apoio institucional do MS e a PNH foram reduzidos por inanição, pouco a pouco, sem alardes. Como muita política pública tem desaparecido neste cenário de Golpe. E por isso foi ficando difícil seguir neste trabalho.

Tive a sorte de encontrar um trabalho como professora de Psicologia na Faccat, em Taquara, onde estou ensinando sobre a rede de saúde mental e psicologia institucional, estou tendo assim a oportunidade de compartilhar muito do que aprendi.

Então, no dia que o senado decidiu pelo impedimento da Presidenta Dilma, decidi também sair, decidi não aguentar até dezembro.

Levo comigo as boas lembranças e muitas aprendizagens.

Teria muito nomes a citar para agradecer, mas certamente esqueceria de alguém, se você está recebendo este texto você sabe que fez parte, então dirijo meu amplo agradecimento e afirmo que levo comigo:

– a proximidade que tivemos na equipe do núcleo técnico da PNH em Brasília,

– a convivência com todo o coletivo PNH desse Brasil, que inclui professores, trabalhadores, pesquisadores, usuários, enfim, PENSADORES inesquecíveis e que me influenciaram profundamente,

– os colegas do MS, apoiadores, coordenação nacional de saúde mental, DAB, educação popular, DAPES,

– todo o conhecimento e mudança de paradigma radical da Rede Cegonha que me ajudou a ter acesso a um parto inesquecível, que me transformou pra sempre e fortaleceu pra lutar pela saúde de todos,

– as colegas das coordenadorias regionais de saúde que tive a oportunidade de conviver, compartilhar ações e admirar: 1ª, 2ª, 4ª, 10ª, 13ª, 16ª e 18ª

– as intensidades e afetos do fórum perinatal

– o coletivo do fórum e do Hospital de Alvorada

– o GT da Rede de cuidados à pessoa em situação de violência da SES/RS

– os trabalhadores e gestores da SES/RS

– enfim, foram muitas reuniões, seminários, rodas, fóruns, um colorido imenso de encontros e disso tudo só tenho a agradecer a grande aprendizagem. Seguimos juntos, todos nós que lutamos por mais saúde e educação, como fortaleza de um povo, como nossa utopia. Estou apenas mudando de lugar e continuo avançando firme nesta caminhada.

 

Cecília de Castro e Marques

Porto Alegre, 18 de Outubro de 2016.